O analista de dados Arthur Rezende, 24, converteu-se ao catolicismo após querer entender melhor o que tinha a dizer “uma instituição de 2.000 anos, sólida”. Ele conta sobre essa jornada em depoimento à Folha.
Meus pais são espíritas, mas eu era espírita não só porque eles eram. Estudava os livros básicos da doutrina, o do Allan Kardec. Desde pequeno frequentava o centro, já participei de reuniões mediúnicas.
No Brasil tem vários tipos de espírita, como os ex-católicos que se converteram ao espiritismo e renegam tudo o que tem a ver com a Igreja Católica. E tem as pessoas que se convertem às duas coisas, né? São católicos, são espíritas, tem uma certa mistura ali.
A visão que eu sempre tive era de que [as duas religiões] são coisas diferentes e tal. Minha visão era bem a visão do brasileiro médio sobre a Igreja Católica.
Na pandemia, parei de frequentar o centro por razões óbvias. Foi quando comecei a pesquisar mais na internet [sobre catolicismo], mais pelo interesse na religião como um todo.
E aí, nessa época, eu falei: cara, não sou batizado, né? Esse foi um grande clique de conversão para mim.
Eu não era batizado. Jesus foi batizado. Será que eu deveria ser batizado? Será que não? Mas o que é o batismo?
Segundo a Igreja Católica, o batismo é um sacramento. Ah, mas o que é um sacramento? E aí fui estudando e entrando em contato com coisas definitivamente católicas.
Num primeiro momento, [acessei] muito material do padre Paulo Ricardo. Lembro de cair num vídeo dele assim: por que o católico não pode ser espírita?
Acho que a [incompatibilidade] central é a definição de quem é Cristo.
Para o espírita, Jesus é um ser evoluído, que foi criado como todos nós, nasceu simples e ignorante, e foi evoluindo ao longo de milhares de anos. Hoje faz parte dos espíritos iluminados, é como se fosse um guia espiritual da Terra.
Na Igreja Católica, Jesus Cristo é Deus que se fez homem, na trindade Pai, Filho e Espírito Santo.
Na minha concepção, se a gente fosse capaz de compreender Deus, ele não seria Deus. Se a gente conseguisse racionalmente olhar e dizer “ah, Deus é isso”. Mas, ao mesmo tempo, existe um caminho racional. Eu fui atrás das duas coisas e comecei a comparar [espiritismo e catolicismo].
Sempre achei importante ter uma religião, né? Eu estava num limbo. Não, acho que não dá mais para ser espírita. E virar católico parecia uma coisa radical.
A fé é de Deus para nós, né? Então, não é dizer “ah, eu virei católico porque eu fui estudar”. Mas, para mim, o processo de conversão passou por essa parte racional, vamos dizer assim.
Dava para contar nos dedos as vezes em que eu tinha ido na missa —sei lá, para o batismo de alguma prima. Tive uma ex-namorada que era católica. Eu não conseguia imaginar casar [com ela] justamente pensando nessa diferença de religião.
Antes, para mim a igreja era algo completamente irracional. Eu via as pessoas indo se confessar e achava, “pô, que hipocrisia, ficar fazendo um monte de merda e depois ir lá e se confessar”. Tipo, para que serve isso?
Percebi que a ideia que eu tinha, de que era uma historinha que meia dúzia de pessoas inventaram, falava sobre uma instituição de 2.000 anos, sólida. Bom, acho que preciso ser humilde e entender quais são os argumentos de São Tomás de Aquino para essas coisas que a igreja defende, por exemplo.
Estudei os sacramentos: o que é o batismo, o que é o casamento, o que é a confissão —essa percepção de que não é o padre que está ali decidindo se vai perdoar [quem confessa um pecado].
O argumento é que isso que foi instituído por Jesus, dando a autoridade aos seus sucessores, que são os apóstolos, e depois aos sucessores deles, os padres. Quando o padre dá o perdão dos pecados, está agindo “in persona Christi”, no lugar de Cristo.
Então, eu estava nesse limbo. Achei que precisava resolver isso. Tem um serviço de assinatura católica muito legal, Minha Biblioteca Católica. Eles mandam um formulário em que perguntam: você é católico? Botei: não. Mas teve um momento em que falei: não dá para voltar pra trás, certo? Sou católico.
O batismo não foi essa experiência mística para mim. Quando vejo outros adultos e crianças sendo batizados, me emociona. Mas no dia lá acho que eu estava meio anestesiado. Foi em 2022.
Me casei em setembro de 2023. Minha esposa é católica. Descobri que ela era meio “católica de IBGE” [não praticante]. Ela ficou mais interessada e se aproximou da igreja mais ou menos nessa época em que eu estava me convertendo.
A liturgia ao redor da missa é belíssima. E eu gosto de música, né? Então, poder ter a oportunidade de estar num coral, com um canto gregoriano, com um órgão, acho belíssimo.
Na minha bolha, a percepção é de que tem mais pessoas se convertendo, tentando deixar de ser um “católico de IBGE” para ser um católico que entende o que é a igreja. Na Catedral da Sé, 300 jovens e adultos receberam o sacramento do Cristo [no último sábado de novembro], a crisma.
Quando a pessoa entende que a igreja não é essa visão estereotipada que a gente vê na escola, não é esse monte de bobagem, ela vai perceber uma riqueza absurda.
Entenda a série
A Folha questionou um evangélico, um católico, um muçulmano, uma umbandista e uma hare krishna sobre os motivos que os levaram a trocar de crença. As respostas, em formato de depoimento pessoal, serão publicadas a partir desta quinta (26), na série Convertidos.