A inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dúvidas sobre a saúde e disposição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para concorrer a um novo mandato em 2026 estão dando esperanças a partidos de centro de aumentar sua influência no cenário político nacional.
Os partidos do centro saíram vitoriosos nas eleições de 2024, superando o PL e o PT na conquista de prefeituras. Juntos, PSD, MDB, PP, União Brasil e Republicanos passaram a comandar mais de 3.500 cidades. O PL ganhou em 516 prefeituras e o PT em 252.
A reportagem apurou que lideranças do centro cogitam diferentes cenários. Se nem Bolsonaro nem Lula concorrerem, os partidos de centro esperam exercer influência na escolha dos candidatos tanto do PL quanto do PT. Segundo um líder de partido que tem trânsito com as duas legendas e pediu para não ter o nome revelado, a escolha de um nome mais “moderado” poderia arrefecer a polarização no país.
No cenário em que concorram Lula e um candidato indicado por Bolsonaro, o Centrão se articula para indicar nomes para as vagas de vice de cada partido.
No PL, o presidente da sigla, Valdemar Costa Neto, já iniciou tratativas com o governador do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), sobre uma possível vaga de vice na chapa presidencial de Bolsonaro. Apesar de não haver um acordo fechado sobre o assunto, a avaliação de membros do Partido Liberal é que será inevitável incluir a sigla de Gilberto Kassab na próxima eleição.
O União Brasil trabalha ainda com a possibilidade de ter um candidato próprio. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado, já afirmou que concorrerá à Presidência e deve lançar candidatura em março. Há ainda a hipótese de que o partido faça prévias, pois dialoga com o candidato derrotado à prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal. Não há indicativos por ora de que o Bolsonaro apoie essas candidaturas se não puder concorrer.
O PT, por sua vez, está em processo de discussão interna sobre abrir mais espaço no governo para o Centrão já no começo de 2025, por meio de uma reforma ministerial. Nesse contexto, o governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), já foi citado como uma possibilidade para integrar uma eventual chapa de Lula em 2026.
Seja mais próximo da direita ou da esquerda, parlamentares do Centrão dizem acreditar que o país já teve “o suficiente” da polarização entre Lula e Bolsonaro. Um deputado do centro, que pediu para não ter o nome revelado, afirmou que o resultado da eleição municipal pode influenciar consideravelmente o poder de influência do Centrão em 2026, mas que o “cansaço do eleitor” em relação à polarização também é um fator observado por quem não se encontra ideologicamente alinhado.
Sem candidatos a Presidente, esquerda e direita teriam menor poder de barganha
O poder político de Lula e Bolsonaro como cabos eleitorais para aliados continua sendo o principal ativo do PT e do PL. Entretanto, o entendimento é que, se seus nomes não estiverem nas urnas, partidos de centro terão vantagem ao negociar apoios.
A análise de quem observa a situação de Lula e Bolsonaro é que a margem de transferência de votos para seus possíveis sucessores pode ser menor do que se espera. Para Lula, a situação da economia ao final de 2025 será fundamental para viabilizar uma eventual candidatura de Fernando Haddad, atual ministro da Fazenda.
Já para Bolsonaro, os desgastes provocados pela Operação Contragolpe, que apura uma suposta tentativa de golpe de Estado, vão pesar na possível escolha de um substituto.
Além disso, o próprio PL trabalha para que, no cenário sem Bolsonaro, um nome mais aceito pelo Centrão seja escolhido. O plano inicial do partido seria apontar o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, como candidato. No entanto, ele já sinalizou que disputará a reeleição ao governo paulista. Com a negativa do ex-ministro da Infraestrutura, os nomes de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filhos do ex-presidente, passaram a circular nos bastidores.
Apesar de Eduardo ter uma situação jurídica mais favorável do que seu irmão, o centrão e até mesmo integrantes do PL avaliam que Flávio seria um nome mais adequado, por possuir articulação com diferentes grupos do Congresso. Entretanto, a ala mais próxima a Bolsonaro entende que o indicado do ex-mandatário deveria ser Eduardo, por possuir um perfil mais conservador.
