Dentre as consequências mais sensíveis da polarização política está a retórica agressiva dos discursos. Exemplos como o de Jerônimo Rodrigues (PT-BA), governador da Bahia, que nesta semana mandou “jogar na vala” os bolsonaristas, assim como o do ex-presidente Jair Bolsonaro, que falou em “fuzilar a petralhada”, se normalizaram no cotidiano político e trazem à tona o debate sobre liberdade de expressão.
De um lado, há aqueles que creem que ambos estão acobertados por tal direito e, de outro, quem defenda um papel mais ativo do Judiciário na questão.
No programa Última Análise desta quarta-feira (07), os convidados exploraram o problema para entender se, afinal, as palavras podem ou não ser perigosas. O advogado André Marsiglia afirma que a liberdade de expressão pode ter restrições, mas que “a ideia de ofensividade é um limite ruim para a liberdade de expressão”, sendo impossível “contingenciar” a possibilidade do outro se sentir ofendido.
Analisando a fala do governador da Bahia sobre os bolsonaristas, Marsiglia a avalia como antiética, mas não passível de ser censurada. “A liberdade de expressão pode cobrir situações que são imorais ou antiéticas”, acredita.
O ex-procurador e colunista da Gazeta do Povo Deltan Dallagnol diz que a expressão “violência retórica” nada mais é do que uma arma para combater o próprio discurso. Assim, por mais que palavras possam desagradar, elas jamais “exercem força física” sobre ninguém. Ainda, lembra da importância do princípio da liberdade de expressão: “A liberdade de expressão é mais do que um direito fundamental. Ela é um pilar da democracia. Então ela goza de uma especial proteção da Constituição, inclusive acima dos outros direitos fundamentais”.
Para além das palavras em si, também é preciso perceber uma questão moral coletiva envolvida no tema. Esta é a opinião do escritor Francisco Escorsim, lembrando do contexto que envolve a existência de discursos violentos: “Há um contexto histórico, cultural e social no qual isso foi normalizado. Então o problema é outro: é o fato de que a sociedade não só aceita, como de certo modo bate palma”.
O duplo padrão de julgamento do Judiciário
De toda forma, observa-se atualmente a atuação do Poder Judiciário no cerceamento da liberdade de expressão. Porém, ele o faz de forma assimétrica, conforme o envolvido seja da direita ou da esquerda. Escorsim compara a repercussão de falas como as do atual secretário nacional do Consumidor, o petista Wadih Damous, e do deputado licenciado do PL Eduardo Bolsonaro. O primeiro disse em uma rede social em 2018, quando deputado, que o STF tinha que ser fechado, enquanto o segundo afirmou que para fechar o STF bastaria “um soldado e um cabo”.
A imparcialidade da Corte também foi colocada em xeque, sobretudo a partir da ideia de “nós contra eles”, muito disseminada entre ministros, como no famoso discurso de Luis Roberto Barroso, em que disse “nós derrotamos o bolsonarismo”.
Dallagnol explica que essa parcialidade do Judiciário é uma expressão da polarização geral: “Muitos ministros foram colocados pelo PT e têm uma visão de mundo progressista e cosmopolita, uma visão de que cabe ao Supremo empurrar a história. Isso torna justificável que eles passem por cima da Constituição e do Congresso Nacional”.
O programa Última Análise faz parte do conteúdo jornalístico ao vivo da Gazeta do Povo, no YouTube. O horário de exibição é das 19h às 20h30, de segunda a quinta-feira. A proposta é discutir de forma racional, aprofundada e respeitosa alguns dos temas desafiadores para os rumos do país.