O surto de virose que atinge cidades do litoral de São Paulo e o aumento da quantidade de pontos impróprios para banho de mar não parece ter assustado turistas na praia da Enseada, em Guarujá.
A Folha entrevistou na última sexta-feira (10) turistas e trabalhadores na praia da Enseada, na altura da avenida Santa Maria. O local é 1 dos 51 considerados impróprios para banho, segundo o boletim mais recente da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), divulgado na última quinta-feira (9).
O número manteve a tendência de aumento de locais impróprios desde o último levantamento, que havia mapeado 38 pontos nessa situação no início da semana passada. Ciente do surto de virose, a terapeuta ocupacional Monique Oliveira, 27, aproveitava o sol e bebia cerveja, mas só.
“Só estou tomando água comprada, não entro no mar, não vou comer nada na praia. Para ter ideia, até para os meus cachorros estou dando água de garrafinha.” Recém-chegada de uma viagem ao interior, ela disse ter esperado um pouco para voltar a Guarujá, onde mora, após as primeiras notícias de virose.
Ela também reforçou que evita o banho de mar. “Até porque a gente está de frente para o esgoto, né?”
A poucos metros à direita de onde ela estava, uma tubulação lançava água com cheiro de esgoto e havia lixo, como sacolas plástica e restos de embalagens, acumulado ao redor. Esse canal ia até a água, e havia uma poça, com lodo se formando, mais para a esquerda, quase no limite da praia da Enseada.
A enfermeira Poliana Mendes, 41, e o marido, o músico Fabio Muniz, 40, ficaram apreensivos com as notícias, mas resolveram ir de Botucatu, onde moram, para Guarujá, para levar os filhos e sobrinhos à praia.
Próximas do canal por onde passava a água, as crianças brincavam na areia e, segundo Poliana, que chegou com a família na última quinta-feira (9) e já havia ido à praia, ninguém ficou doente.
“Nós ficamos um pouco assustados também, com os alagamentos, a chuva. No primeiro momento a gente pensou em cancelar, mas falei, ‘vamos arriscar’, porque é tudo um transtorno se for cancelar.” Ela afirmou que todos estavam bebendo e comendo na praia e em restaurantes da cidade e que ninguém havia passado mal.
Com 20 pessoas saídas de Limeira e dividas em duas casas na orla da praia da Enseada, as turistas Debora Garcez, 48, e a filha Ingrid Garcez, 32, já contavam seis casos de virose.
“Em primeiro lugar, eu acho que é muita gente. A cidade se prepara, prepara, mas não é o suficiente. E são muitas vendas, tem as condições dos alimentos, a refrigeração das coisas, muitas pessoas juntas. E os adultos, pelo menos, vêm para beber o dia inteiro e colocam a culpa na virose”, afirmou Debora, que é cozinheira e disse conhecer as sobrecargas nos serviços de restaurantes durante a alta temporada. Para ela, os turistas também não tomam cuidado com alimentos e bebidas e acabam correndo mais risco.
A família trouxe água de Limeira, que também usa para cozinhar, e até remédios para quem talvez sucumbisse ao norovírus ou a outros problemas.
“Uma amiga nossa que mora em Praia Grande avisou que estavam sem alguns remédios nas farmácias, então a gente veio preparada”, disse Ingrid.
Já para os comerciantes, o surto afastou clientes. Em um dos quiosques, o garçom Luis Fernando Moreira, 18, lamentava a pouca demanda por guarda-sóis e produtos.
“Você rala muito para tirar R$ 100, dez guarda-sóis, se muito. O pessoal não quer comer porção, fala que sente cheiro [de esgoto].” Em dias normais, diz ele, toda a faixa de areia ficava cheia de clientes.
Enquanto mostrava mesas, guarda-sóis e cadeiras empilhados no quiosque, ele já pensava em quando poderia recuperar o prejuízo. “Só no Carnaval, agora já era.”
Segundo um guarda-vidas que atuava no local, o movimento de fato está abaixo do esperado para os primeiros dias de janeiro. Mas ele esperava por um aumento no sábado no fim de semana, puxado por excursões rumo ao litoral.
Já o vendedor José Nunes, 61, lamentava a baixa nas vendas de itens de praia como baldinhos para crianças e cangas.
“Não é a concorrência que está grande, tá ruim para todo mundo”, disse ele, que mora há 25 anos em Guarujá e que costuma ver o movimento aumentar a partir de 26 de dezembro e seguir em alta até 20 de janeiro.