Técnicos do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) responsáveis por analisar os novos estudos apresentados pela Petrobras para explorar petróleo no chamado bloco 59 da bacia Foz do Amazonas rejeitaram o material entregue pela petroleira e recomendaram, além indeferimento da licença ambiental, o arquivamento do processo.
A Folha teve acesso ao documento com a negativa, assinado por 26 técnicos do órgão ambiental, que foi submetido ao presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho.
Embora o parecer seja claro ao sustentar que a nova versão dos estudos não muda em nada a recomendação já feita pela área técnica em 2023, quando “sugeriu o indeferimento da licença ambiental e o arquivamento” do pedido, Rodrigo Agostinho decidiu manter o processo ativo e dar uma nova oportunidade para a Petrobras prestar mais informações.
A Folha também obteve a decisão de Agostinho sobre o parecer técnico. Nela, ele sustenta que, ao lado da coordenação-geral responsável pelo processo e da diretoria de licenciamento ambiental do Ibama, avaliou que “os avanços apresentados pela Petrobras” sobre o Plano de Proteção e Atendimento à Fauna “permitem o prosseguimento das discussões entre o empreendedor e Ibama, para ciência e apresentação dos esclarecimentos necessários”.
Na prática, o arquivamento do processo recomendado por 26 técnicos foi negado pela diretoria do Ibama. Os pareceres não precisam ser acatados pela chefia, mas trata-se de uma decisão pouco comum no órgão, por contrariar a opinião unânime de mais de duas dezenas de analistas ambientais.
Na conclusão do parecer, os técnicos afirmam que a reapresentação de estudos relacionados aos cuidados com a fauna não mostra “solução compatível para as questões levantadas” anteriormente pelo órgão.
Segundo a avaliação técnica, “não foi apresentada alternativa viável que mitigue, satisfatoriamente, a perda de biodiversidade, no caso de um acidente com vazamento de óleo”.
O parecer detalha a expressiva biodiversidade marinha e a alta sensibilidade ambiental dos ecossistemas que viriam a ser impactados, concluindo que não foram identificados, nos documentos analisados, elementos suficientes que permitissem a revisão do indeferimento.
A respeito dos impactos às comunidades indígenas da região, devido a atividades de apoio aéreo, o novo parecer técnico afirma que a solução apresentada pela Petrobras “resultou em uma evidente contradição no estudo de impacto ambiental”, porque faz diferenciação entre os impactos das aeronaves sobre a avifauna, com reflexo apenas em relação à atividade de perfuração, ou seja, no meio do oceano, enquanto comunidades indígenas têm impactos relacionados ao aeródromo de Oiapoque [no Amapá].
Ainda sobre a questão relacionada às comunidades indígenas, os técnicos afirmam que se constatou a expectativa de potencializar conflitos no território impactado.
Sobre impactos na fauna, o parecer afirma que “permanece uma série de inconsistências fundamentais” para sua adequação ao manual de boas práticas de manejo em área atingida por óleo.
“De forma sintética, nota-se que a empresa apresentou, destacadamente, todos os tempos de atendimento à fauna atingida por óleo, porém, desconsiderando a definição de equipes de execução, tempos de deslocamento, condições meteoceanográficas adversas, impossibilidade de utilização do navio sonda ou embarcações de resgate e estabilização”, dizem os técnicos.
Procurada pela Folha, a Petrobras ainda não se manifestou sobre o assunto.
Já o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, disse à reportagem que decidiu dar andamento ao processo porque ainda vê espaço para explicações da Petrobras sobre seu plano de explorar a bacia Foz do Amazonas.
Agostinho afirmou que fez uma série de pedidos de detalhamento à petroleira, principalmente no que se refere ao local de construção de uma base de apoio para monitoramento da perfuração em Oiapoque, um dos temas mais polêmicos do caso.
“A equipe está pedindo mais informações. A única coisa que eu fiz foi passar esses pedidos de informação à Petrobras. Nem eu nem o coordenador de área [de licenciamento] entendemos que é caso de se fazer arquivamento. Ainda estamos analisando o pedido de reconsideração”, afirmou.
No mês passado, a diretora de Exploração e Produção da Petrobras, Sylvia dos Anjos, disse que estava otimista com a possibilidade de obter a licença ambiental.
A Petrobras esperava obter a licença até outubro, para aproveitar uma janela de operações da sonda de perfuração contratada para esse poço, que está sendo usada em outro projeto.
A Foz do Amazonas já teve 95 poços petrolíferos, com apenas uma descoberta comercial de gás natural e alto índice de abandono por dificuldades operacionais que o setor diz serem reflexos da tecnologia ultrapassada —a região teve seu pico de exploração nos anos 1970.
Dos 95 poços perfurados, 31 foram abandonados por dificuldades operacionais. Na última tentativa, em 2011, a Petrobras suspendeu a perfuração devido a fortes correntezas.
Ocupando uma área de cerca de 350 mil km2, equivalente ao estado de Goiás, a bacia se estende entre a baía de Marajó, no Pará, e a fronteira com a Guiana Francesa.