Um exame da gravidade lunar resultou em novas pistas sobre por que os dois lados da Lua —o próximo, sempre voltado para a Terra; e o afastado (ou oculto), sempre voltado para o lado oposto do nosso planeta— parecem tão diferentes.
Os dados da missão Grail (laboratório de recuperação de gravidade e interior), da Nasa, indicam que o interior profundo lunar tem uma estrutura assimétrica. Esta última aparentemente resultou de uma intensa atividade vulcânica que teria ocorrido no lado próximo do satélite há bilhões de anos que ajudou a moldar as características superficiais.
Os pesquisadores descobriram que o lado próximo se flexiona ligeiramente mais que o lado afastado durante a órbita elíptica da Lua ao redor da Terra, graças à influência gravitacional do nosso planeta –um processo chamado deformação de maré. Isso indica diferenças nos dois lados do interior lunar, segundo os cientistas, especificamente na camada geológica chamada manto.
“Nosso estudo mostra que o interior da Lua não é uniforme: o lado próximo [voltado para a Terra] é mais quente e geologicamente mais ativo nas profundezas do que o lado oposto [o afastado]”, disse Ryan Park, supervisor do Grupo de Dinâmica do Sistema Solar no Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa na Califórnia. Ele é autor principal do estudo publicado nesta quarta-feira (14) na revista Nature.
O lado próximo lunar é coberto por vastas planícies, chamadas mares, formadas por rocha derretida que esfriou e solidificou há bilhões de anos. O lado oposto, por sua vez, possui um terreno muito mais acidentado, com poucas planícies.
Alguns cientistas levantaram a hipótese de que o intenso vulcanismo no lado próximo, que fez com que elementos radioativos geradores de calor se acumulassem nesse lado do manto, provocou as diferenças de superfície observadas hoje. As novas descobertas oferecem as evidências mais fortes até agora para apoiar essa ideia.
Estima-se que o manto do lado próximo é, em média, cerca de 100 a 200 graus Celsius mais quente que o do lado afastado, com a diferença térmica possivelmente mantida pelo decaimento radioativo dos elementos tório e titânio no lado próximo.
“O lado próximo e o lado afastado da Lua parecem muito diferentes, como demonstrado pelas diferenças na topografia, espessura da crosta e quantidade de elementos produtores de calor no interior”, afirmou Park.
O diâmetro da Lua, de aproximadamente 3.475 quilômetros, é um pouco mais de um quarto do diâmetro da Terra. O manto lunar é a camada localizada abaixo da crosta e acima do núcleo, abrangendo uma profundidade de cerca de 35 a 1.400 quilômetros sob a superfície. O manto constitui aproximadamente 80% da massa e volume do satélite e é composto principalmente pelos minerais olivina e piroxênio, semelhante ao manto terrestre.
“O fato de que a assimetria detectada no manto corresponde ao padrão da geologia da superfície —por exemplo, diferenças na abundância dos mares de basalto (rocha vulcânica) com aproximadamente 3 a 4 bilhões de anos entre o lado próximo e o lado afastado— sugere que os processos que impulsionaram o vulcanismo lunar antigo estão ativos hoje”, explicou Alex Berne, cientista planetário computacional do Caltech e coautor do estudo.
Os pesquisadores passaram anos analisando dados das naves espaciais Ebb e Flow da Grail, da Nasa, que orbitaram a Lua de dezembro de 2011 a dezembro de 2012.
“Nosso estudo fornece o mapa gravitacional mais detalhado e preciso da Lua até o momento”, disse Park.
“Esse mapa gravitacional aprimorado é uma base crítica para o desenvolvimento de sistemas lunares de posicionamento, navegação e cronometragem (PNT), que são essenciais para o sucesso de futuras missões de exploração lunar. Ao melhorar nossa compreensão do campo gravitacional da Lua, ele contribui para estabelecer um sistema de referência lunar preciso e um sistema de tempo, permitindo uma navegação mais segura e confiável para espaçonaves e operações de superfície”, acrescentou o pesquisador.
Segundo os pesquisadores, a mesma abordagem empregada no estudo, com o uso de dados gravitacionais para avaliar o interior lunar, poderia ser aplicada a outros objetos no Sistema Solar, como Encélado e Ganimedes, luas de Saturno e Júpiter, dois satélites de interesse na busca por vida potencial além da Terra.
Enquanto isso, as novas descobertas contribuem para a compreensão da eterna companheira da Terra.
“A Lua desempenha um papel vital na estabilização da rotação da Terra e na geração das marés oceânicas, que influenciam sistemas naturais e ritmos diários”, disse Park. “Nosso conhecimento sobre a Lua expandiu-se por meio de missões humanas e robóticas que revelaram detalhes sobre sua superfície e interior, mas muitas questões sobre sua estrutura profunda e história permanecem. Como nossa vizinha mais próxima, a Lua continua sendo um importante foco de descoberta científica.”