Para entender a origem dos dinossauros, paleontólogos europeus decidiram levar às últimas consequências o ditado “você é o que você come”. Analisando fezes e restos de vômito com mais de 200 milhões de anos, eles conseguiram reconstruir detalhadamente as cadeias alimentares da época da ascensão dos dinos.
O processo, de acordo com eles, pode ser descrito como uma expansão segura, lenta e gradual do grupo dos dinossauros, que começam pequenos e oportunistas, sem se destacar muito entre os demais répteis, e vão aumentando gradualmente de tamanho, ganhando proeminência graças a mudanças no clima e na vegetação.
A inusitada análise saiu nesta quarta-feira (27) no periódico científico Nature e tem como principais autores Martin Qvarnström e Grzegorz Niedźwiedzki, ambos ligados à Universidade de Uppsala, na Suécia (Niedźwiedzki também trabalha no Instituto Geológico Polonês, em Varsóvia).
A dupla e seus colegas estudaram os fósseis da chamada Bacia Polonesa. Essa subdivisão geológica da Europa centro-oriental é importante justamente por abranger boa parte do período de surgimento e diversificação dos dinossauros, com rochas que vão do meio do Carniano (230 milhões de anos antes do presente) até o começo do Hettangiano (200 milhões de anos atrás).
Suecos e poloneses, junto com colegas na Noruega e Hungria, tiveram acesso a mais de 500 bromálitos, como são conhecidos os restos fossilizados do conteúdo do sistema digestivo, já excretado ou não. Isso inclui tanto fezes quanto o que ainda estava no estômago ou no intestino do bicho no momento de sua morte, além dos chamados regurgitálitos (vômito fóssil).
A preservação dos bromálitos permite, é claro, estimar quais animais e plantas estavam virando almoço, já que é possível detectar a presença de coisas como pedaços de folhas, grãos de pólen, escamas (de peixes ou de animais terrestres) e ossos das espécies devoradas. Além disso, o tamanho e o formato das fezes petrificadas trazem pistas sobre o responsável pela excreção.
Tais informações foram combinadas com o que se sabe sobre ossos fossilizados e pegadas de animais na mesma região e época para traçar um retrato das relações ecológicas entre os animais da Bacia Polonesa ao longo do tempo.
Existem algumas coisas relativamente comuns em todas as fases analisadas pela equipe –por exemplo, a importância dos peixes como fontes de alimento para diferentes grupos de predadores, e a capacidade predatória de um subgrupo dos peixes, os tubarões, ainda muito importantes nos ecossistemas atuais.
Por outro lado, as transformações graduais, que os cientistas subdividiram em cinco fases evolutivas, ajudam a enxergar como os dinossauros se diversificaram e se tornaram o grupo dominante entre os vertebrados terrestres.
Nas fases 1 e 2 do “plano” (obviamente involuntário) de conquista do planeta, eles são só apenas mais um grupo de onívoros de pequeno porte, pouco numerosos e generalistas em seus hábitos. Nessa época, dividiam a região com anfíbios de grande porte e com cauda, répteis herbívoros gorduchos que pareciam pequenos hipopótamos e parentes dos crocodilos que comiam plantas.
Nas fases 3 e 4, alguns dos dinos primevos se tornam predadores de médio porte e surgem os primeiros herbívoros do grupo, que vão ficando cada vez maiores, enquanto os concorrentes vão desaparecendo paulatinamente. Por fim, a fase 5 corresponde à ascensão dos sauropodomorfos –herbívoros imensos e quadrúpedes, de pescoço longo– e ao aparecimento de superpredadores de grande porte que passam a caçá-los.
É possível que a chave para essa transformação tenha sido a mudança climática por volta da fase 3, com um aumento da umidade que levou ao surgimento de uma vegetação densa e diversificada, semelhante à das florestas tropicais de hoje. Para confirmar a ideia e o modelo das cinco fases, serão necessários mais estudos –inclusive no Brasil, que abriga uma rica fauna de dinossauros primitivos.