A identificação do primeiro suspeito de participar do ataque que deixou dois mortos no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, trouxe um indício que reforça a hipótese de que o PCC (Primeiro Comando da Capital) teria participação no crime, segundo a cúpula da segurança pública paulista.
Kauê do Amaral Coelho, 29, suspeito de ser olheiro durante que a emboscada que matou Antônio Vinícius Gritzbach, 38, foi preso por tráfico de drogas em 2022.
Ele também é acusado de desacato a um agente de trânsito. A investigação do caso afirma que ele era membro da facção criminosa com base nessa última ocorrência: Kauê teria citado sua filiação ao PCC em meio às ameaças.
Entre os suspeitos de envolvimento no ataque ao aeroporto também estão policiais civis e militares, alvos de inquéritos nas respectivas corregedorias. A participação deles segue entre as principais linhas de investigação.
A reportagem não localizou o registro de desacato ao agente de trânsito citado pela SSP, embora tenha conseguido acesso ao processo por tráfico de drogas —a acusação não foi acatada pela Justiça.
“É a primeira evidência de que, de fato, tem um integrante do PCC [no ataque], segundo ele se auto intitulou”, disse o secretário estadual de Segurança Pública, Guilherme Derrite. Ele disse que essa informação está tanto no boletim de ocorrência do desacato contra agente de trânsito quanto nos sistemas de inteligência da polícia.
Imagens das câmeras de segurança do aeroporto mostram Kauê atravessando o saguão da área de desembarque do Terminal 2, logo após Gritzbach passar pelo mesmo local. A polícia diz que ele aparece nas imagens apontando a localização do alvo para os homens que o aguardavam num Volkswagen Gol preto. Os atiradores souberam o momento exato para descer do carro e pegar o alvo de frente.
Desde os primeiros dias da investigação, o envolvimento do PCC no crime está entre as principais hipóteses para o caso. Isso porque Gritzbach, que era empresário do ramo imobiliário, havia admitido lavar dinheiro para o grupo criminoso num acordo de delação premiada e apontado membros da organização que teriam contratado seus serviços para supostamente ocultar dinheiro do crime —seja na compra de imóveis, no agenciamento de jogadores de futebol ou no ramo financeiro, por meio de fintechs.
A investigação também apura se houve participação de policiais civis citados em sua delação premiada ou dos PMs contratados para sua escolta pessoal. Além disso, investiga se há conexão entre o ataque e a entrega de joias a Gritzbach, avaliadas em R$ 1 milhão, durante a viagem da qual ele voltava.
Mesmo caso o envolvimento do PCC seja confirmado, isso não exclui a eventual participação de policiais nem a conexão com a entrega das joias. Como a Folha mostrou, na lista de policiais delatados pelo empresário estão integrantes do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais) e 24º DP (Ponte Rasa), na zona leste.
Questionado nesta terça-feira, o delegado-geral afirmou que os policiais civis investigados no caso ainda aguardam serem chamados para prestar depoimento à corregedoria. Eles foram afastados de suas atividades operacionais, mas seguem em funções administrativas na corporação.
Em 2022, quando foi preso com cerca de mil comprimidos de droga sintética, Kauê alegou ser usuário de drogas. Ele ficou seis dias preso no Centro de Detenção Provisória de Pinheiros, na zona oeste da capital.
A Justiça entendeu que não havia fundamento para uma sentença por tráfico de drogas pelo caso, e o condenou por porte, impondo a obrigação de que ele comparecesse em programa ou curso educativo.
Kauê teria chegado cerca de uma hora antes do pouso do alvo do ataque. Além de sua presença no saguão, a SSP (Secretaria de Segurança Pública) diz que outras quatro pessoas estariam no carro preto, de onde saíram os homens armados com fuzis que assassinaram Gritzbach na área de desembarque do Terminal 2.
Nesta terça, policiais cumpriram mandados de busca e apreensão em três endereços ligados ao suspeito. Ele está com a prisão temporária decretada pela Justiça. Em um desses endereços —no Jaguaré, na zona oeste da capital—, um irmão do suspeito disse à polícia que Kauê já havia telefonado e avisado que a polícia poderia aparecer. Ele foi convidado a ir à delegacia para prestar depoimento.
Derrite afirmou que a polícia foi informada que o olheiro estaria escondido no Rio de Janeiro, mas ressaltou que a investigação recebeu esse detalhe com ressalvas. [É] uma informação ainda muito rasa, no sentido de detalhes”, disse o secretário. “Não se descarta que ele ainda esteja no estado de São Paulo.”
Policiais não encontraram drogas ou armas nos endereços ligados a Kauê, segundo o delegado-geral da Polícia Civil, Artur Dian. Além de materiais apreendidos, as principais evidências para continuar a investigação do caso são aquelas encontradas no carro usado pelos criminosos, abandonado a cerca de sete quilômetros do aeroporto.
Segundo a perita criminal Karin Kawakami, integrante da força-tarefa criada para investigar o caso, mais de 50 amostras de material biológico foram coletadas. Ela disse que a Polícia Técnico Científica ainda faz análises em laboratório para conseguir identificar o DNA ou impressões digitais dos criminosos no carro.
Por enquanto, a perícia já conseguiu confirmar que as armas apreendidas no veículo são as mesmas que atingiram as vítimas. Foram feitos disparos com dois fuzis.