A troca de acenos públicos entre a defesa do general Walter Braga Netto e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) indica que os ex-companheiros de chapa presidencial estão unidos após a prisão do militar pela Polícia Federal por suspeita de envolvimento em uma suposta trama de golpe de Estado. Lideranças de direita e militares cogitaram um cenário em que o STF (Supremo Tribunal Federal) poderia tentar fazer Braga Netto se voltar contra Bolsonaro e eventualmente até se envolver em uma delação premiada – como fez o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, coronel Mauro Cid.
A explicação da defesa de Braga Netto para descartar qualquer hipótese de acordo de delação premiada é que ele não participou de nenhum plano de golpe. “O general Braga Netto é um democrata, não participou de nenhuma reunião golpista”, disse José Luís Oliveira Lima, o novo advogado de Braga Netto.
A hipótese de ruptura entre Braga Netto e Bolsonaro havia surgido de uma declaração do advogado do ex-presidente, Paulo Amador Bueno, no fim de novembro. Ele comentava a suposta apreensão pela Polícia Federal de um documento que estabelecia um “Gabinete Institucional de Gestão de Crise” que seria formado por Braga Netto e por outro general. Bueno usou o argumento de que no nome de Bolsonaro não estava no documento. Sua declaração levantou especulações de que a defesa de Bolsonaro tentaria distanciá-lo de seu núcleo de apoiadores militares.
Outro fato que deu origem a especulações foi a substituição nesta semana do advogado de Braga Netto por José Luís Oliveira Lima, que já defendeu o ex-ministro José Dirceu durante o processo do Mensalão. Na Lava Jato, ele foi o responsável por fechar a delação premiada do empreiteiro Léo Pinheiro, dono da construtora OAS. Oliveira Lima descartou a hipótese de colaboração premiada pelo fato de Braga Netto não ter cometido nenhum crime.
Com a prisão do general, no entanto, Bolsonaro se pronunciou sobre o caso questionando a tese de que Braga Netto estaria obstruindo a Justiça – o que foi entendido como uma sinalização de apoio a Braga Netto. O argumento da PF era que o militar estaria tentando atrapalhar as investigações ao obter informações sobre a delação do coronel Mauro Cid.
“Há mais de 10 dias, o ‘inquérito’ foi concluído pela PF, indiciando 37 pessoas e encaminhado ao MP [Ministério Público]. Como alguém, hoje, pode ser preso por obstruir investigações já concluídas?”, questionou Bolsonaro pelas redes sociais no mesmo sábado (14).
A prisão de Braga Netto foi questionada por especialistas em Direito por se basear em atos antigos, de agosto de 2023 e fevereiro de 2024. Segundo a polícia, naquela época Braga Netto teria demonstrado interesse em saber mais sobre a delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, que resolveu colaborar com as investigações para reduzir sua pena. Por causa disso, foi acusado de tentar atrapalhar as investigações.
Prisão de Braga Netto causou clima de tensão entre militares das Forças Armadas
A prisão de Braga Netto na semana passada criou um clima de alta tensão nos meios militares, principalmente entre oficiais da reserva, segundo apurou a reportagem.
Há pelo menos duas percepções sobre o caso, segundo afirmaram membros da cúpula das Forças Armadas. Uma delas é que a prisão de Braga Netto seria uma forma de revanchismo do Supremo contra o ex-vice de Bolsonaro. Ou seja, a Justiça estaria manobrando para condenar Braga Netto e sua detenção já seria uma antecipação de pena.
A outra percepção é a comparação com o caso de Mauro Cid, que teria sido pressionado com a prisão para firmar um acordo de delação premiada.
Na época em que o Cid foi preso, uma delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro era vista como algo difícil de ocorrer. No entanto, Cid virou peça fundamental nas ações do STF que investigam Bolsonaro, como o caso das joias sauditas e a suposta fraude no cartão de vacinas.
Na terça-feira (17), o ministro da Defesa, José Múcio, disse que a detenção de Braga Netto “mexe com os militares”. “Estão constrangidos [Exército]. É o primeiro general quatro estrelas que é detido, mas não foi surpresa para ninguém”, disse o ministro.
Ele também afirmou que o caso do general não representa as Forças Armadas. “Cada um entrou nisso com seu CPF e a gente tem que preservar o CNPJ das três Forças”, disse. “Ele [Braga Netto] tem muitos colegas, está preso, mas não foi surpresa para absolutamente ninguém. Estamos torcendo para que tudo isso passe”, concluiu o ministro.
Para deputado Bilynskyj, prisão não tem fundamento e ocorre para pressionar Braga Netto
Deputados da oposição divergem sobre a possibilidade de Braga Netto aderir a uma delação premiada. Para o Capitão Alden (PL-BA), não há razões para acreditar que isso aconteça. Ele afirma que não existe o que delatar. “Sabemos que todo esse ‘contorcionismo’ do sistema em tentar atingir Jair Messias Bolsonaro já chegou no limite. O que fica claro que querem de qualquer jeito prendê-lo, mesmo não existindo motivo real”, afirmou o deputado.
Já o deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP) argumenta que a prisão preventiva de Braga Netto não tem fundamento jurídico. Para ele, o método utilizado se assemelha ao que foi feito com Mauro Cid, onde a prisão preventiva é usada como meio de pressão para obter uma delação.
“Qualquer análise séria do documento de prisão do Alexandre de Moraes, da decisão, vai mostrar que não existia cabimento para prisão preventiva de Braga Netto. Então, qual que é o mecanismo que está sendo utilizado? Você prende preventivamente e segura o cara na prisão até ele delatar alguma coisa, seja interessante o que foi feito com o Mauro Cid”, afirmou o parlamentar.
Bilynskyj também acredita que a troca de advogado no caso de Braga Netto é um indicativo positivo. “Acredito que a defesa vai ser feita de forma técnica e vai mostrar que ele não tem motivo para estar preso, tecnicamente não existe, não estão presentes os requisitos da decretação da prisão preventiva”, disse. Ele aposta na soltura de Braga Netto e acredita que não haverá delação.
Visita a Braga Netto busca mostrar presença da oposição
Assim como ocorreu com os presos do 8 de janeiro, parlamentares de oposição querem visitar Braga Netto para demonstrar apoio ao militar. Até o momento, os senadores Hamilton Mourão (Republicanos-RS) e Rogério Marinho (PL-RN) tentam a autorização de Moraes para visitar o general na 1ª Divisão de Exército, na Vila Militar, no Rio de Janeiro.
Como seria inviável para Bolsonaro realizar a visita, devido às investigações, os senadores pretendem usar a prerrogativa parlamentar para verificar as condições da prisão de Braga Netto.
Como funciona a delação premiada
A delação premiada é um mecanismo legal que permite ao acusado de um crime colaborar com a Justiça em troca de benefícios na pena. No contexto político e criminal, o acusado fornece informações relevantes que possam levar à identificação de outros envolvidos ou à solução de crimes ainda em investigação.
O termo “premiada” refere-se à contrapartida oferecida ao delator. Se as informações apresentadas forem consideradas verídicas e relevantes, o acusado poderá ter sua pena reduzida, cumpri-la em regime semiaberto ou, em casos excepcionais, até mesmo receber perdão judicial.