A Polícia Federal apreendeu no PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, um plano batizado de “Operação 142” com o esboço de um “decreto de instauração de estado de exceção no Brasil”. O objetivo final descrito na minuta era evitar que Lula subisse a rampa do Palácio do Planalto após vencer as eleições de 2022.
“O nome dado ao documento faz alusão ao art. 142 da Constituição Federal (CF), o qual trata das Forças Armadas e era uma possibilidade aventada pelos investigados como meio de implementar uma ruptura institucional após a derrota eleitoral do presidente Jair Bolsonaro”, diz um trecho do relatório da PF divulgado nesta terça-feira (26).
Em fevereiro deste ano, a sede nacional do PL foi alvo de busca e apreensão durante a Operação Tempus Veritatis. O esboço foi encontrado na mesa do coronel Flávio Peregrino, assessor do general Walter Braga Netto, em uma pasta denominada “memórias importantes”.
Conforme o relatório, a “análise do material apreendido na sede do Partido Liberal, mais especificamente na mesa do assessor do general Braga Netto, coronel Peregrino, em uma pasta denominada ‘memórias importantes’, foi encontrado um esboço de ações planejadas para a denominada ‘Operação 142′”.
O documento era dividido em tópicos. Dentro do item “Linhas de esforço” havia propostas de ações que incluíam “interrupção do processo de transição”, “mobilização de juristas e formadores de opinião” e “enquadramento jurídico do decreto 142”, que seria feito com a Advocacia-Geral da União e Ministério da Justiça.
“Lula não sobe a rampa”, diz o objetivo final da “Operação 142”
O manuscrito obtido pelos investigadores mostra o planejamento para “decretar” o “Dia D” com base no artigo 142, interpretado erroneamente como uma ferramenta para autorizar a intervenção militar no país com o pretexto de “restaurar a ordem”.
O artigo 142 diz: “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
A minuta previa a anulação das eleições, a prorrogação dos mandatos, a substituição de todos os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a preparação de novas eleições. Além disso, o texto apontava que as tropas deveriam se preparar “para ações diretas”.
Veja como “Operação 142” estava estruturada:
- Avaliação da conjuntura: “Relacionar todas as ingerências do Judiciário nas ações do Executivo e do Legislativo desde 2019”;
- Linhas de esforço: “Enquadramento jurídico do Decreto 142 (AGU e MJ)”, convocar conselho da República e da Defesa, discurso em cadeia nacional de rádio e TV, preparação (ensaios) da tropa para ações diretas, mobilização de juristas e formadores de opinião, preparar releases para difusão posterior, interrupção do processo de transição e anulação de atos arbitrários do STF”;
- CG ESTRT (Centro de Gravidade Estratégico): “Decretar o artigo 142” – “Dia D”;
- EFD ESTRT (Estado Final Desejado Estratégico): “Restabelecer a ordem constitucional e o livre exercício dos direitos fundamentais”;
- CG POL (Centro de Gravidade Político): “Anulação das eleições, prorrogação dos mandatos, substituição de todo TSE, e preparação de novas eleições”
- EFD POL (Estado Final Desejado Político): “Lula não sobe a rampa”.
Braga Netto e seus aliados tinham “clara intenção golpista”, afirma PF
A Polícia Federal apontou que o “documento demonstra que Braga Netto e seu entorno” tinha “clara intenção golpista, com o objetivo de subverter o Estado Democrático de Direito, utilizando uma interpretação anômala do art. 142 da CF, de forma a tentar legitimar o golpe de Estado”. Os investigadores estimam que a minuta foi redigida entre novembro e dezembro de 2022.
“O arcabouço probatório demonstra os investigados realizaram diversas ações para de alguma forma obstruir as investigações que apuram a constituição de uma organização criminosa para tentar dar um golpe de Estado e Abolir o Estado Democrático de Direito, mediante a restrição do exercício do poder judiciário, especialmente o STF e o TSE”, diz o relatório da PF.
Bolsonaro, Braga Netto e outras 35 pessoas foram indiciadas pela PF por suposta participação no planejamento de um golpe de Estado, que incluía o assassinato do presidente Lula (PT), do vice Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Defesa de Braga Netto
A defesa do general Walter Braga Netto publicou um comunicado, nesta terça-feira (26), após a divulgação do relatório da Polícia Federal. “Reafirmo que nunca se falou em golpe. A verdade será esclarecida respeitado o devido processo legal”, disse o ex-candidato a vice de Bolsonaro nas redes sociais.
Os advogados afirmaram que o manuscrito sobre a “Operação 142”, encontrado na mesa do assessor de Braga Netto, era parte de textos utilizados pelo general na preparação para audiências públicas e respostas à imprensa.
Além disso, a defesa apontou que o coronel peregrino não foi alvo da Operação Tempus Veritatis. Veja abaixo a íntegra do comunicado assinado pelos advogados Luís Henrique Prata, Gabriella Venâncio e Francisco de Lima, que representam o general:
“Os documentos, anotações, rascunhos, reportagens de imprensa serviam como material preparatório para respostas de demandas de imprensa, e, principalmente, para a preparação de pessoas para o comparecimento em Comissões Parlamentares de Inquérito, como as ocorridas no Congresso Nacional e na Câmara Legislativa do DF.
Naquele período circularam diversos papéis, palestras em power point e sugestões da aplicação dos dispositivos constitucionais que eram entregues às autoridades, conforme relatado à época. Um exemplo é que o artigo 142 foi discutido, em novembro de 2022, em audiência pública no Senado Federal.
Por fim, destaca-se que o referido assessor não foi objeto de busca e apreensão na operação Tempus Veritatis e que os materiais eram subsídios de uso pessoal e interno, seguindo o previsto no artigo 220 da Constituição Federal, que assegura a liberdade de manifestação do pensamento, de criação, de expressão e de informação”.