O viajante que descer para o litoral norte neste fim de ano pela Oswaldo Cruz não deve se espantar com o número de calotas abandonadas nas laterais na rodovia. Mas isso é só porque, nesta quinta (26), uma equipe de dez pessoas passou o dia recolhendo centenas delas, que se acumularam na última semana.
Em geral, há dezenas, centenas, até milhares delas. Fenômeno bastante avistado, mas nem sempre compreendido, a enorme quantidade de calotas é causada pela combinação da grande inclinação da pista com o uso excessivo dos freios nesse trecho da Serra do Mar.
“O motorista deve descer a serra em 1º e 2º marchas, e não apenas freando”, ensina Antonio Moreira Junior, chefe da DR 6-Taubaté (Diretoria Regional 6) do DER. “Do contrário, o freio esquenta o conjunto da roda. Isso derrete o plástico das calotas, soltando-as na rodovia e oferecendo perigo principalmente para motos, que podem escorregar.”
Segundo nota da entidade, “o DER recolhe mensalmente, durante a alta temporada (dezembro a fevereiro), cerca de 2.000 calotas no trecho de serra da rodovia Oswaldo Cruz (SP 125), entre o km 79 e o km 86, no município de Ubatuba. Nos meses de dezembro/23, janeiro/24 e fevereiro/24, o tráfego diário médio registrado foi de 4.400 veículos”.
Apesar de a serra se estender entre os km 79 e 86, é no trecho final, a partir do km 82, que as calotas começam a se reproduzir como coelhos, já que, no início da descida, as rodas ainda não esquentaram o suficiente para derreter plástico. Como o freio atua nas rodas da frente, são (quase) sempre essas as peças perdidas.
Recentemente, o engenheiro Wilson Santini Marques chegou ao seu posto de trabalho na DR 6 com seu Nissan Kicks sem a calota anterior esquerda. Para alguém como ele, que trabalha há 43 anos no DER de Taubaté, é uma gafe. “Virei motivo de piada na regional, é claro. Afinal, a gente aprende a descer a serra direito, usando principalmente a engrenagem.”
O mesmo fenômeno não acontece com tanta frequência na rodovia vizinha Tamoios, que liga São José dos Campos a Caraguatatuba. A razão é que o trecho da serra na Oswaldo Cruz é mais íngreme e radical do que na vizinha.
Natividade da Serra, a última cidade do Vale do Paraíba antes da descida, está 720 metros acima do nível do mar. Para chegar a Ubatuba, que está no nível do mar, o motorista tem cerca de sete quilômetros de descida serpenteando a serra.
Na Tamoios, porém, as curvas e elevações são mais suaves, uma vez que o traçado para descer do planalto à Caraguatatuba é mais amplo, se espalhando por 15 quilômetros. Já na Mogi-Bertioga e na Cunha-Parati, também há alguns relatos de calotas despencadas.
Nesta quinta, a reportagem acompanhou o recolhimento na Oswaldo Cruz. A limpeza é efetuada pelo grupo CKL, uma empresa de manutenção terceirizada, que disponibilizou dez pessoas, além de um carro com uma pequena caçamba e um caminhão.
Os caçadores da calota perdida vão descendo o trecho de serra a pé, seguidos pelo carro. As peças são colocadas em sacos de lixo de 100 litros e acomodadas na pequena caçamba. Quando chegam a uma baia de segurança, lá está o caminhão, que recebe os sacos pretos, e segue para a baia seguinte.
Como dá para imaginar, pegar a serra em dia de limpeza significa ter que descer esses sete quilômetros mais ou menos na velocidade de um homem a pé, o que costuma acrescentar de uma a duas horas na sua viagem.
Segundo o site Curiosidades de Ubatuba, a Oswaldo Cruz “teve como origem um antigo traçado de tropeiros que passava por São Luiz do Paraitinga indo em direção ao bairro do Registro em Ubatuba, local onde se registravam as mercadorias que saiam e chegavam ao porto”.
O nome da rodovia é uma homenagem ao médico Oswaldo Cruz, que nasceu em São Luiz do Paraitinga. O trecho da serra da estrada é chamado por alguns de “cemitério de calotas”.