O Aristocrata Clube ainda resiste. Já não tem o esplendor do passado, quando circulavam por seus salões atletas e artistas estrangeiros como o pugilista Muhammad Ali e o cantor Ray Charles, mas continua sendo um espaço de resistência e autoafirmação racial.
O mais antigo clube de negros da cidade, criado em 1961, funciona hoje num amplo sobrado no Planalto Paulista e mantém uma programação cultural constante. No mês da Consciência Negra, no dia 24, apoiará o espetáculo “Tributo a Tim Maia”. Uma vez por mês, promove um encontro tradicional chamado Baile dos 30.
Também realiza eventos como a oficina de passistas e conversas periódicas sobre temas como a saúde mental para mulheres. “Sobrevivemos com nossas festas e com a locação do espaço”, diz a presidente, Martha Braga, funcionária aposentada do Tribunal de Justiça, que está no cargo desde 2019.
Até hoje os clubes da elite paulistana têm raríssimos sócios negros. Mas houve um tempo em que não havia nenhum. Não só nas agremiações mais elitizadas, como também nas mais populares. Negros só entravam nesse lugares como atletas ou como funcionários, pela porta do fundos.
Diante desse quadro racista foi criado o Aristocrata, que serviu para acolher justamente essa população que era alvo da discriminação. “O nome do lugar foi uma espécie de provocação”, lembra Martha.
A agremiação reunia pessoas negras de classe média – artistas, advogados, esportistas, empresários e políticos – e fincou sua sede na rua Álvaro de Carvalho, 118, no vale do Anhangabaú, onde os sócios iam conversar, dançar e ouvir música. Também era palco de shows e festas de debutantes.
O Aristocrata, que tinha entre seus sócios ilustres o cantor Agostinho dos Santos e o futebolista José Carlos Bauer, cresceu e virou uma referência da cultura negra na cidade. Além de Ali e Charles, outros visitantes estrangeiros como Josephine Baker e Sarah Vaughan cruzaram o seu salão. Astros brasileiros como Jorge Ben Jor, Milton Nascimento, Wilson Simonal e Elizeth Cardoso se apresentaram no clube.
O lugar se fortaleceu e em 1969 adquiriu com o dinheiro da mensalidade de seus associados uma sede campestre no bairro do Grajaú. Chegou a ter 4 mil sócios, uma esplêndida piscina olímpica e quadras para todos os esportes num espaço de 60 mil metros quadrados.
Era um tempo em que lideranças políticas pertenciam ao seu quadro social. Foi o caso da advogada Theodosina Ribeiro, primeira vereadora negra eleita na cidade. Ela teve dois mandatos na Câmara Municipal e depois se elegeu deputada estadual.
Outro exemplo é o de Adalberto Camargo, que cumpriu quatro mandatos de deputado federal. Foi o primeiro deputado negro eleito por São Paulo.
Em 1994 houve uma grande ocupação de sem-teto no terreno da sede campestre e não foi possível retomá-lo. O clube já não era o mesmo, vinha perdendo muitos sócios e carecia de recursos para manter uma grande estrutura. Depois veio a perda da sede do vale do Anhangabaú, em 2008.
O Aristocrata ficou cerca de 8 anos sem endereço, até receber uma indenização da Prefeitura pela ocupação do terreno no Grajaú. Com o dinheiro conseguiu comprar a casa na rua Piassanguaba, onde hoje funciona. Tem 150 sócios. E, apesar de todos os percalços, continua sendo um espaço de resistência e mantém sua dignidade.
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