A Agência Espacial Europeia (ESA) revelou um primeiro fragmento do mapa do Universo realizado pelo telescópio Euclid para desvendar o mistério da matéria escura.
Na estreita faixa de um preto profundo, salpicada por pontos brilhantes, estendem-se vaporosas nuvens azuis: são “cirrus galácticos”, mistura de poeira e gás com o qual vão se formar novas estrelas, explica à AFP Bruno Altieri, cientista da ESA encarregado do arquivo sobre o Euclid.
Fazendo um zoom em profundidade, é possível ver a estrutura complexa de uma galáxia em espiral ou duas galáxias que interagem.
“Só nesta imagem já há dezenas de milhões de galáxias, graças às quais será possível estabelecer estatísticas sobre onde alguns tipos de galáxias se encontram em relação às outras, como evoluem no tempo, a razão pela qual não formam mais estrelas há alguns bilhões de anos”, afirma Altieri.
Essa imagem “impressionante” é o primeiro 1% de um mapa que, em seis anos, “revelará mais de um terço do céu”, ressaltou Valeria Pettorino, cientista do projeto Euclid na ESA em um comunicado publicado nesta quarta-feira (16).
Esse mosaico de 208 gigapixels foi realizado a partir de 260 observações feitas pelo Euclid em apenas duas semanas, entre 25 de março e 8 de abril passado.
O telescópio cobriu 132 graus quadrados do céu austral, ou 500 vezes a superfície visível da Lua.
Lançado em julho de 2023, o Euclid pode capturar uma cena em uma única imagem graças ao amplo campo de visão em luz visível e infravermelha. Isso o diferencia do telescópio James Webb (seu vizinho a cerca de 1,5 milhão de quilômetros da Terra), que “enxerga” com menos amplitude, porém mais longe.
Seu objetivo final é esclarecer um dos maiores enigmas científicos, o da matéria escura e da energia escura, que constituem 95% do Universo, mas sobre as quais não se sabe quase nada.
A matéria escura (25% do Universo) e a energia escura (70%) têm efeitos contrários: enquanto a primeira garante a coesão das galáxias, a segunda provoca a expansão do Universo.
No caso da matéria escura, sabe-se que existe por causa de uma constatação misteriosa: é impossível de explicar se for levada em conta exclusivamente a força gravitacional dos corpos visíveis (planetas, estrelas…) por que uma galáxia ou um grupo de galáxias não se dispersa.
“Não pode ser observada diretamente, mas seus efeitos gravitacionais podem ser vistos”, diz Altieri.
Desde os anos 1990, sabe-se que a expansão do Universo se acelera, o que implica na existência em larga escala de uma força repulsiva: a energia escura. A aceleração desta expansão teria começado há seis bilhões de anos.
Graças a esse mapa tridimensional, o Euclid facilitará fazer medições sobre a distribuição das galáxias e a expansão do Universo e, dessa forma, refinar os modelos cosmológicos teóricos.
Ao capturar as formas, as distâncias e os movimentos de bilhões de galáxias, “pode-se deduzir a distância das galáxias de diferentes maneiras, por imagens fotométricas, espetroscópicas, e observar como as estruturas evoluem no Universo porque quanto mais longe se vê, mais se aprofunda no tempo”, diz Altieri.
O Euclid permitirá observar uma parte do Universo entre 10 bilhões e 4-5 bilhões de anos-luz, “onde todas essas estruturas evoluíram bastante, e onde a energia escura começou a agir”, acrescenta o cientista da ESA.