A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH) condenou nesta quarta-feira (4) o Estado do Brasil pelo desaparecimento forçado, em 26 de julho de 1990, de 11 jovens que passavam o dia em um sítio no bairro de Magé e eram moradores de Acari, na Zona Norte do município do Rio de Janeiro, bem como por graves falhas nas investigações realizadas em decorrência desses fatos, que ficaram conhecidos como Chacina de Acari.
Na sentença notificada às partes, a CorteIDH considerou o Estado do Brasil internacionalmente responsável pela violação dos direitos ao reconhecimento como pessoa perante a lei, à vida, à integridade pessoal e à liberdade pessoal, e pela violação da obrigação de não praticar, permitir ou tolerar o desaparecimento forçado de pessoas.
“A Corte concluiu que os 11 jovens de Acari foram desaparecidos forçadamente por agentes estatais. O Estado não realizou uma investigação séria, objetiva e efetiva com o objetivo de determinar a verdade”, afirma a sentença.
O texto acrescenta que “mais de 34 anos se passaram desde o desaparecimento forçado das 11 pessoas e, apesar dos esforços de busca e das demandas por justiça das mães das vítimas, por meio do movimento Mães de Acari, os fatos permanecem em absoluta impunidade, e o paradeiro de seus entes queridos ou os possíveis autores dessa grave violação dos direitos humanos são desconhecidos”.
Em julho de 1990, seis policiais uniformizados, supostamente pertencentes ao grupo de extermínio Cavalos Corredores (composto por policiais do 9º Batalhão da Polícia Militar de Rocha Miranda), invadiram a casa de Edméa da Silva Euzebio e retiveram Edson de Souza Costa, Moisés dos Santos Cruz e Viviane Rocha da Silva, ameaçando-os de morte e exigindo uma grande quantia em dinheiro.
Dias depois, um grupo de oito homens encapuzados, também supostamente pertencentes aos Cavalos Corredores, invadiu a casa de Laudicena de Oliveira Nascimento, avó de um dos jovens desaparecidos, dizendo-se policiais e exigindo dinheiro.
Os agentes tinham sequestrado Wallace Souza do Nascimento, Hedio Nascimento, Luiz Henrique da Silva Euzebio, Viviane Rocha da Silva, Cristiane Leite de Souza, Moisés dos Santos Cruz, Edson de Souza Costa, Luiz Carlos Vasconcellos de Deus, Hoodson Silva de Oliveira, Rosana de Souza Santos e Antonio Carlos da Silva, todos moradores da favela de Acari. Até hoje, o paradeiro dos 11 jovens permanece desconhecido.
Posteriormente, em 1993, Edméa da Silva Euzebio, líder do grupo Mães de Acari e mãe de Luiz Henrique da Silva Euzebio, e sua sobrinha Sheila da Conceição foram assassinadas na estação de metrô Praça Onze, no Rio de Janeiro.
O assassinato de Edméa ocorreu logo após ela ter prestado depoimento perante uma autoridade judicial sobre o envolvimento de policiais no desaparecimento dos 11 jovens. Os processos criminais iniciados por esses assassinatos culminaram com a absolvição dos quatro policiais militares acusados em abril de 2024.
Na sentença, a CorteIDH aceitou o reconhecimento parcial de responsabilidade feito pelo Brasil e considerou que “tem um caráter limitado, em virtude de se referir a uma parte específica dos fatos e das violações alegadas”, cita o texto.
Como parte das medidas de reparação, a CorteIDH ordenou ao Estado do Brasil que continue com a investigação sobre o desaparecimento forçado dos 11 jovens, realize uma busca rigorosa do paradeiro dos jovens desaparecidos e crie um espaço de memória no bairro de Acari, entre outras medidas.