Em setembro, a Apple lançou a novidade mais importante do ano (sinto muito, não é o fone de ouvido de US$ 3.500). É o conjunto de ferramentas de software Apple Intelligence, que traz o que a empresa descreve como inteligência artificial (IA) para seus dispositivos. Está disponível por intermédio de atualizações gratuitas para os proprietários de alguns tipos iPhone, Mac e iPad.
A proposta inicial do sistema Apple Intelligence, lançado como uma versão “beta” inacabada, inclui uma atualização ligeiramente aprimorada da assistente virtual Siri e ferramentas que resumem textos automaticamente, transcrevem gravações de áudio e removem elementos indesejados —por exemplo, uma pessoa que não deveria estar em uma foto.
Para a empresa, o lançamento marca o início de uma nova era. O Apple Intelligence é o resultado de uma reestruturação significativa da gigante de Cupertino, na Califórnia, quase dois anos depois de o chatbot ChatGPT, da OpenAI, ter impactado a indústria tecnológica.
Os executivos da Apple temiam que, sem uma tecnologia de IA semelhante, o iPhone acabasse se tornando obsoleto. Por isso, a empresa cancelou um projeto de veículo autônomo, em desenvolvimento há mais de uma década, e realocou seus engenheiros para trabalhar no Apple Intelligence.
O software chega sem muitos dos recursos mais aguardados anunciados pela Apple em junho. Embora a empresa tenha feito um acordo com a OpenAI para incluir o ChatGPT no Apple Intelligence, o chatbot não vai fazer parte da versão inicial.
A Siri também ainda não é inteligente o bastante para fazer coisas como juntar os dados de vários aplicativos e dizer se uma reunião de última hora vai fazer com que você se atrase para a peça do seu filho. A Apple afirmou que essas e outras ferramentas serão incorporadas gradualmente no decorrer do ano que vem.
Há algumas semanas, testei uma versão preliminar do Apple Intelligence para ter uma prévia. Não foi muito fácil encontrar as novas funções, uma vez que estão integradas em diferentes partes do sistema de software da Apple, incluindo botões para editar textos e fotos.
Alguns recursos, como as ferramentas para correção de texto e transcrição de áudio, me pareceram bastante úteis. Outros, como o gerador de resumos de matérias da web e um botão para remover elementos indesejados das fotos, são tão inconsistentes que deveriam ser ignorados.
Isso tudo indica que vale a pena acompanhar de perto esse sistema da Apple nos próximos anos para verificar se ele se tornará um produto indispensável, mas ainda não há um motivo convincente para gastar muito dinheiro em um aparelho novo.
O Apple Intelligence funciona no iPhone 16, o mais recente; no iPhone 15 Pro, do ano passado; e em alguns iPads e Macs lançados nos últimos quatro anos. Aqui estão as ferramentas que serão mais úteis e aquelas que você pode deixar de lado deste software.
O QUE É BOM
- Transcrição de gravações de áudio
O Apple Intelligence oferece uma função que parecia estar em falta havia muito tempo: quando você grava um áudio com o aplicativo de notas de voz, este produz automaticamente uma transcrição simultânea do arquivo.
Como jornalista, que regularmente grava entrevistas, eu quis testar a ferramenta e fiquei satisfeito com o fato de ter funcionado bem. Testei em uma reunião em uma empresa de tecnologia, apertei o botão de gravação no aplicativo e, quando finalizei, a transcrição já estava pronta.
O Apple Intelligence detectava sempre que uma pessoa diferente falava e criava um novo parágrafo na transcrição. Algumas palavras eram redigidas incorretamente quando alguém falava baixo. Mas, de modo geral, a transcrição facilitou a busca por uma palavra-chave para extrair uma parte da conversa.
- Peça ajuda à Siri com um produto da Apple
Por mais que seja fácil usar qualquer smartphone ou tablet, o software da Apple tem se tornado cada vez mais complexo com o passar dos anos, de modo que às vezes é complicado saber como aproveitar os recursos que são difíceis de encontrar. O Apple Intelligence deu à Siri a capacidade de oferecer ajuda para navegar pelos produtos da Apple.
Nunca me lembro, por exemplo, como executar dois aplicativos lado a lado no iPad. Perguntei à Siri: “Como uso a tela dividida no iPad?” Prontamente, ela me passou uma lista de instruções, que incluía tocar um botão na parte superior de um aplicativo.
Ironicamente, a Siri não foi capaz de me orientar sobre como usar o Apple Intelligence para reescrever um email. Em vez disso, carregou uma lista de resultados de uma pesquisa no Google que apontava outros sites com as etapas que devem ser seguidas.
Falando em emails, o Apple Intelligence inclui ferramentas de escrita para editar as palavras e pode até gerar respostas automáticas. Usei o recurso para me livrar rapidamente de um vendedor de uma concessionária de automóveis: “Agradeço o contato. No momento, não tenho mais interesse em comprar um veículo.”
Quanto à edição de texto, selecionei um email que escrevi rapidamente para um colega e apertei o botão “Corrigir”. O Apple Intelligence editou o texto imediatamente, inserindo a pontuação que eu havia esquecido.
O QUE PODE SER IGNORADO
- Remoção de elementos da foto
Uma das funções mais aguardadas do Apple Intelligence é a possibilidade de editar automaticamente uma foto para remover um elemento, como uma pessoa indesejada em um retrato familiar que, sem ela, ficaria perfeito. Muita gente vai querer testar a ferramenta, chamada Clean Up, mas é melhor você se preparar para uma decepção.
Para testá-la, abri uma foto que tirei de familiares há alguns anos em um casamento ao ar livre. Apertei o botão “Clean Up” na esperança de excluir as pessoas sentadas em cadeiras de jardim ao fundo. Isso deu certo, mas elas foram substituídas por uma mistura indistinguível de pixels em preto e branco.
Tentei mais uma vez com uma foto de Max, meu cachorro da raça corgi, dormindo no sofá ao lado de uma manta. O Apple Intelligence removeu a manta e tentou reproduzir a almofada do sofá. Em vez disso, gerou um buraco profundo e desinteressante.
A Apple parece pensar que a internet está saturada de palavras. Um dos recursos mais destacados do Apple Intelligence é sua capacidade de gerar resumos de texto em muitos aplicativos, incluindo emails, matérias da web e documentos.
Ao apertar o botão “Resumir” no navegador Safari, recebi um resumo de três frases de uma matéria de 1.200 palavras do The New York Times que abordava os prós e os contras de comer atum. O Apple Intelligence resumiu a premissa da matéria assim: o atum é um alimento nutritivo que pode conter níveis altos de mercúrio, e os consumidores deveriam considerar espécies de atum com níveis mais baixos desse elemento químico.
Infelizmente, o Apple Intelligence recomendou no resumo que as pessoas consumissem atum branco, uma das espécies listadas na matéria por seu nível alto de mercúrio. Isso é o que a indústria tecnológica chama de alucinação, problema comum em que a IA inventa informações quando não é capaz de fornecer a resposta correta.
A ferramenta também não foi eficaz ao resumir minhas anotações. Recentemente, para preparar uma reunião no escritório com três colegas, fiz anotações a respeito deles. Em vez de elaborar um relatório conciso referente a cada pessoa, o recurso gerou um resumo do papel de apenas uma delas.
A Apple não respondeu à solicitação de comentário.
Em resumo, você pode dispensar essa ferramenta.