Após o fim do prazo dado pelo governo federal, na última terça-feira (26), para que o TikTok comece a criar mecanismos para barrar o acesso de crianças, a plataforma digital entrou com um recurso solicitando efeito suspensivo e prazo adicional para o cumprimento da determinação.
Segundo a ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), uma autarquia federal que fez a determinação em um processo administrativo aberto para investigar possíveis usos irregulares de dados de crianças e adolescentes, o pedido da empresa está sendo analisado pelo setor de fiscalização.
À Folha o órgão informou que, caso a análise resulte na manutenção da decisão, poderá adotar medidas preventivas adicionais, como a aplicação de multa diária para garantir o cumprimento da decisão. Entre as penalidades previstas na Lei Geral de Proteção de Dados, que poderão ser aplicadas nesse caso, estão advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas e uma multa que pode chegar a R$ 50 milhões por infração.
“Caso a multa venha a ser considerada a sanção mais adequada, o cálculo de seu valor depende de circunstâncias (agravantes e atenuantes) que são apuradas ao longo do processo sancionador. Não é possível, neste momento, portanto, estimar o valor dessa eventual multa. Independentemente dessas circunstâncias, os valores de multa estão limitados R$ 50 milhões por infração”, destacou a autarquia.
O TikTok foi procurado por email, mas não retornou até a publicação desta reportagem. Em nota, na terça, a empresa afirmou ter “um firme compromisso com a segurança e a privacidade de nossa comunidade, especialmente dos jovens que criam, descobrem e aprendem em nossa plataforma”.
A fiscalização da ANPD começou em 2021 e, em 4 de novembro último, foi aberto o processo para apurar infrações e, se necessário, aplicar penalidades. Para o fim do acesso sem cadastro, foi dado um prazo de dez dias úteis, que se encerrou às 23h59 de terça-feira. Foi concedido um prazo maior, de 20 dias úteis, para a implementação de um plano de aprimoramento dos mecanismos de verificação de idade para o cadastro, com protocolos para a exclusão de contas de menores de 13 anos e para assegurar que menores de 18 só se cadastrem com autorização de responsáveis.
A principal exigência da ANPD é que o TikTok acabe com a liberação do seu conteúdo a qualquer usuário, sem a necessidade de se cadastrar na plataforma —o que é chamado de “feed sem cadastro”. Com isso, embora o TikTok tenha, em seus termos de uso, a permissão para cadastro somente a partir dos 13 anos, na prática os mais novos podem acessar a plataforma livremente. Além de ter acesso ao conteúdo, as crianças acabam fornecendo informações sobre a sua navegação.
Nesta quarta-feira, os acessos à plataforma funcionavam normalmente. Quem entrava pela página no computador tinha acesso liberado a todo o conteúdo. Pelo celular, o pedido de cadastro apareceu apenas na terceira tela.
Outro ponto crítico apontado no processo é a falta de mecanismos para verificação da idade dos usuários —menores de 13 anos podem se cadastrar facilmente, mentindo sobre a sua data de nascimento. A ANPD determinou que a plataforma implemente ações para regularizar os cadastros e impedir que menores de 18 anos tenham uma conta sem a autorização de um responsável.
O TikTok é especialmente popular entre crianças. Pesquisa deste ano da TIC Kids Online Brasil, referência sobre hábitos digitais na infância e adolescência, mostrou que as crianças não só acessam o TikTok como fazem um uso excessivo da plataforma. Dentre os internautas brasileiros de 9 a 10 anos, 34% admitem usar o TikTok várias vezes ao dia. Na faixa de 11 a 12 anos, são 41% (a pesquisa abrange usuários de 9 a 17 anos, portanto, não há dados sobre os mais novos).