O governo de São Paulo decidiu afastar do cargo o diretor do Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais), Fábio Pinheiro Lopes, conhecido com Fábio Caipira, e outros dois delegados após divulgação de trechos da delação do empresário Antônio Vinicius Gritzbach, que foi morto a tiros pouco após sair do aeroporto de Guarulhos no mês passado.
A Secretaria da Segurança Pública afirmou, em nota, que os delegados foram afastados de suas funções a fim de que os fatos sejam apurados. “A medida foi tomada para garantir a isenção das investigações, reafirmando o compromisso da pasta com a legalidade e transparência”, declarou a pasta.
O nome de Lopes aparece nas declarações feitas pelo delator do PCC ao Ministério Público de São Paulo, bem como o do deputado estadual Delegado Olim (PP), e do então titular do 24º DP (Ponte Rasa), Murilo Fonseca Roque, como suspeitos de envolvimento em esquema de corrupção policial.
O afastamento dos policiais foi revelado pelo SBT e confirmado pela Folha na manhã desta sexta-feira (20). Os delegados negam as acusações. Eles estão em férias e serão afastados de suas funções após retorno ao trabalho.
Gritzbach afirmou em delação que um advogado conhecido com Ramses, que teria muita influência na polícia, fez proposta de um acordo, do qual Lopes, Olim e Roque fariam parte, para beneficiá-lo em investigações do Deic das quais era alvo.
O empresário era o principal suspeito de ser mandante do assassinato de Anselmo Becheli Santa Fausta, o Cara Preta, em dezembro de 2021 na zona leste de São Paulo, e de outro membro do PCC. Em acordo de delação premiada, ele acusou policiais civis de exigirem propina para beneficiá-lo em investigações do Deic, como liberação do passaporte, entrega de bens apreendidos, entre outras vantagens.
Para tanto, o empresário deveria pagar R$ 5 milhões, sendo R$ 800 mil de honorários ao advogado e o restante em propina. Parte da propina teria sido paga em imóveis, cheques e mais R$ 300 mil em dinheiro.
Como forma de provar a veracidade do acordo com os policiais, o advogado, ainda de acordo com relato de Gritzbach, enviou um print de localização para mostrar que estava no Deic, e uma foto em que aparece na Assembleia Legislativa.
Conforme integrantes do governo ouvidos pela Folha, essa parte da delação é vista com ressalvas já que o advogado citado seria conhecido na polícia por dar golpes em clientes, vendendo acordos inexistentes.
No caso de Gritzbach, a apuração da própria polícia teria identificado os imóveis supostamente repassados e ambos estão em nome do próprio advogado e da família dele, o que aumentaria a suspeita de que ele tenha sido enganado pelo defensor.
Além disso, as supostas benesses previstas no acordo não foram entregues, como a liberação de bens apreendidos e devolução do passaporte.
Lopes afirmou, em nota, que a investigação do departamento sobre lavagem de dinheiro contra Gritzbach foi realizada dentro da mais estrita legalidade. “Dessa forma, ou o empresário faltou com a verdade para obter vantagens em seu acordo de delação premiada, ou foi enganado pelo mencionado advogado.”
De acordo com o diretor do Deic, os imóveis que o delator diz terem sido usados para pagar a suposta propina estão em nome do próprio advogado Ramsés e da filha dele, e que na investigação feita pelo Deic, Gritzbach não teve nenhuma vantagem. “Ele foi indiciado, teve a prisão pedida, bens bloqueados e continuou com o passaporte apreendido”, afirmou.
Além disso, em entrevista coletiva, ele disse estar “puto” e ser alvo de mentira.
Já o delegado Olim negou qualquer participação no caso.
“Recebo, com veemente indignação, notícias acerca do meu nome e de outras honradas autoridades com fatos nebulosos, imprecisos e improvados, os quais não guardam qualquer relação com a realidade. Não conheço, nunca estive ou recebi pessoalmente, o senhor Antônio Vinicius Gritzbach. Não mantive qualquer contato próximo ou mediato com essa pessoa. Nunca intermediei ou atuei pela gestão de procedimentos judiciais ou extrajudiciais a respeito dele, quem só soube existir quando do seu homicídio, publicamente divulgado, no aeroporto de Guarulhos”, afirmou.
O deputado afirmou que não tem relação com Ramsés.
“Repudio e expresso a minha cabal indignação ao uso de meu nome de forma vil, gratuita e indevida”, afirmou.
O advogado Ramsés Costa, 52, negou as acusações. “Não são verdadeiras as ilações trazidas, nunca contribui direta ou indiretamente para corromper agentes públicos, tampouco usei de influência para tal. Não tratei em momento algum sobre a investigação do Sr. Vinicius com os agentes públicos mencionados na denúncia.”
A reportagem procurou Murilo Roque, mas as ligações e mensagens não foram atendidas. Pessoas ligadas a ele afirmaram que o delegado está indignado com a citação do seu nome nesse episódio porque ele diz jamais ter conversado com o diretor do Deic, com o deputado Olim, e com o advogado.
Delação
Delator do PCC (Primeiro Comando da Capital) e de policiais, Gritzbach fez denúncias contra policiais civis à Corregedoria do órgão, e foi assassinado ao voltar de uma viagem ao Nordeste. Embora tivesse uma escolta particular formada por quatro policiais militares, apenas dois agentes, que não reagiram, estavam próximos dele no momento.
Como a Folha mostrou, na lista de policiais delatados pelo empresário estão integrantes do DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais) e 24º DP (Ponte Rasa), na zona leste.