A Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados rejeitou o Projeto de Lei (PL) proposto pelo deputado Bacelar (PV/BA), que visava direcionar a maconha apreendida para laboratórios autorizados, com o objetivo de utilizá-la na produção de medicamentos. A decisão foi fundamentada no parecer do deputado Osmar Terra (MDB-RS), que defendeu a inadequação da proposta, alegando razões de segurança e controle de qualidade.
Bacelar sustentou que, em vez de incinerar a planta, a destinação da cannabis apreendida para uso medicinal poderia gerar benefícios ao convertê-la em matéria-prima para medicamentos. Ele argumentou que essa medida evitaria o desperdício do material e poderia auxiliar na produção de remédios, especialmente aqueles à base de canabidiol (CBD), um dos compostos da planta com potencial terapêutico.
Vários estudos e a própria Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) já apontaram que não existem evidências científicas definitivas sobre os supostos benefícios da substância para a maioria das doenças. Há exceção nos casos citados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), como para pacientes com crises epiléticas relacionadas às síndromes de Dravet, Doose e Lennox-Gastaut.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) regulamentou o registro e venda de produtos à base de cannabis e definiu que compostos com elementos da maconha sejam marcados com “tarja preta”, pelo risco de dependência, aumento de tolerância (a necessidade de ingerir quantidades cada vez maiores para ter o mínimo efeito desejado) e intoxicação. Os produtos à base de maconha aprovados pela agência (não são considerados medicamentos por falta de evidência científicas consolidadas de eficácia) precisam ser prescritos com receita amarela (índice de THC menor de 0,2%) ou azul (índice de THC maior de 0,2%, maior risco). Esses cuidados são impossíveis de serem respeitados em extratos produzidos em casa.
Contudo, o relator Osmar Terra destacou as diferenças entre a cannabis voltada para fins terapêuticos e a variedade destinada ao uso recreativo e ilícito. Ele apontou que a cannabis para uso medicinal é cultivada com alto teor de CBD, composto com efeitos terapêuticos, enquanto a cannabis apreendida tende a apresentar maior concentração de tetrahidrocanabinol (THC), substância responsável pelos efeitos psicoativos e potencial aditivo.
”Se ambos apresentam efeitos terapêuticos, é o CDB responsável pela maioria deles, sendo o THC responsável pelos efeitos estupefacientes e pelo desenvolvimento de dependência”, explicou o deputado.
Outro ponto levantado pelo deputado Terra foi a impossibilidade de controle de qualidade sobre a cannabis apreendida. Segundo ele, a origem ilícita das plantas impede a verificação de possíveis contaminantes, representando um risco à saúde pública. Terra reforçou que, no Brasil, o uso “in natura” da planta para fins medicinais, como ocorre em alguns países, ainda não é regulamentado, o que acentua as limitações legais e sanitárias da proposta.
”Não se sabe quais e quantos contaminantes podem existir nessas plantas cultivadas e processadas por indivíduos e grupos que atuam à margem da lei e que não podem ser acionados por malefícios decorrentes do consumo de seu produto”, complementa.
A rejeição do projeto indica que o debate sobre o uso medicinal da cannabis apreendida seguirá sendo tema controverso no Congresso. Enquanto isso, permanece vigente a normativa de incineração das apreensões.