A Advocacia-Geral da União (AGU) não tem competência para adotar medidas judiciais contra a Meta. De acordo com os juristas ouvidos pela Gazeta do Povo, a big tech –responsável pelo Facebook e Instagram – não era sequer obrigada a responder os questionamentos feitos pelo órgão, mas enviou seu posicionamento nesta segunda-feira (13). A atuação da AGU ocorreu após a empresa anunciar a desativação da ferramenta de checagem de fatos e substituí-la por notas da comunidade, como funciona no X.
Após receber as informações fornecidas pela Meta, a AGU declarou que as alterações promovidas pela plataforma “causam grave preocupação”. O órgão também informou a realização de uma audiência pública com outros órgãos e ministérios, ainda com data a ser definida. Na ocasião, serão discutidos os efeitos da nova política implementada pela Meta.
“Dentro de um escopo de Estado de Direito, eu não enxergo que tipo de ação caberia a AGU contra a Meta”, aponta a consultora jurídica Katia Magalhães. Ela ainda acrescenta que a AGU deve defender os interesses da União, o que é diferente de defender os interesses do governo federal. “Está havendo uma deturpação à AGU, deixando de ser uma instituição que tem esse papel de representar a União, para ser uma representante dos interesses pessoais de quem está ocupando o governo. Uma atuação de uma empresa privada não afeta os interesses jurídicos da União.”
AGU perde foco institucional e assume postura de defesa do governo
A União Federal é uma pessoa jurídica que deve atuar em defesa dos interesses do país, não do governo federal. A Advocacia-Geral da União não é vinculada a nenhum dos três Poderes, justamente porque representa todos eles. No entanto, o advogado-geral da União é escolhido pelo presidente da República, possui status de ministro e tem como competência assessorar o chefe do Executivo na proteção do Estado brasileiro. O órgão também é a responsável por representar a União diante do Supremo Tribunal Federal (STF).
Com o envolvimento da Corte em temas ideológicos, a atuação da AGU também tem se alinhado frequentemente a essas pautas. Andre Marsiglia, advogado e especialista em liberdade de expressão, destaca que a AGU tem sido há bastante tempo um braço jurídico do governo petista. “O órgão é de Estado, não de governo, e de apoio, não de combate judicial ativo. A AGU perdeu completamente sua identidade institucional nesse governo”, explica.
As agências de checagem têm o poder de classificar o conteúdo de notícias selecionadas por eles. A ideia é que essas etiquetas de classificação alertem o usuário e reduza o alcance das postagens marcadas. Esse sistema será substituído pela Meta por Notas da Comunidade, criada pelo X. A diferença é que os próprios usuários poderão adicionar o contexto ou desmentir informações falsas de forma colaborativa, o que faz com que o modelo seja descentralizado e valorize a diversidade de perspectivas.
Meta não comete crimes ao alterar sua polícia gerencial
Para Marsiglia as interferências indevidas da AGU afetam indevidamente a liberdade empresarial. “Essa atuação interfere também no equilíbrio entre os poderes, pois atropela o Ministério Público Federal (MPF), único legitimado a questionar a Meta sobre a condução de sua relação com o consumidor ou usuário”, explica. Uma ação do MPF seria cabível se as mudanças implementadas prejudicassem os direitos dos usuários, a proteção do consumidor ou o direito à informação.
Entre as atribuições do Ministério Público Federal está a de fiscalizar a aplicação das leis no país. No entanto, para Magalhães, também não há, até o momento, matéria para atuação do MPF, já que a Meta não infringiu nenhuma legislação. “O Direito Empresarial no Brasil permite que as empresas possam adotar qualquer política gerencial ou alterar a formação de gestão da forma que considerarem melhor. Se houver alguma prática ilícita no futuro, o MPF poderá tomar as providências cabíveis”, conclui.
Os crimes contra a honra, como calúnia, injúria e difamação, que podem ser cometidos nas redes sociais, são casos em que é possível mover uma ação penal privada. Nesses casos, qualquer pessoa que se sentir ofendida pode ingressar com uma ação penal diretamente na Justiça. Esse tipo de situação, entretanto, também não está relacionado às funções do MPF.
Ainda de acordo com Marsiglia, a Meta não tinha qualquer obrigação jurídica de responder aos questionamentos levantados pela AGU. “A resposta é um sinal de boa-fé. Não tinha obrigação jurídica, mas respondeu. Isso mostra que a Meta não quer provocar o Estado brasileiro, fazendo política com a ocorrência. Resta saber se o Estado brasileiro possui a mesma intenção”, finaliza.