A cidade de Florianópolis detém a maior porcentagem de domicílios em que os moradores são pessoas casadas e do mesmo sexo.
Dados do Censo 2022, divulgados no último dia 15 e analisados pela Folha, colocam a cidade em primeiro em ranking entre as capitais do país. São cerca de 2.840 domicílios ocupados por casais de mesmo sexo –seja masculino ou feminino–, o que representa 1,29% dos mais de 200 mil domicílios do município.
O levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) coletou dados de lares que são permanentemente ocupados, ou seja, que servem para moradia fixa de uma ou mais pessoas. O instituto define “sexo” somente como masculino ou feminino, de acordo com o designado no nascimento, não considerando a identidade de gênero da pessoa entrevistada. O grau de parentesco “cônjuge” também só é utilizado para pessoas oficialmente casadas.
No total, o Brasil possui 72 milhões de domicílios particulares ocupados. Destes, 57,5% têm o morador responsável casado com uma pessoa de de sexo diferente; já 0,5% são compostos por moradores com cônjuge do mesmo sexo. Outros 42% dos domicílios são ocupados por pessoas não casadas.
Depois da capital de Santa Catarina, Fortaleza, no Ceará, fica em segundo lugar no ranking de capitais com a maior quantidade de domicílios ocupados por pessoas casadas e do mesmo sexo. São 9.000 casas ou apartamentos particulares, que representam 1,1% dos domicílios da cidade. Em terceiro, vem João Pessoa, capital da Paraíba, com quase 3.000 lares, 1% do total da cidade.
Em quantidade total de domicílios, a cidade de São Paulo lidera com a maior população do país de casados do mesmo sexo, com 39 mil lares do total de 431 mil.
Já entre os bairros ou distritos de todas as capitais, a República (no centro da capital paulista) é o local com a maior porcentagem: 4% dos domicílios são ocupados por cônjuges do mesmo sexo. Recanto dos Açores, bairro de Florianópolis, fica em segundo lugar, com 3,9%; seguido de Soledade, no Recife, com 3,3% dos domicílios.
Entre as unidades federativas do país, o Distrito Federal tem a maior porcentagem, com 7.488 domicílios, que representam 0,76% do total. Em segundo está o Rio de Janeiro, com 44 mil domicílios que correspondem a 0,73%. Já o estado de São Paulo detém o maior número total de domicílios com cônjuges do mesmo sexo, 108 mil, mas fica em terceiro proporcionalmente com 0,67% do total.
Ao todo, no território brasileiro, são cerca de 400 mil domicílios com pessoas casadas e que são do mesmo sexo. Na região Sudeste, há a maior concentração desse tipo de relação, com 192 mil domicílios, o que representa 0,7% dos lares.
No Brasil, também há cidades em que não foram registrados nenhuma resposta de domicílios com cônjuges do mesmo sexo. Cerca de 380 municípios não declararam nenhum casal durante o processo de recenseamento.
O Piauí é o estado que tem maior porcentagem de municípios nessa situação, 21% dos 224 municípios do território. O estado do Tocantins vem logo em seguida, com 19% de 139 municípios. O Rio Grande do Sul vem em terceiro lugar, com 18% dos 497 municípios.
A ex-desembargadora do Rio Grande do Sul e advogada na área de direito homoafetivo, Maria Berenice Dias, avalia que existe possibilidade de subnotificação de casais LGBTQIA+, uma vez que não há plena representatividade no questionário do Censo, além da ausência de legislação que represente casais em união estável.
“O questionamento feito pelo IBGE é discriminatório. A união estável constitui uma família sem o sinal do casamento. O fato é que a união oferece muita discriminação nos vizinhos, no trabalho. Eles [casais] vivem e não contam. Não contam nem para o recenseador. Porque, equivocadamente, a legislação ainda não prevê o estado civil do convivente”, critica Berenice.
Ainda, segundo a advogada, a ausência de distinção da identidade de gênero e da sexualidade do entrevistado também pode ser um dos motivos que explicam a baixa porcentagem em relação ao total.
“Questionar a identidade do sexo biológico acaba excluindo as famílias constituídas pela população trans. Quando um ou ambos são trans. Acho que se inserem muito nesses vazios que são fruto do equívoco na pesquisa.”
METODOLOGIA
A análise feita pela reportagem considera os dados do IBGE, disponibilizados por microdados e pelo Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). O Censo considera cônjuges somente pessoas que são casadas oficialmente. Namoros ou uniões estáveis não documentadas não foram contabilizadas no levantamento.
Os levantamentos nacionais e municipais consideram dados de todo o país. Já para bairros e distritos, as cidades de Rio Branco (AC), São Luís (MA) e Palmas (TO) não foram consideradas, por não haver divisão política de seu território.
Para a proteção dos entrevistados pelo instituto durante o Censo, os microdados disponibilizados para bairros e distritos ocultam alguns territórios com poucos registros, para que não seja possível a identificação individual. Com isso, há limitação dos números apresentados em relação aos dados reais coletados. O IBGE alega que essa medida reforça a proteção dos moradores, em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).