Minha relação de ódio e amor —nessa ordem— pela academia de ginástica é antiga. Mas não adianta, o corpo é soberano, e com a idade ele vira um ditador quando te dá apenas duas escolhas: ou musculação ou lesão.
Enquanto sofro na academia, há os que morrem de prazer com os exercícios —também conhecidos como “treino”, expressão à qual não me acostumo. Alguns emitem gemidos estranhos quando levantam pesos, outros sentem tesão pela própria imagem no espelho ou, na melhor das hipóteses, pelo personal trainer. Mas os prazeres da academia não se resumem a isso, eles têm uma ampla gradação, desde o sonho do corpo perfeito até o orgasmo, literalmente.
Uma influencer —também conhecida como “criadora de conteúdo”, expressão à qual não me acostumo— expôs nas redes a sua experiência de ter “sofrido”, se é que cabe essa palavra, um orgasmo enquanto realizava exercício físico em uma academia. A felizarda foi atacada nas redes, principalmente por homens, ao mesmo tempo que fez com que as mulheres, desde as mais sedentas até as mais sedentárias, corressem para as academias.
O “coregasmo”, como é chamado o ápice de prazer durante um exercício físico, acontece pela estimulação de 29 pares de músculos da região do core. É uma ótima ideia para maximizar o investimento: concilia o cuidado com a saúde e a satisfação plena. Com essa dobradinha, sobra mais tempo para gozar (com o perdão do trocadilho) a vida com coisas menos importantes.
Outra criadora de conteúdo foi recentemente banida das academias nos estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul por ter gravado vídeos considerados obscenos. Ela fazia movimentos encostando as partes íntimas, por cima das roupas, nos aparelhos de musculação.
Coincidência ou não, depois que a notícia viralizou, a frequência feminina nas aulas de spinning na minha academia aumentou consideravelmente. Como prefiro a corrida, só passei a tomar um cuidado redobrado na limpeza dos aparelhos antes de usar.
Ainda estou me ambientando com as nomenclaturas e funções, vivo confundindo abdutor com adutor, já fiz supino achando que estava trabalhando ombro e escolho os pesos de acordo com a cor. Mas o principal eu já decorei, a fórmula pétrea: três séries de 15, invariavelmente. Provavelmente resultado de um estudo profundo que concluiu precisamente que 14 é pouco e 16 é demais.
Quando vejo mulheres irritantemente lindas, insuportavelmente durinhas e de formas desaforadamente tão perfeitas, me pergunto: o que elas estão fazendo aqui, a não ser querer me humilhar?
O mundo fitness é um universo à parte. Tem as drosófilas humanas que te cercam perguntando: “falta muito?” ou “podemos revezar?”. Tem os espertinhos que reservam três aparelhos, deixando o celular em um, a toalha em outro, enquanto usa o terceiro. Tem “a galera”, que passa a manhã toda na academia, troca receitas de suplementos, toma banho, almoça, e só depois começa o dia. Tem os pegajosos que insistem em usar a esteira colada na sua, mesmo com a academia deserta. Tem, ainda, os fotógrafos compulsivos, que transformam os treinos diários em um documentário nas redes, com legendas motivacionais do tipo #TaPago, #PartiuTreino, #BumbumNaNuca, #EndorfinaSuaLinda, #MeAmando.
E tem eu, que aguenta tudo isso mesmo sem esperanças de conseguir estimular 29 pares de músculos do core, que treina mais a observação do que os músculos, e que, principalmente, odeia o assento quentinho de um aparelho recém-usado.
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