Diante do impasse sobre o financiamento público das ações de países pobres pelas nações ricas na COP29, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática em curso em Baku (Azerbaijão), o apelo ao investimento privado tornou-se um ponto crucial. Pelo menos, para o mundo desenvolvido, que resiste ao aumento de suas contribuições no patamar esperado.
Nesse contexto, tudo depende do papel dos bancos multilaterais de desenvolvimento, que comprometeram-se a aumentar seus empréstimos a países pobres a US$ 120 bilhões por ano até 2030. E, especialmente, em trazer mais US$ 65 bilhões do setor privado anualmente aos projetos dessas nações de transição verde e de mitigação dos efeitos do clima. Mas essa tarefa não será fácil.
Rob Drijkoningen, chefe da área de endividamento de mercados emergentes do Neuberger Berman, gestora de investimentos americana que detém US$ 27 bilhões em títulos soberanos e corporativos de países em desenvolvimento, seria um parceiro natural.
Mas, depois de conversar neste ano com o EIB (Banco de Investimento Europeu, na sigla em inglês) e o EBRD (Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento) sobre acertos potenciais, ele conclui haver obstáculos demais.
Conforme afirmou, os bancos de desenvolvimento não estão dispostos a abrir seus livros e partilhar informação suficiente sobre os riscos dos investimentos. Tampouco permitem aos investidores privados escolher os projetos de seus interesses.
Para as gestoras de ativos, esses obstáculos acabam com a atração de seus clientes, que já têm pouco apetite por projetos de infraestrutura de longo prazo em nações em desenvolvimento.
Com seus baixas baixos, porém, os governos ocidentais esperam um massivo aumento de investimentos do setor privado como meio de a ajuda climática aos países pobres alcançar US$ 2 trilhões ao ano.
Depois da vitória do negacionista Donald Trump na eleição presidencial dos Estados Unidos, cresceram as preocupações de que a diferença entre o que é necessário e o que será apostado no financiamento climático aumente ainda mais se Washington cair fora da briga climática mundial.
Aceleração de reformas
Uma reforma de instituições multilaterais como o Banco Mundial, ainda em andamento, já permitiu o aumento de 41% na mobilização de fundos do setor privado para países de baixa renda em 2022 por 27 bancos de fomento, de acordo com um relatório divulgado neste ano. As mudanças tiveram o objetivo de reformular os procedimentos para empréstimos, como meio de garantir melhor uso do dinheiro.
A presidente do EBRD, Odile Renaud-Basso, afirmou que a instituição está trabalhando duro para prover mais informações ao setor privado. Mas agregou haver limites sobre o que pode se tornar público.
Uma análise da Reuters sobre dados de empréstimos e entrevistas com duas dúzias de bancos de desenvolvimento, negociadores climáticos, investidores privados e organizações sem fins lucrativos mostrou que a mudança nas instituições multilaterais de fomento precisa acelerar-se significativamente. Caso contrário, o setor privado não cumprirá o papel que dele se espera.
Pressionar os bancos de desenvolvimento a acelerar suas reformas tornou-se também, para os países ricos, uma forma de esquivarem-se de discussões sobre novos aportes de capital deles nessas instituições.
Desde a reforma, o EBRD entrega US$ 3.58, em recursos privados para cada dólar que investe em sua carteira de projetos. O valor é superior aos US$ 2 de três anos atrás. O BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) também mergulhou na mudança em seus negócios, o que o permitiu quintuplicar seu capital privado mobilizado entre 2019 e 2023, para US$ 4 bilhões.
Há diversas formas de emprestadores multilaterais atraírem recursos privados. A mais comum, há seis décadas, é o parcelamento de seus próprios empréstimos e a venda dessas cotas aos investidores privados, de forma a liberar dinheiro para novas operações.
Nazmeera Moola, chefe do escritório de sustentabilidade da gestora de ativos Ninety One, disse que uma série de problemas —inclusive, os prazos e os retornos em prazos longos— reduziram a atração desses ativos.
Enquanto isso, completou Moola, vários investidores institucionais de grande porte, como os fundos de pensão e as empresas de seguro, avaliam os investimentos diretos, por meio de empréstimos corporativos ou de financiamento de projetos em mercados emergentes, como “opções assustadoras”.
Garantias
Para Harmen van Wijnen, presidente do conselho do fundo de pensões ABP, que investiu 1 bilhão de euros nas parcelas dos bancos de fomento, dar um salto para riscos desconhecidos —como o financiamento de projetos em mercados emergentes — exige garantias de credores multilaterais. Alguns bancos já as provêm, como o hedge contra possível colapso da moeda local.
Na COP29, alguns bancos sinalizaram com a proposta de uma garantia de US$ 1 bilhão, pelos EUA, para empréstimos já existentes do ADB (Banco de Desenvolvimento da Ásia, na sigla em inglês) aos governos. Dessa forma, o ADB poderia financiar mais de US$ 4,5 bilhões em projetos climáticos.
Renaud-Basso afirmou que está estudando garantias aos empréstimos soberanos como forma de liberar mais dinheiro aos investimentos climáticos, mas não deu mais detalhes.
Além das garantias, há relutância de alguns bancos de desenvolvimento em atuar como parceiro menor nos empréstimos, dadas as pressões que sofrem para fechar grandes negócios e maximizar seus próprios retornos. Isso os deixa em competição com investidores privados.
Gianpiero Nacci, diretor de negócios sustentáveis do EBRD, afirmou que o trabalho dos bancos para mudar sua cultura e estrutura é ainda um “trabalho em andamento”.
Dada a escala da mudança climática, alguns especialistas escolheram caminhar sozinhos, como Hubert Danso, executivo-chefe da Africa Investor, uma plataforma que conecta investidores privados a projetos de infraestrutura verdes no continente. “Há uma falha de mercado nos bancos multilaterais de desenvolvimento, que são incapazes de reunir o capital necessário”, afirmou.