Por muitos anos, lugares ricos como os Estados Unidos e a Europa tiveram a maior responsabilidade histórica pelo aquecimento global e foram encarregados de liderar os esforços para detê-lo.
A ascensão surpreendente da China está mudando essa dinâmica.
Nas últimas três décadas, a China construiu mais de 1.000 usinas a carvão enquanto sua economia cresceu mais de 40 vezes. O país se tornou, de longe, o maior emissor anual de gases de efeito estufa do mundo.
Os Estados Unidos ainda lançaram mais poluição total que aquece o planeta na atmosfera desde o século 19, em parte porque o país queima carvão, petróleo e gás natural há mais tempo. Mas a China está rapidamente alcançando.
No ano passado, pela primeira vez, a China ultrapassou a Europa como o segundo maior emissor histórico, de acordo com uma análise publicada na terça-feira (19) pelo Carbon Brief, um site de pesquisa climática.
Quando os humanos queimam combustíveis fósseis ou desmatam florestas, o dióxido de carbono resultante geralmente permanece na atmosfera por centenas de anos, aquecendo o planeta durante todo esse tempo. É por isso que as emissões históricas são frequentemente usadas como um indicador de responsabilidade pelo aquecimento global.
A China, por sua vez, prometeu que suas emissões atingirão o pico nesta década e depois começarão a cair. O país está instalando mais turbinas eólicas e painéis solares do que todas as outras nações juntas e lidera o mundo em vendas de veículos elétricos. Mas mesmo com a mudança da China para energia de baixo carbono, a análise do Carbon Brief descobriu que as emissões históricas da nação estão projetadas para se aproximar das dos Estados Unidos nos próximos anos.
UMA QUESTÃO DE DINHEIRO
A responsabilidade histórica da China pelas mudanças climáticas tornou-se um ponto de grande controvérsia na política climática global.
Nesta semana, diplomatas e líderes de quase 200 países se reuniram na cúpula climática das Nações Unidas em Baku, Azerbaijão, para discutir como arrecadar os trilhões de dólares que as nações vulneráveis precisarão para mudar para energia limpa e lidar com secas, ondas de calor, inundações e outros perigos de um planeta em aquecimento. Uma grande questão é de onde esse dinheiro deve vir.
Tradicionalmente, a resposta tem sido que países ricos e industrializados —como os Estados Unidos, Japão, Canadá, Austrália e a maior parte da Europa Ocidental— devem pagar.
Sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas originalmente escrita em 1992, no Rio de Janeiro, esses países desenvolvidos foram chamados a fornecer ajuda financeira. Países como China, Índia e Arábia Saudita, assim como todas as nações da África, são classificados como em desenvolvimento por esse quadro e não foram obrigados a contribuir.
Hoje, no entanto, muitas nações ricas dizem que essa distinção não faz mais sentido. Líderes dos Estados Unidos e da União Europeia pediram à China que contribua mais com financiamento climático para países mais pobres como parte de um acordo final em Baku.
“Uma base de doadores expandida já era necessária há muito tempo”, disse John Podesta, conselheiro climático internacional do presidente Joe Biden, na semana passada. “Não estamos em 1992 em termos da estrutura econômica do mundo.”
A China, por sua vez, argumentou que já forneceu cerca de US$ 24,5 bilhões (cerca de R$ 140 bilhões) em financiamento climático para outros países em desenvolvimento desde 2016. Mas autoridades europeias disseram que a China não está sujeita aos mesmos requisitos de transparência e instaram o país a formalizar a ajuda que fornece sob acordos da ONU. Até agora, a China tem se mostrado relutante em fazer isso.
Em um discurso na semana passada, Ding Xuexiang, vice-primeiro-ministro da China, disse que os países ricos liderarem na oferta de ajuda financeira era uma “pedra angular” dos acordos climáticos globais.
Ao mesmo tempo, outros líderes mundiais criticaram emissores ricos como os Estados Unidos e a Europa por ficarem atrás nas promessas anteriores de ajuda climática e os instaram a não apontar a China como desculpa para a inação.
“Não podemos continuar a ouvir as mesmas promessas enquanto pequenas ilhas sofrem na ausência de ação real daqueles mais responsáveis pelas mudanças climáticas”, disse o primeiro-ministro Gaston Browne de Antígua e Barbuda.
OUTRA FORMA DE VER AS EMISSÕES
As emissões totais não são o único critério a considerar em questões de justiça. Outro é as emissões por pessoa.
Como a China tem 1,4 bilhão de pessoas, suas emissões históricas per capita ainda são menores do que as dos Estados Unidos, União Europeia, Japão e Canadá.
E enquanto a Índia é hoje um dos maiores consumidores de combustíveis fósseis do mundo, suas emissões históricas por pessoa são relativamente pequenas. A Índia é o país mais populoso do mundo, mas ainda relativamente pobre, com dezenas de milhões de pessoas ainda sem acesso confiável à eletricidade. A Índia diz que deve ser concedido tempo para queimar mais combustíveis fósseis enquanto se desenvolve.
Ao mesmo tempo, algumas nações ricas produtoras de petróleo e gás, como Arábia Saudita e Catar, têm emissões per capita desproporcionalmente grandes. Líderes americanos e europeus sugeriram que esses países também deveriam ser chamados a contribuir mais com financiamento climático.
Como essas disputas serão resolvidas determinará em grande parte se os negociadores de quase 200 países em Baku podem concordar com uma nova meta para fornecer até US$ 1,3 trilhão por ano em ajuda climática. Especialistas dizem que não será fácil chegar a um acordo na cúpula, que está programada para terminar na sexta-feira.