Uma nova pesquisa da Rede Nossa São Paulo aponta que 78% dos paulistanos percebem diferenças de tratamento entre negros e brancos nos shoppings e no comércio da cidade.
O levantamento, intitulado “Viver em SP: Relações Raciais”, será lançado nesta quinta (14) no Centro de Pesquisa e Formação do Sesc e aborda a percepção dos moradores da capital sobre o racismo em diversos ambientes, incluindo escolas, espaços públicos e locais de trabalho.
A comerciante Giovanna Brasil, 25, é um desses moradores que considera ter sido vítima de discriminação. Para celebrar o aniversário de sete anos de seu filho, ela foi comprar guloseimas em uma loja na zona leste de São Paulo.
Comprou quase R$ 500 em produtos e, quando estava no caixa, foi abordada pelo gerente que acusava seu filho de comer um pacote de bolachas e escondido a embalagem vazia em uma prateleira.
“Éramos a única família negra lá. O gerente branco de olhos claros. Eu perguntava e meu filho dizia ‘mamãe não peguei nada'”, afirmou à reportagem. Ela bateu o pé e exigiu as imagens de segurança. O gerente se retirou e, quando voltou, afirmou se tratar de um engano, já que não havia registros.
Ao sair da loja, Giovanna gravou um vídeo, chorando pelo constrangimento, que viralizou nas redes sociais. O caso foi registrado no 44° DP (Guaianazes) como calúnia, mas ela luta na Justiça para enquadrá-lo como racismo.
A reportagem entrou em contato com a defesa da loja, a Magic Doces, que afirmou ter sido alvo de uma acusação inverídica, “de alta gravidade, completamente contrária à política da empresa e aos seus valores pessoais.”
“Salientamos que até onde a defesa sabe, não houve nenhum andamento ao caso promovido pela suposta vítima, bem como é por nós e por nossos clientes desconhecido qualquer registro de racismo e/ou injúria racial”, diz o texto da defesa.
Além do comércio, a pesquisa aponta que 75% dos entrevistados percebem discriminação racial em escolas e faculdades.
“Isso nos surpreendeu”, diz Igor Pantoja, coordenador de relações institucionais da Rede Nossa São Paulo. “A escola é um ambiente muito múltiplo e diverso. Há um choque étnico de pessoas jovens, imaturas. Isso só nos mostra como a educação antirracista não é presente.”
Na sequência, os locais nos quais os entrevistados dizem ter mais sofrido racismo são ruas e espaços públicos (70%) e ambiente de trabalho (68%).
O levantamento foi feito com 800 moradores do município com 16 anos ou mais por meio de entrevistas presenciais e online. A maioria era da classe social C (55%), sendo o resto divido entre classes A/B (37%) e D/E (8%). A margem de erro é de três pontos percentuais para o total da amostra.
Do total de entrevistados, 86% concordaram com a afirmação de que o racismo prejudica o desenvolvimento de São Paulo. Para 82%, a violência policial afeta desproporcionalmente os negros, e 78% apoiam o aumento da representatividade negra na política e em cargos de liderança como forma de reduzir desigualdades.
Medidas contra o racismo
Os pesquisadores também perguntaram quais medidas os paulistanos consideram mais eficazes para combater o racismo. Para 54%, o aumento da punição para crimes de injúria racial é prioritário, enquanto 39% defendem penalidades mais severas para policiais envolvidos em casos de abuso contra pessoas negras.
A inclusão do tema racial no currículo escolar foi mencionada por 38% .
As empresas também são vistas como agentes importantes na luta contra o racismo. Dar suporte psicológico e jurídico aos funcionários vítimas de racismo foi a ação mais citada (38%), seguida pela promoção de campanhas de conscientização (36%).
Em relação ao papel dos brancos, quase metade dos entrevistados disse acreditar que esses cidadãos devem se informar mais sobre o racismo e sua história. Intervenção em situações de tratamento desigual e o reconhecimento dos próprios privilégios foram mencionados como atitudes importantes.