O número de estudantes negros que ingressam na Harvard Law School caiu drasticamente após decisão da Suprema Corte dos EUA de 2023 que proibiu ações afirmativas em admissões nas universidades. Os números são dos dados de matrícula divulgados na segunda-feira (6).
A Harvard Law, instituição de ensino de direito ligada a prestigiada Universidade de Harvard, matriculou 19 estudantes negros do primeiro ano, ou 3,4% da turma, o menor número desde a década de 1960, de acordo com dados da American Bar Association.
Em 2023, a turma do primeiro ano da faculdade de direito tinha 43 estudantes negros, de acordo com uma análise do The New York Times.
Embora mudanças no cálculo possam explicar alterações nos dados de ano para ano, o declínio em Harvard foi muito mais acentuado do que em outras faculdades de direito de elite.
O número é notável não apenas pela gravidade da questão, mas também pelo papel anterior da escola na educação de alguns dos advogados negros mais conhecidos do país, incluindo o ex-presidente Barack Obama, a ex-primeira-dama Michelle Obama, a juíza Ketanji Brown Jackson e o ex-governador de Massachusetts Deval Patrick.
A decisão da Suprema Corte e o fato de que Harvard foi citada no caso desempenharam um papel nessa queda, de acordo com David B. Wilkins, um professor de direito de Harvard que estudou a representação negra na profissão jurídica.
“Isso obviamente tem muito a ver com o efeito assustador criado por essa decisão”, disse Wilkins.
“Este é o menor número de alunos negros ingressando no primeiro ano desde 1965”, ele acrescentou, apontando para números compilados pelo Center on the Legal Profession (Centro da Profissão Jurídica, em uma tradução livre) em Harvard, onde também atua como diretor do corpo docente.
Naquele ano, havia 15 alunos negros ingressando. Desde 1970, geralmente havia de 50 a 70 alunos negros na turma do primeiro ano de direito de Harvard, ele disse.
A faculdade de direito também viu um declínio acentuado em alunos hispânicos, de 63 alunos, ou 11% do total, em 2023, para 39 alunos em 2024, ou 6,9%. A matrícula de alunos brancos e asiáticos aumentou.
Um porta-voz da Harvard Law, Jeff Neal, disse que a escola continua “a acreditar que um corpo estudantil composto por pessoas com uma ampla variedade de origens e experiências é um componente vital da educação jurídica”.
Neal também observou que era difícil tirar conclusões de apenas um ano de dados de matrículas e acrescentou:
“A Harvard Law School continua comprometida tanto em seguir a lei quanto em promover uma comunidade no campus e uma profissão jurídica que reflita inúmeras dimensões da experiência humana.”
Uma análise das matrículas em outras faculdades de direito importantes mostrou que o número de alunos negros e hispânicos diminuiu menos severamente, de acordo com os números da associação de advogados.
Em algumas universidades, a matrícula de alunos negros e hispânicos realmente aumentou. Na Universidade de Stanford, por exemplo, o número de alunos negros do primeiro ano quase dobrou de 12, em 2023, para 23, em 2024.
A matrícula de negros e hispânicos também diminuiu na Universidade da Carolina do Norte. A universidade também foi citada como ré nos casos decididos pela Suprema Corte, movidos pelo grupo antiação afirmativa Students for Fair Admissions (Estudantes por uma Admissão Justa, em tradução livre).
Os alunos negros do primeiro ano caíram de 13 para 9; os alunos hispânicos caíram de 21 para 13.
A cada ano, a American Bar Association (Associação Americana de Advogados, em uma tradução livre) compila e divulga informações sobre as 198 faculdades de direito credenciadas que incluem não apenas dados demográficos, mas também informações sobre taxas de aceitação, notas do teste de admissão, corpo docente e despesas.
A associação mudou suas categorias de relatórios neste ano para incluir alunos que não eram residentes dos EUA na divisão racial e étnica da classe. No ano passado, eles eram uma categoria separada.
A mudança complica as comparações ano a ano e pode ajudar a explicar por que algumas escolas, como a Universidade de Nova York, a Universidade de Columbia e a Universidade da Pensilvânia tiveram grandes aumentos de alunos asiáticos.
A parcela de alunos negros do primeiro ano de graduação, no geral, em Harvard, também caiu, de 18% em 2023 para 14%, de acordo com dados divulgados em setembro.
Wilkins disse que os números de admissões em Harvard ilustraram o impacto negativo do litígio do Students for Fair Admissions e as barreiras adicionais que ele criou para futuros advogados negros.
Mas Richard Sander, professor de direito na UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles) e crítico da ação afirmativa, disse que a divisão racial das novas turmas da faculdade de direito mostrou uma série de tendências positivas.
Embora algumas escolas de primeira linha tenham perdido matrículas negras, o número de alunos negros nas faculdades de direito em geral aumentou em cerca de 3% – de 2.969, em 2023, para 3.060, em 2024, de acordo com a ABA.
É complicado dizer se esse foi um aumento significativo, em parte por causa das mudanças nos relatórios, disse Sander. Ele também observou que os dados de matrículas negras não incluíam alunos que disseram ser multirraciais ou se recusaram a relatar sua raça.
“Mas o ponto real é que não houve declínio significativo”, disse ele.
Parecia, continuou, que a esmagadora maioria das faculdades de direito não havia mudado suas práticas de admissão, mas sim que os candidatos rejeitados pelas principais faculdades que não consideravam mais a raça haviam sido repassados para faculdades menos competitivas.
Ele argumentou que a queda na matrícula de negros em Harvard e na Universidade da Carolina do Norte pode, em última análise, ser benéfica, “porque esses alunos irão para outra faculdade onde são mais adequados e estão prontos para ter sucesso”.
Na Harvard Law, os professores estavam se preparando para os números menores. Wilkins disse que os professores que lecionam aulas do primeiro ano notaram um declínio notável em alunos negros, particularmente um número muito pequeno de homens negros: seis.
O presidente da Harvard Black Law Students Association (Associação dos estudantes de direito negros, em uma tradução livre), Sean Wynn, chamou o declínio da matrícula de uma “perda esmagadora” e fez referência à decisão da Suprema Corte.
“Com esse declínio acentuado”, disse, “a decisão quebrou algo fundamental sobre a experiência de frequentar esta faculdade de direito.”
Este artigo foi publicado originalmente no The New York Times