Uma investigação iniciada no Brasil contra um soldado israelense de férias no país, no final do ano passado, tem sido alvo de críticas e questionamentos, nos últimos dias, depois que uma organização sem fins lucrativos apresentou uma denúncia contra o militar, acusando-o de “genocídio” e outros crimes de guerra na Faixa de Gaza.
A Justiça brasileira, então, determinou que a Polícia Federal (PF) apurasse as alegadas denúncias. Nesse tempo, o soldado conseguiu deixar o país.
Ele contou com o auxílio da embaixada de Israel em Brasília para conseguir ir para a Argentina e também com manifestações de apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro e outros políticos brasileiros.
A Fundação Hind Rajab (HRF), ONG pró-palestinos com sede na Bélgica, foi a organização que esteve por trás da queixa.
A entidade foi criada há pouco tempo, bem depois do início da guerra no Oriente Médio, entre Israel e o Hamas, grupo terrorista palestino que deu início ao conflito após matar milhares de israelenses em uma invasão surpresa a partir da Faixa de Gaza, em 7 de outubro. Segundo a ONG Monitor, a fundação foi formada em setembro do ano passado.
Desde então, a HRF se mobilizou para denunciar milhares de militares israelenses por supostos crimes de guerra em diferentes países. Entre os casos mais recentes estão uma ação contra um adido militar de Israel em Bruxelas e um soldado que viajava pelo Sri Lanka. Além desses episódios, a fundação também teve como alvo soldados em férias na Holanda e nos Emirados Árabes Unidos.
Em novembro, a ONG solicitou ao Tribunal Penal Internacional (TPI) que emitisse mandados de prisão contra aproximadamente mil soldados das Forças de Defesa israelenses (FDI).
A HRF alegou, na ocasião, ter coletado cerca de oito mil evidências da participação dos denunciados em crimes de guerra em Gaza, como destruição de infraestrutura civil, ocupação de casas, saques e ataques contra os habitantes do enclave.
Em seu site, a Hind Rajab Foundation diz que tem como objetivo “quebrar o ciclo de impunidade israelense e honrar a memória de Hind Rajab e de todos aqueles que pereceram no genocídio de Gaza”. O nome da ONG faz menção a uma criança palestina de cinco anos, cuja morte foi atribuída a Israel, mas nunca houve uma conclusão de investigações nesse sentido.
Além disso, a organização diz que “investe” em campanhas de conscientização para “desafiar a impunidade israelense e honrar a memória das vítimas”.
A HRF é liderada por duas figuras com histórico de apoio a milícias anti-Israel no Oriente Médio.
Uma delas é o presidente da entidade, Dyab Abou Jahjah, ex-membro do Hezbollah, grupo terrorista libanês que está em conflito com Tel Aviv, apesar dos embates terem diminuído drasticamente após o anúncio de uma trégua recentemente.
Jahjah admitiu em uma entrevista de 2003 ao The New York Times ter se filiado ao Hezbollah quando jovem.
Segundo informações do Internet Archive, organização sem fins lucrativos sediada na Califórnia, o artigo do jornal americano diz que o presidente da HRF se juntou à “resistência do Hezbollah” contra Israel e disse ter passado por “algum treinamento militar” e tinha “muito orgulho disso”.
O jornal Jerusalem Post também apontou que comunicados transmitidos à imprensa no passado indicavam que o ativista libanês estaria retornando ao país para lutar na guerra de 2006 contra Israel.
O ativista declarou que, aos 19 anos, decidiu abandonar a milícia para estudar fora do país. Na mesma época, disse ter tido um “conflito” com lideranças da organização terrorista libanesa para conseguir documentos de asilo político na Bélgica, onde está sediada a HRF. “Foi apenas um truque político para obter meus documentos”, disse ele.
Segundo o jornal israelense, o meio de comunicação Al-Akhbar, afiliado ao Hezbollah, apresentava um perfil de autor de Jahjah, mas o registro foi excluído.
O presidente da HRF também fez elogios ao antigo líder do Hezbollah Nassan Nasrallah, morto em uma operação israelense no ano passado. Ele declarou que conheceu o líder terrorista em 2001.
Em outubro do ano passado, após a eliminação do líder do Hamas Yahya Sinwar, Jahjah escreveu no X: “Você pode matar os líderes da resistência; a morte deles é um testemunho contra você. Pois a história escreverá: eles se levantaram, disseram não, mostraram o caminho. Milhões seguirão seu caminho, centenas de milhões. Seu poder desaparecerá, seu domínio acabará”.
A HRF não foi a primeira entidade criada por Jahjah. Em 2001, ele já havia fundado a Liga Árabe Europeia (AEL), organização pan-arabista cujo objetivo era “promover o nacionalismo árabe, o nasserismo e o antisionismo”, segundo o Jerusalem Post.
No domingo (5), em meio às investigações contra o soldado israelense de férias no Brasil, o Ministério de Assuntos da Diáspora Israelense e Combate ao Antissemitismo também confirmou os laços do presidente da HRF com o Hezbollah, afirmando inclusive que ele já havia liderado “viagens da milícia na Europa”.
O cofundador da ONG, Karim Hassoun, que ocupa o cargo de secretário no HRF, também é apontado como um ativista anti-Israel por suas declarações favoráveis a atos extremistas na internet.
Em uma publicação no X, Hassoun rejeitou chamar o massacre do Hamas em território israelense de “invasão”, mas, segundo ele, significava “o retorno de palestinos às suas terras de origem”.
Em 8 de outubro de 2023, um dia após o massacre realizado pelo Hamas, Hassoun escreveu no X: “Os palestinos não ‘invadiram’ #Israel… Eles estão simplesmente retornando para casa e recuperando suas propriedades… Uma nuance ‘pequena’, mas muito importante, eu diria”.
Segundo o jornal Jerusalem Post, em 2009, os dois fundadores da ONG assinaram uma petição para remover o Hamas e outros grupos palestinos da classificação de grupos terroristas.
O soldado alvo da ação da ONG, que deu início à investigação no Brasil, foi um dos sobreviventes do massacre do Hamas de 7 de outubro de 2023, no festival de música Supernova, nas proximidades da comunidade Re’im, em Israel.