Uma decisão provisória da 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu nesta quinta-feira (19) uma mudança nas regras de tombamento dos bairros Jardins América, Europa, Paulista e Paulistano que poderia abrir caminho para a criação de novos condomínios residenciais nesses bairros de alto padrão da zona oeste da capital paulista.
As alterações foram aprovadas na última segunda-feira (16) pelo Condephaat, o conselho estadual de patrimônio histórico. Em discussão desde 2021, o parecer aprovado pela maioria dos conselheiros revoga resoluções de 1986, 1988 e 2021 sobre os bairros.
Principal mudança da nova resolução, o tombamento estadual deixa de impor qualquer restrição quanto ao uso dos imóveis. Essa passa a ser uma atribuição exclusiva da Lei de Zoneamento, ou seja, da Câmara Municipal e da prefeitura.
Com isso, se tornam viáveis a criação de novos condomínios residenciais no bairro, tipo de empreendimento para o qual há forte interesse do mercado imobiliário. Proprietários de lotes no Jardim América, que concentram mansões que ocupam grandes terrenos, tendem a ser beneficiados pela potencial valorização de suas propriedades com a mudança.
A regra vigente até então era inspirada em contratos assinados por proprietários com o loteador original do Jardim América, a companhia City of São Paulo, que impõe o uso unifamiliar. A partir da nova resolução, o uso multifamiliar se torna viável no que diz respeito ao tombamento. Os contratos de propriedade ainda são uma barreira legal para a mudança de uso em alguns lotes.
Na decisão liminar em que pede a suspensão imediata do trâmite do processo administrativo, a juíza relatora Cynthia Thomé afirma haver indícios de que o processo não contou com a devida participação popular.
Em nota, a Secretaria de Cultura da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), à qual está subordinado o Condephaat, informou não ter sido notificado oficialmente sobre a decisão judicial. “Assim que formalmente comunicado, haverá avaliação para que sejam tomadas as medidas cabíveis”, diz a nota.
Como a decisão do Condephaat pode mudar os Jardins
A decisão do Condephaat tem foco nas regras de uso dos imóveis, que dentro do conjunto de regras do órgão e da prefeitura sobre a região podem, em casos pontuais, permitir que condomínios de casas sejam construídos. Há diversos pontos que precisam ser observados sobre cada lote para que isso ocorra.
Como na regra de zoneamento a maior parte da área dos Jardins é de uso exclusivamente residencial, eventuais condomínios criados nesses bairros serão obrigatoriamente horizontais –constituídos por casas térreas ou sobrados–, pois não são permitidos prédios nestas zonas.
O tombamento ainda limita a altura das construções a 10 m, mesmo gabarito imposto pela Lei de Zoneamento para aquela área. Prédios baixos, também limitados a 10 m, podem ser construídos em algumas das bordas, em lotes à beira de avenidas e que são considerados zonas corredores.
Desmembrados e remembrados de lotes continuam permitidos, desde que não destoem das dimensões do menor ou do maior lote da quadra, regra que já existia em resoluções anteriores. Mas uma regra foi introduzida para que casos extraordinários, como de lotes muito maiores do que os demais, passem a ser avaliados caso a caso pelo Condephaat.
Algumas restrições ao uso dos terrenos aprovadas na nova resolução, porém, têm como objetivo evitar a descaracterização do bairro e evitar uma corrida imobiliária para a construção de condomínios amuralhados, segundo Mariana Rolim, vice-presidente do Condephaat.
Uma dessa regras proíbe a construção de ruas dentro dos lotes, o que caracterizaria a formação de vilas.
Outro ponto discutido foi o uso do subsolo dos terrenos, limitados em até 1,5 metro abaixo do nível da rua. A trava dificulta a construção de garagens subterrâneas, o que afetaria o lençol freático do bairro.
O traçado das ruas, os recuos das construções em relação às bordas dos terrenos e a manutenção da cobertura vegetal continuarão no tombamento.
Essas são características inspiradas nas cidades jardins inglesas criadas como resistência à industrialização que nortearam o projeto de loteamento do Jardim América a partir de 1915 pela companhia City.
Alguns lotes do Jardim América contam, inclusive, com uma restrição contratual que impede o uso multifamiliar. São casos em que a imposição da ocupação unifamiliar está no contrato original da City.