Paris está torcendo por Belém. Dez anos depois do acordo histórico sobre mudanças climáticas, negociado na capital francesa, a prefeita Anne Hidalgo chamou a COP30 de novembro de “cúpula da esperança”.
“Belém será um grande momento internacional para o clima”, disse à Folha Hidalgo, que já ocupava o cargo na época do Acordo de Paris. “Confio na capacidade do presidente Lula e das autoridades brasileiras, que podem dar um novo impulso ao trabalho que foi feito em Paris e nas diversas COPs [conferências climáticas da ONU]”, acrescentou a prefeita, do Partido Socialista.
Os objetivos estabelecidos em 2015 estão longe de ser cumpridos, o que para a prefeita só aumenta a importância do evento na região amazônica. “Fico muito feliz que a COP dos dez anos [após a assinatura do Acordo de Paris] aconteça no Brasil. Isso tem uma força simbólica e política muito eficaz.”
Dentro de dois meses, Paris vai sediar uma conferência internacional de prefeitos para debater os dez anos do Acordo de Paris. Belém, atualmente governada por Igor Normando (MDB), está entre as cidades convidadas.
Segundo Anne Hidalgo, embora o problema das mudanças climáticas exija soluções globais, os prefeitos do mundo inteiro podem fazer bastante coisa em âmbito local. “Durante muito tempo, não se enxergou o papel dos prefeitos. Mas na COP28, em Dubai [em 2023], foi mostrado que uma parte dos resultados é consequência direta da ação dos prefeitos.”
De sua parte, Hidalgo aponta o esforço que Paris vem fazendo. A cidade possui um plano climático para chegar ao “carbono zero” até 2050 —quando se prevê que as máximas na capital francesa atingirão os 50°C.
Desde 2015, Paris vem reduzindo a circulação de automóveis e ampliando a cobertura vegetal. A prefeitura afirma ter criado 45 hectares de áreas verdes na última década. Essas medidas enfrentam críticas da oposição e de parte da imprensa local.
Em julho, trechos do rio Sena serão liberados para banhistas, pela primeira vez em um século. No ano passado, a própria prefeita fez um mergulho simbólico. Apesar de uma polêmica sobre as medições de qualidade da água, o Sena foi utilizado nas provas de triatlo e maratona aquática dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos.
Hidalgo revelou que o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) está preparando um trabalho sobre a contribuição dos municípios à luta contra as mudanças climáticas. Esse estudo, segundo ela, não ficará pronto a tempo da COP de novembro, porém.
A Folha também conversou com um dos cientistas mais renomados do IPCC, o francês Jean Jouzel. Em 1987, então com 40 anos, Jouzel foi um dos primeiros cientistas a comprovar a correlação entre a concentração de CO2 na atmosfera e o aquecimento global. Ele era vice-presidente do IPCC em 2007, quando o grupo de cientistas recebeu o Prêmio Nobel da Paz.
“Sim, o contexto é bastante difícil, mas não podemos desanimar. Pode ser difícil erguer a cabeça diante de tomadores de decisões como [Donald] Trump, mas esperamos muito da COP de Belém”, disse Jouzel.
O francês, que participou de praticamente todas as COPs desde 2015, lembra-se com nostalgia do clima de esperança em Paris, dez anos atrás. “A diferença em relação aos acordos anteriores é que perguntaram aos países o que eles aceitariam fazer. Esse conceito de engajamento fez com que todos os países [195] ratificassem o acordo. Claro, Trump saiu dele rapidamente, mas o acordo foi muito bem construído.”
Como presidente dos EUA, Donald Trump retirou seu país duas vezes do Acordo de Paris: em 2017, no início de seu primeiro mandato, e em janeiro deste ano, ao reassumir o poder, revogando decisão tomada em 2021 pelo antecessor, Joe Biden.
Jouzel afirmou que ainda não existe um esboço de acordo a ser aprovado em Belém, mas vem participando das discussões sobre o assunto. “Não sou negociador, mas várias delegações convidam experts para acompanhar. Sigo as negociações bem de perto, mas enquanto cientista da delegação francesa. É apaixonante.”