O caminho parece pavimentado para uma nova era de grande rivalidade no tênis. O italiano Jannik Sinner, 23, e o espanhol Carlos Alcaraz, 21, já dominam o circuito masculino –cada um levou dois dos quatro títulos de 2024 na série Grand Slam, que reúne os principais torneios–, com um nível claramente superior ao da concorrência.
Eles são os principais herdeiros do grupo chamado de “Big 3”, que mandou no esporte por duas décadas com o suíço Roger Federer, o espanhol Rafael Nadal e o sérvio Novak Djokovic. Federer e Nadal já curtem suas aposentadorias, mas Djokovic, aos 37 anos, diz ainda ter lenha para queimar e promete incomodar a dupla.
Mesmo neste ano, o primeiro desde 2002 sem nenhum troféu de Grand Slam entregue a um membro da velha trinca, Novak triunfou no campeonato que estabeleceu como prioridade. Após 24 vitórias em Slams, algo que nenhum outro homem conseguiu, enfim recebeu a medalha de ouro olímpica: na final, no complexo de Roland Garros, ganhou grande jogo contra Alcaraz.
“Sinto que ainda posso jogar no mais alto nível. O Sinner e o Alcaraz se consolidaram como os dois melhores do mundo, para não mencionar o [alemão Alexander] Zverev. Eles serão os principais candidatos a ganhar os Slams e outros torneios, mas, física e mentalmente, estou pronto para jogar meu tênis e desafiar esses caras. Minha experiência pode vir a calhar”, afirmou.
Repare que a lógica anterior foi invertida. É Djokovic quem se sente o desafiante. A questão é se os novos donos do circuito terão a longevidade e a dominância dos anteriores –em 2023, quando o sérvio levou o Aberto dos Estados Unidos, o “Big 3” estabeleceu uma sequência de 66 títulos em 79 possíveis em Grand Slams.
“Vencer os primeiros dois Slams e tornar-se número um é uma coisa. Manter esse nível por anos é outra”, advertiu Djokovic, questionado sobre um conselho a dar a Sinner. “Mas parece que ele está se saindo bem sem meus conselhos”, divertiu-se.
Está mesmo. Após triunfar no Aberto dos Estados Unidos neste ano, o italiano, líder do ranking, tornou-se o primeiro homem a obter seus dois primeiros títulos de Grand Slam na mesma temporada desde o argentino Guillermo Villas, em 1977.
O currículo de Alcaraz é ainda mais impressionante. Atual número três do mundo (nem o número dois, Zverev, acha que o ranking condiz com a realidade), ele já conta com quatro Slams aos 21 anos. O recordista Djokovic, para comparação, chegou a seu quarto aos 24.
O mundo do tênis está pronto para anos de Alcaraz x Sinner. Eles sabem disso e já se habituaram a falar um do outro como faziam Federer e Nadal.
“Ele me leva a ser melhor. Eu me levanto pela manhã pensando em maneiras de derrotá-lo”, disse Sinner, de personalidade mais Federer do que Nadal, por sua vez mais parecido com o compatriota Alcaraz. “Na quadra, somos diferentes. Ele traz o poder de fogo, envolve a multidão. É como fogo e gelo.”
“Vamos ver como serão os próximos anos”, respondeu Alcaraz. “Espero que ele esteja no circuito por muito tempo porque ele me pressiona a ser um jogador melhor a cada dia. Ele me empurra a treinar 100% para batê-lo. É ótimo. Espero que a gente tenha rivalidade que teve o Big 3.”
O que diferencia a dupla de boa parte da concorrência é a capacidade de ser agressivo com poucos erros. Os adversários procuram responder no mesmo estilo, porém geralmente têm menos constância e precisão nas trocas de bola.
“Não é a natureza do meu jogo. Eu hesito um pouco quando tento ser agressivo. Mas estou tentando”, disse o norueguês Casper Ruud, de 25 anos, número seis do mundo, em raciocínio semelhante ao apresentado por Alexander Zverev, de 27.
“Quando eles pegam uma bola mais fácil, quando estão em uma posição de ataque, em 90% das vezes o ponto acabou, seja com uma winner ou um erro não forçado. É esse o tanto que eles são agressivos, é essa a força que põem na raquete. Nesse aspecto, posso melhorar. É o que estou tentando fazer”, afirmou o alemão.
Os desafiantes, jovens ou nem tanto, estão a postos. Mas o que também pode ser uma pedra no caminho da rivalidade Sinner-Alcaraz é o caso de doping do italiano. Em março deste ano, exame realizado no Masters 1.000 de Indian Wells apontou a presença da substância proibida clostebol no organismo do atleta.
Ele convenceu a Itia (Agência Internacional de Integridade do Tênis) de que a pequena quantidade detectada foi fruto de uma contaminação acidental e foi absolvido. Um fisioterapeuta –posteriormente demitido– teria usado um spray com o agente anabólico na própria pele antes de tocar feridas de Sinner.
A Wada (Agência Mundial Antidoping) recorreu da decisão e levou o caso à CAS (Corte Arbitral do Esporte). Para Olivier Niggli, diretor da agência, “existe uma responsabilidade do atleta em relação a quem está a seu redor”. Novas audiências sobre o tema estão previstas para o início de 2025.