A Questão 4 submetida a referendo em Massachusetts, propondo ampla descriminalização de substâncias psicodélicas no estado progressista, saiu derrotada da eleição nos EUA. Com 89% dos votos apurados, o “não” contava 56,9% de apoio e o “sim”, 43,1%, resultado irreversível.
Josh Hardman, do boletim Psychedelic Alpha, registra a interpretação preliminar de que a proposta pode ter sido vítima de sua natureza dupla, ao mesclar a introdução gradual de serviços psicodélicos credenciados com descriminalização de posse e cultivo pessoal. Massachusetts, com isso, não se tornou o terceiro estado a legalizar drogas como a psilocibina, ao lado de Oregon e Colorado.
Em realidade, o projeto de legislação submetido a consulta popular no estado que tem Boston como capital ia bem além das normas aprovadas em Oregon (2020) e Colorado (2022).
No primeiro, só serviços de psilocibina (cogumelos “mágicos”) ficaram autorizados pela Medida 109. Outra proposta aprovada há quatro anos (Medida 110) descriminalizava a posse de todas as drogas, mas foi revertida em 2024 após reação pública ao consumo descontrolado em ruas de cidades como Portland.
No Colorado, a nova norma permite que usuários mantenham e até cultivem cogumelos do gênero Psilocybe. Não só para consumo individual, mas também em quantidade suficiente para doar a conhecidos.
Em Massachusetts, se a Lei de Substâncias Naturais Psicodélicas tivesse sido aprovada, ocorreria a descriminalização de quaisquer produtos derivados de plantas e fungos. Não seriam legalizados, contudo, psicodélicos sintéticos como LSD e MDMA (ecstasy).
No caso da dimetiltriptamina (DMT) da ayahuasca e da psilocibina de cogumelos, ninguém seria preso ou processado por deter até 1 grama desses psicodélicos. A mesma regra valeria para 18 g de mescalina, do cacto peiote, e 30 g de ibogaína, composto da planta africana Tabernanthe iboga que vem sendo usado com sucesso contra dependência química.
A Questão 4 continha ainda provisão para o cultivo legalizado dos vegetais ou fungos. Quem desejasse fazê-lo ficaria restrito a plantá-los em áreas de no máximo 13 m2, só para uso pessoal, não revenda.
Pesquisas de opinião em outubro ainda davam empate técnico entre eleitores contra e a favor, mas o voto popular desequilibrou a balança em favor do status quo proibicionista. Ao que parece, o componente da descriminalização fomentou o temor de que se instalasse um comércio clandestino das substâncias alteradoras da consciência.
Em oposição à Questão 4 se levantaram vozes influentes, como a Sociedade de Psiquiatria de Massachusetts e o jornal The Boston Globe, que publicou editorial recomendando votar contra. Houve também divisões entre grupos antiproibicionistas, e alguns militantes desse campo passaram a criticar a proposta.
Consuma-se, assim mais um revés na série que tem minado o otimismo anterior com o potencial terapêutico de substâncias psicodélicas desde meados deste ano. Fica adiada a esperança de veteranos de guerra dos EUA com uma alternativa inovadora de tratamento ao transtorno de estresse pós-traumático (TEPT).
A pesquisa clínica, entretanto, segue em frente, com a publicação de dezenas de estudos científicos nos EUA (onde muitos conservadores os apoiam), na Europa e no Brasil. E estão a favor dela apoiadores de Trump, como Elon Musk, Peter Thiel e Robert F. Kennedy Junior, portanto não parece que o tema vá sair da pauta tão cedo.
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