Mais de um bilhão de xícaras de café são consumidas diariamente: prensa francesa, espresso, cold brew, o que for necessário.
Arnold Mathijssen, um físico da Universidade da Pensilvânia, tem preferência pelo café coado, que envolve despejar manualmente água quente sobre grãos moídos e filtrá-la para um recipiente ou caneca abaixo. Certamente, ele pensou, aplicar os princípios da dinâmica dos fluidos ao processo poderia torná-lo ainda melhor.
Com dois estudantes com ideias semelhantes, Mathijssen começou a estudar como otimizar o despejo do coado. O conselho baseado na ciência: despeje de uma altura elevada, lentamente e com um fluxo constante de água. Isso garante a maior extração com o mínimo de grãos, realçando o sabor do café sem adicionar mais grãos ou custo.
As descobertas, publicadas este mês na revista Physics of Fluids, destacam como processos que se desenrolam na cozinha —desde a preparação de foie gras até a elaboração de um prato de cacio e pepe— podem inspirar novas direções científicas. Por sua vez, a ciência pode aprimorar a arte da culinária.
“A ciência da cozinha começa com uma barreira de entrada relativamente baixa”, disse Mathijssen. “Mas é mais do que apenas algo bonitinho. Às vezes, coisas fundamentais podem surgir disso.”
Mathijssen estuda principalmente a física dos fluxos biológicos, como a maneira como as bactérias nadam contra a corrente nos vasos sanguíneos. Mas quando perdeu acesso ao seu laboratório durante o isolamento da Covid-19, ele começou a brincar com sua comida —literalmente. Ele agitou garrafas de uísque, testou a aderência do macarrão e deslizou moedas por rampas feitas de chantilly e mel. O interesse culminou em uma revisão de 77 páginas, estruturada como um menu, sobre a física envolvida no preparo de uma refeição.
“Perdi o controle”, disse Mathijssen. “Você simplesmente percebe que a ciência está em toda parte.”
Mathijssen desde então retornou ao laboratório, mas a paixão pela física da cozinha permaneceu. O estudo do café foi parcialmente inspirado por um cientista de seu grupo que mantinha anotações detalhadas sobre os cafés coados preparados no laboratório todos os dias. As anotações incluíam informações sobre a origem dos grãos, o tempo de extração e o perfil de sabor da bebida.
Ernest Park, um estudante de pós-graduação no laboratório, projetou um experimento formal. Usando contas de gel de sílica em um cone de vidro, os cientistas simularam a ação da água sendo despejada sobre grãos de café de diferentes alturas, registrando a dinâmica do sistema com uma câmera de alta velocidade.
Em seguida, prepararam cafés reais, despejando água de uma chaleira de bico fino, em várias alturas. O líquido resultante foi deixado para evaporar em um forno até que restassem apenas as partículas de café extraídas dos grãos.
Eles descobriram que mais partículas de café permaneciam quando despejavam lentamente, o que aumentava o tempo de contato da água com os grãos. Segurar a chaleira mais alto ajudava na mistura, impedindo que a água escorresse pelas laterais, entre os grãos e o filtro.
Esse tipo de fluxo causou o que os pesquisadores descreveram como um efeito de avalanche. A água erodia o centro da pilha de grãos de café, suspendendo alguns dos grãos, que se depositavam e se acumulavam nas laterais. Eventualmente, as laterais desmoronavam para dentro e o processo começava novamente. Isso aumentava o sabor extraído dos grãos de café, mas apenas enquanto a água pudesse fluir continuamente.
“O jato de água que sai deve parecer uma coluna suave até o final”, disse Margot Young, uma estudante de pós-graduação —e ex-barista— envolvida no estudo. “Se você vê que ele começa a se quebrar, ou pode ver gotas, então você precisa despejar de uma altura menor.”
Os cientistas realizaram testes de sabor, embora estes não tenham sido incluídos na publicação final. “Em termos de sabor, é muito subjetivo”, disse Park. “Então, sempre sugerimos que você mesmo experimente.”
Park observou que o estudo examinou apenas a água despejada no centro dos grãos de café, embora experimentos futuros possam explorar outras técnicas, como fazer redemoinhos ou espirais.
Fenômenos científicos observados na cozinha geralmente têm análogos fora de suas paredes. A dinâmica entre um jato de água quente e um leito de grãos de café, por exemplo, é semelhante à erosão do solo que pode ocorrer ao redor de cachoeiras e barragens. Uma panela de sopa mexida assume a mesma forma que os espelhos líquidos de alguns telescópios. Observações de bolhas de sabão por Agnes Pockels, uma dona de casa alemã do século 19, deram origem ao campo da ciência de superfície e lançaram as bases para a nanotecnologia.
Em 2022, Mathijssen ajudou a reunir uma série de estudos, produzidos por cientistas de todo o mundo, em uma coleção chamada “Kitchen Flows” (algo como “os fluxos da cozinha”). Ele agora está ajudando a compilar uma segunda coleção, que até agora consiste em mais de 30 estudos, incluindo insights sobre o comportamento de uma gema de ovo, o chacoalhar de uma garrafa de cerveja e a maneira mais eficiente de ferver macarrão.
Mathijssen também planeja continuar explorando os muitos caminhos para o café perfeito, como a física por trás da formação das camadas de leite e espresso em um latte. “Quero fazer mais trabalhos nessa direção”, disse ele. “E depois talvez também algo sobre cold brews.”