O contato de ursos-polares na região norte da costa do Alasca (EUA) com diferentes vírus e bactérias associados a doenças cresceu em 30 anos, aumentando de 30% a mais de 500% para alguns parasitas, segundo um estudo publicado na última quarta (23) na revista científica PLoS One.
Isso ocorre, segundo os autores, pela perda de habitat natural dos ursos, que se tornam mais vulneráveis ao contato com patógenos existentes na natureza ou transmitidos a partir de outros animais. Um dos vírus observados no estudo, causador da cinomose em cães, pode representar um potencial perigo para a vida selvagem, dizem os pesquisadores.
Além disso, o aquecimento global tem reduzido a área onde os animais normalmente buscam alimentam, no gelo ártico, e aumentado as áreas terrestres árticas, fazendo com que alguns animais tenham contato também com lixo humano —o que, consequentemente, pode elevar o risco de transmissão desses patógenos para os humanos e vice-versa.
Na pesquisa, foram analisadas amostras de sangue de ursos adultos na região do mar de Chukchi, na região noroeste do Alasca. Os cientistas compararam as amostras de sangue dos indivíduos em dois períodos: de 1988 a 1994 (115 amostras de fêmeas já armazenadas no Centro de Ciências do Alasca) e de 2008 a 2017 (coletadas a partir de 232 indivíduos machos e fêmeas).
As amostras foram testadas para avaliar a presença de anticorpos (produzidos após um contato inicial) contra parasitas, vírus e bactérias e seu crescimento no período. Como resultado, 5 de 6 patógenos (Toxoplasma gondii, Neospora caninum, Francisella tularensis, Brucella abortus/suis, e o vírus da cinomose) tiveram aumento significativo no período. O número de ursos com resultado positivo nas amostras chegou a dobrar para alguns microrganismos, como T. gondii, F. tularensis e N. caninum.
Não houve diferença entre os ursos que usavam mais áreas terrestres durante o verão em relação àqueles que preferiam o gelo ártico, mas os pesquisadores notaram que os indivíduos mais velhos —com cinco anos ou mais— tinham proporcionalmente duas vezes mais testes positivos, o que pode ser explicado pelo fato de alguns dos patógenos gerarem uma resposta imune duradoura nos animais.
Para Karyn Rode, pesquisadora de vida selvagem no Centro de Ciências do Alasca e primeira autora do estudo, a intenção da pesquisa veio de uma necessidade de examinar quais os riscos aos ursos-polares, que são os principais predadores nesses ecossistemas, da perda de gelo marinho ártico na região.
“Identificamos que havia uma oportunidade de examinar se a exposição a patógenos pode ter mudado as populações de ursos-polares do mar de Chukchi, durante um período em que houve declínios substanciais no gelo marinho do Ártico e outras mudanças ambientais associadas”, explica.
Como o estudo só analisou a presença de anticorpos no sangue, não foi possível verificar nenhuma condição física associada à infecção, incluindo potenciais riscos aos animais, ou mesmo se o contato com os patógenos levou os ursos a adoecerem. No entanto, Rode reforça que o estudo é mais uma evidência das ameaças à vida dos ursos-polares.
“Os ursos-polares estão vivenciando declínios significativos em seu habitat, sendo locais onde há maior perda de gelo, e aumento no uso da terra durante o verão. Essa mudança altera o seu comportamento alimentar, suas interações ecológicas, potencial conflito com humanos, e exposição a novos patógenos. Assim, os ursos-polares enfrentam uma combinação de potenciais estressores associados à perda de gelo marinho”, diz.
“Nosso estudo defende a necessidade de aumentar a vigilância da exposição a patógenos e doenças em ursos-polares para entender melhor se pode haver impactos na saúde ou sobrevivência”, afirma.
Ela destaca que os resultados indicam “uma alteração na exposição a patógenos em uma espécie que está no topo da cadeia alimentar, e que tais mudanças estavam associadas à dieta, confirmando que a dinâmica de transmissão provavelmente está mudando”.