Parte do PT quer Bolsonaro elegível para 2026
Se o embate entre Lula e Bolsonaro é visto como algo ruim pelo Centrão, para uma parte do PT ele é necessário para a sobrevivência política. Sob anonimato, um parlamentar que possui trânsito com a sigla afirmou à Gazeta do Povo que alguns petistas desejam que Bolsonaro seja reabilitado eleitoralmente para que Lula tenha um oponente para polarizar.
A leitura de integrantes do partido é que o retorno de Bolsonaro à disputa daria a Lula uma vitória mais tranquila, visto que, para alguns, a rejeição a Bolsonaro seria maior do que a rejeição a Lula. Caso outro candidato surgisse, o cenário seria mais incerto.
Uma ala do Centrão, no entanto, acredita que o ex-presidente pode vencer Lula caso seja reabilitado eleitoralmente. Além dos fatores econômicos negativos do governo Lula, analistas apontam que o recado das urnas em 2024 favoreceu o centro e a direita, o que pode se repetir em 2026.
Direita pode se fragmentar em 2026
O cientista político Adriano Cerqueira, docente do Ibmec de Belo Horizonte, analisa que o cenário eleitoral de 2026 tende a ser marcado pela fragmentação da direita, enquanto a esquerda trabalha para concentrar forças em torno de menos candidatos.
“A tendência do eleitorado nacional é mais à direita, o que favorece a competitividade, com mais nomes surgindo para disputar o espaço deixado por Bolsonaro, caso ele não seja candidato”, afirmou.
Por outro lado, Cerqueira aponta que a esquerda deve caminhar em direção à unidade, especialmente diante das incertezas sobre a candidatura de Lula. “Se Lula não for candidato, partidos como o PSB podem se consolidar como forças importantes nacionalmente, até mesmo superando o PT em relevância em certos cenários.”
Ele destaca ainda que, enquanto a direita aposta em novas lideranças e no fortalecimento de partidos como o PL e o Republicanos, “a esquerda parece estar mais focada em organizar suas candidaturas, buscando maior coesão para enfrentar o favoritismo do eleitorado conservador.”
Centrão deve continuar no comando da Câmara e do Senado até 2026
O favoritismo do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) para assumir a Presidência da Câmara é citado como exemplo do tipo de articulação que o Centrão poderá fazer com a esquerda e a direita em 2026, principalmente após a eleição municipal.
Atualmente, o deputado paraibano conta com o apoio de 17 dos 19 partidos com representação no Congresso Nacional – incluindo PT e PL. As legendas juntas somam 488 parlamentares, muito acima dos 257 necessários para a vitória de Motta na eleição.
A articulação para esse apoio passou pelo entendimento de que o candidato apadrinhado por Arthur Lira (PP-AL), atual presidente da Casa, seria unanimidade. Além disso, a rejeição ao nome de Motta poderia deixar o partido que se opusesse fora da Mesa Diretora no próximo biênio (2025-2026). Situação semelhante ocorreu no Senado, onde Davi Alcolumbre (União-AP) também angariou apoio de quase todos os partidos para suceder Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
As eleições ocorrerão nos primeiros dias de fevereiro e a expectativa é que o Centrão continue no comando do Congresso. Isso dará força para que partidos desse bloco tenham musculatura política para eleger novos quadros no próximo pleito. Além disso, Alcolumbre e Motta são vistos como figuras capazes de contornar o entrave entre Legislativo e Judiciário acerca das emendas parlamentares – novamente bloqueadas pelo ministro do STF Flávio Dino.
O cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), analisa que a próxima composição da Câmara e do Senado tende a favorecer a centro-direita e a direita. “A marcha dos acontecimentos sugere um aumento das forças legislativas conservadoras em termos de costumes e liberais em termos econômicos, ainda que, no Brasil, conservadorismo e liberalismo sejam relativos e dependam de lobbies, corporativismo e clientelismo”, destacou.
Ele também aponta que esse cenário pode criar condições favoráveis para aprovações legislativas robustas. “Com uma maioria conservadora e liberal, poderíamos ter mudanças significativas em políticas públicas, projetos relacionados ao armamento e respostas mais contundentes ao ativismo judicial. Em um ambiente político favorável, até mesmo um impeachment de um ministro da Suprema Corte poderia ser cogitado.”