Uma equipe de cientistas descobriu o sistema estelar binário mais próximo já detectado ao redor do buraco negro supermassivo no centro da Via Láctea, o que sugere que não seja tão destrutivo quanto se pensava.
Os sistemas binários —duas estrelas que orbitam em torno de um centro de massas comum— são muito comuns e representam 50% das estrelas da Via Láctea.
Mas no centro desta galáxia, onde está o buraco negro supermassivo Sagitário A* (Sgr A*), essas estrelas podem ser contadas “nos dedos de uma mão”: só foram detectados cinco sistemas duplos até hoje, explica à AFP Emma Bordier, astrofísica da Universidade de Colônia, na Alemanha, e coautora do estudo, publicado na última terça-feira (17) na revista Nature Communications.
Essa região é considerada “uma das mais extremas” da galáxia devido à “imensa influência gravitacional do buraco negro supermassivo, que provoca órbitas estelares muito excêntricas e de grande velocidade, assim como forças de maré capazes de perturbar e destruir os potenciais sistemas binários”, acrescenta a jovem pesquisadora.
A descoberta do sistema binário mostra que buracos negros desse tamanho “não são tão destrutivos” como se pensava, resumiu o principal autor do estudo, Florian Peissker (Universidade de Colônia), em um comunicado do Observatório Europeu Austral (ESO).
Batizado de D9, o sistema duplo se encontra no “cúmulo S”, um grupo denso de estrelas e outros objetos em órbita ao redor de Sgr A*.
Durante seu itinerário, chega a se situar a apenas 0,03 parsec do buraco negro. A título de comparação, a Próxima Centauri, a estrela mais próxima do Sol, está a 1,3 parsec, ou seja, aproximadamente 40 vezes mais longe que D9 de Sgr A*.
Os dados foram obtidos graças a dois espectrógrafos do Very Large Telescope (VLT).
Michal Zajacek, coautor do estudo e pesquisador da Universidade Masaryk, na República Tcheca, e da Universidade de Colônia, assinala que o sistema D9 “mostra sinais claros da presença de gás e poeira perto das estrelas”.
Isso sugere “que poderia se tratar de um sistema estelar muito jovem, que deve ter se formado nas proximidades do buraco negro supermassivo”, acrescenta.
A equipe de pesquisadores estima que D9 tenha apenas 2,7 milhões de anos, e a força gravitacional do buraco negro provavelmente fará com que se funda com uma única estrela em um milhão de anos.
Possíveis planetas
Essa juventude o torna ainda mais singular, pois os outros cinco sistemas duplos descobertos até agora são estrelas maciças —ou inclusive muito maciças— e mais evoluídas.
Os cientistas dizem que acreditavam que as condições extremas próximas de um buraco negro impediam a formação de novas estrelas e que as que se encontravam ali se formavam em regiões mais propícias, antes de migrar para o centro da galáxia.
No entanto, as observações têm demonstrado que essa região está “paradoxalmente povoada por estrelas jovens”. A descoberta de uma jovem estrela binária “mostra mais uma vez que tudo é possível ao redor de um buraco negro supermassivo”, ressalta Bordier.
A descoberta também lança nova luz sobre os “objetos G”, os objetos mais misteriosos do cúmulo S, que se comportam como estrelas, mas parecem nuvens de gás e poeira.
A equipe sugere que poderiam ser uma combinação de estrelas de sistemas binários que ainda não se fundiram e materiais residuais de estrelas que já o fizeram.
A detecção de D9 também permite especular sobre a presença de planetas no centro galáctico, já que estes frequentemente se formam ao redor de estrelas jovens. “Parece plausível que a detecção de planetas no centro galáctico seja apenas uma questão de tempo”, segundo Peissker.