Meus sogros são meus sogros há 10 anos. Nesse período já os vi em diversas dietas. Quando uma acaba, outra começa. Minhas tias também. E meus pais oscilam entre comida à vontade e o desejo de cumprir a dieta restritiva “perfeita”. Meus amigos mais próximos falam sobre conhecidos que aplicam Ozempic para perder 2 ou 3 kg. Duas pessoas que vejo diariamente tomam remédio para emagrecer. Não é à toa. Desde sempre os formatos de nossos corpos são categorizados como magros e gordos, sendo que a segunda opção “precisa” ser “resolvida”. E assim, diminuir os números na balança se torna uma ferramenta na tentativa vã de controlar alguma coisa diante de rotinas cheias e expectativas frustradas.
Os encontros familiares se guiam por conversas sobre evitar alimentos, como doces e álcool. O que, é claro, poderia ser saudável, se fosse saudável. Entende? Ou ao menos, se fosse sustentável. Mas até aqui o que observei foi inconstância: perder peso é difícil, manter é difícil. Então vamos de 8 ou 80: come-se de tudo e depois, priva-se na mesma medida. É claro que os números na balança oscilam. E também a autoestima, sempre instável entre a imagem do outro e a nossa.
Mas o problema não é esse: enquanto se pesam, para mais ou menos do que desejam, todos ao redor me dizem como estou magra, nunca irei engordar porque “eu me cuido”. Os que sabem da minha trajetória com transtornos alimentares se esquecem que “me cuidar” (se o que isso significa é não pular refeições e mover meu corpo de vez em quando para controlar a ansiedade) é a única forma de não ter recaídas a episódios de compulsão alimentar, vômito, privação. Um cuidado que inclui pães, doces, álcool (se eu sentir vontade). No meu caso, a única restrição é restringir.
Os exercícios físicos, que são remédios para minha saúde mental, também podem ser uma ferramenta de auto-ódio, usada para tentar controlar o meu corpo quando algo não vai bem. Não funciona. Por isso, como já contei antes, deixo de me exercitar quando meu único desejo é emagrecer magicamente. Embora eu tenha aprendido a amar me mexer, eu não quero querer (ainda que queira com certa frequência) ter o corpo de uma pessoa que vive apenas para um objetivo estético.
Dia desses, falando com uma entrevistada para o blog, a Micaela, do perfil Comida Sem Regra, uma chavinha girou. Ela me disse que é importante se perguntar se a vida que queremos condiz com os 10 kgs que buscamos perder. Você está disposta? Do que você vai abrir mão? Percebi que estou sempre respondendo a essa pergunta, repassando mentalmente o que vale a pena deixar para trás.
Eu não quero abrir mão do bolo de aniversário depois de um parabéns caloroso, animado, cheio de amor. Não quero abrir mão da pizza que o meu padrasto faz para mim quando consigo visitá-lo, a massa que ele abre e o recheio que faz porque sabe que eu gosto. Não quero deixar de comemorar mais um ano de namoro com a pessoa que me ajuda a seguir feliz na vida. Não quero dizer não a um sorvete todas as poucas vezes que minha tia, que ama esse doce, me convida para um.
Não, eu também não quero comer pizza, sorvete e bolo todos os dias. Mas eu desejo que as minhas lembranças sejam menos sobre odiar o que vi no espelho e mais sobre os momentos que passei com quem amo. Amando.
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