Em meio à expansão do crime organizado na busca pelo controle de territórios e recursos naturais, 3 de cada 10 cidades da Amazônia Legal têm presença de ao menos uma facção criminosa. Dos 772 municípios na região, 260 convivem com a ação desses grupos.
Em números, o Comando Vermelho, surgido no Rio de Janeiro, está sozinho em 129 cidades. Já a facção paulista PCC (Primeiro Comando da Capital) tem 28 cidades sob seu domínio. Outras 85 cidades têm presença de duas ou mais facções, segundo o mapeamento feito entre janeiro e setembro deste ano.
Os dados são da terceira edição das Cartografias da Violência na Amazônia, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo Instituto Mãe Crioula. Segundo o estudo, a separação entre os grupos de tráfico de drogas e crimes ambientais tem sido borrada nos últimos anos.
Um exemplo é a entrada do PCC, segundo a publicação, no garimpo ilegal de ouro da Terra Indígena Yanomami, que se estende por Roraima e Amazonas. A exploração de minérios como cassiterita e ouro pode ter atraído integrantes da facção como seguranças.
Mas relatos de pessoas envolvidas no garimpo remontam a chegada da facção, assim como os concorrentes do CV, ao período entre 2013 e 2015, diz o estudo. Hoje, segundo relatos colhidos no documento, pode haver inclusive uma divisão de classes. Garimpeiros que fazem o trabalho direto nos rios são apontados como “velhos” e “trabalhadores”, e os “bandidos” ficam responsáveis pelas negociações de ouro, drogas e armas.
Uma hipótese da publicação para o crescimento das facções em solo amazônico é o modelo da alianças e adesões entre grupos dentro das prisões, que amplia as fileiras do crime organizado. Essa medida também acaba por enfraquecer grupos locais por meio de fusões ou incorporações, como ocorreu, segundo o texto, com o Bonde dos 13, do Acre, a Família Terror do Amapá e a União Criminosa do Amapá.
No caso do Bonde dos 13, o grupo é apoiado pelo PCC na tentativa de fazer frente ao domínio do CV em quase todo o território acreano.
Por outro lado, outros grupos locais mantêm uma presença relevante, como o Bonde dos 40, que está sozinho em dez cidades maranhenses. Em outras seis, divide o espaço com o CV, e em Porto Franco, Alto Alegre do Maranhão e Santa Inês, com a facção do Rio de Janeiro e também o PCC.
A outra hipótese para a expansão do crime organizado na Amazônia é o fato de a região ser uma rota obrigatória para redes de mercado de drogas. Nessa logística do tráfico, portos como o de Manaus, de Vila do Conde, em Barcarena, e o de Santarém, oferecem uma entrada direta no trânsito global da droga rumo aos países consumidores.
Parte do termômetro para a presença das facções nos territórios é a apreensão de drogas, que tiveram alta entre 2019 e 2023. Foram 70 toneladas de cocaína apreendidas na região em 2023, mais que o triplo do que as 21,6 toneladas apreendidas em 2022.
O pico recente foi em 2022, com 93 toneladas recolhidas por forças de segurança estaduais e federais, incluindo as Forças Armadas. Já as apreensões de maconha cresceram continuamente ao longo desse período, chegando a 166,9 toneladas em 2023, mais que o dobro do que as 75,5 toneladas registradas em 2022.
Embora o estudo considere a possibilidade de uma estabilização na violência após o estabelecimento de uma facção, dissidências podem elevar os níveis de mortes violentas intencionais, indicador usado pela publicação que considera vítimas de homicídios dolosos, latrocínios, lesões corporais seguidas de morte e mortes causadas por agentes policiais.
Nova Santa Helena, em MT, é a sétima cidade mais violenta da Amazônia Legal, com 102,3 óbitos por 1.000 habitantes. Lá foi registrada a presença da Tropa do Castelar, uma dissidência do Comando Vermelho com perfil mais jovem e mais violento.
A também mato-grossense São José do Rio Claro, oitava mais violenta da região, com 100,1 casos a cada 1.000 habitantes, tem seus 14.911 habitantes convivendo com CV e PCC.