Eram 11h de domingo quando nos sentamos em família para um brunch num restaurante perto de casa. À mesa, quatro adultos e duas crianças, meus filhos, de cinco e dois anos.
O restaurante era grande e, àquela hora, ainda não estava lotado como costuma ficar lá pelo meio-dia, quando os jovens acordam de suas ressacas com sede de café orgânico com leite de aveia e torradas de fermentação natural com abacate e ovo poché. Havia, portanto, uma distância segura de pelo menos duas mesas entre nós e nossos vizinhos madrugadores de brunch mais próximos.
Mesmo assim, antevendo possíveis irritações diante de um programa tão imóvel logo no início do dia (quando a energia acumulada nas 10 horas de sono ainda não foi gasta), saquei imediatamente meu arsenal de livros de colorir e pedi a comida deles primeiro para aquietar os estômagos antes que se irritassem e resolvessem comandar o cérebro que, por enquanto, se ocupava com as já mencionadas distrações.
Comemos, rimos, conversamos. Os dois participavam vez ou outra, se metendo na conversa, ou interrompendo o assunto para pedir mais suco ou reclamar do garfo que havia ido ao chão.
Ao final da refeição, nossa paz foi de súbito interrompida por uma barulheira vinda do lado esquerdo do restaurante. Nossos olhos curiosos procuraram a origem da balbúrdia e encontraram um grupo a quatro mesas de distância. Formado por três moças e quatro rapazes, todos na faixa dos 30 anos, o grupo falava alto, ria alto, e zombava alto da garçonete.
“Pessoal mal-educado”, comentamos entre nós. Ao levantar para ir embora, passamos pelo grupo lhes oferecendo olhares de reprovação.
Não era a primeira, nem a centésima vez, que eu presenciava adultos se comportando mal. Adulto se comportando mal, aliás, é o que mais tem. No som alto na madrugada, na furada de fila no banheiro da balada, no destratar do atendente da companhia aérea, na prepotência com o porteiro, no buzinar desnecessário, na cantada de mau gosto, no “você sabe com quem está falando?”.
Mas engraçado que nas muitas situações cotidianas que nos deparamos com adultos mal-educados, não vejo ninguém rotulando toda a categoria “adultos” de “monstrinhos”.
A verdade é que tem gente mal-educada de todas as idades, mas nada como um menino de quatro anos chorando num avião (e uma mãe que, ao contrário do que o tribunal da internet correu para concluir, respeitou a decisão da passageira que não quis trocar de assento) para fazer sair da toca todo o desprezo que sentimos por crianças e, claro, mães.
“Restaurante não é lugar de criança! Museu não é lugar de criança! Avião não é lugar de criança!”, eles bradam de boca cheia.
Me choca a naturalidade com que essas pessoas se sentem livres para destilar seu ódio contra um grupo específico de seres humanos, como se estivéssemos falando de animais (que, aliás, são alvo de bem menos maldizer). E se isso não te choca sugiro o simples exercício de voltar nas frases acima e substituir “criança” por qualquer outra minoria. Pois é, o nome disso é preconceito.
Falta a esse povo —além de noção— lembrar que adultos que sabem se comportar em público um dia foram crianças que tiveram a oportunidade de ocupar espaços públicos.
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