Nesta semana, assisti a uma entrevista do novo diretor técnico de futebol do Flamengo, José Boto, dizendo que quer ser o “diretor português que vai acabar com a hegemonia dos treinadores portugueses no Brasil”. A declaração foi em tom amistoso –Boto até mencionou que alguns deles são seus amigos– e uma maneira de valorizar o técnico rubro-negro, Filipe Luís. Aqui na Inglaterra, a discussão sobre técnicos estrangeiros está mais quente do que nunca, de uma forma um pouco diferente.
O foco do debate por aqui é por que há tão poucos treinadores ingleses em posições de destaque. Na primeira divisão, o número vem despencando desde a formação da Premier League, em 1992. Nas décadas de 1970 e 1980, por volta de 90% dos times eram treinados por ingleses. Hoje, são apenas dois entre 20 clubes – Eddie Howe, no Newcastle, e Graham Potter, que assumiu recentemente o West Ham.
Os outros são de Espanha (Manchester City, Arsenal, Aston Villa, Bournemouth), Portugal (Manchester United, Nottingham Forest, Fulham, Wolves), Holanda (Liverpool e Leicester), Austrália (Tottenham), Itália (Chelsea), Alemanha (Brighton), Croácia (Southampton), Áustria (Crystal Palace) e Dinamarca (Brentford).
Sean Dyche, inglês, foi demitido do Everton nesta semana e deve ser substituído por um escocês. E, tecnicamente, Kieran McKenna, à frente do Ipswich Town, nasceu na Inglaterra, mas foi criado na Irlanda do Norte e jogou por aquele país na base. Nunca um treinador inglês foi campeão da Premier League (lembrando que Sir Alex Ferguson é escocês).
Quase não há técnicos nascidos na Inglaterra no comando de equipes europeias importantes. E houve um choque por aqui quando o alemão Thomas Tuchel foi anunciado como novo treinador da seleção inglesa, dada a rivalidade histórica entre os dois países. Houve um sentimento de frustração de que não havia um inglês capaz de ocupar o posto.
Por que um país rico, que inventou o futebol e tem infraestrutura esportiva, não produz grandes técnicos? Explicações vão desde o alto custo dos cursos ao modelo de formação de treinadores da Federação Inglesa de Futebol, quando comparado aos de outros países europeus como Alemanha e Espanha.
Quem defende que é preciso dar mais chances aos ingleses talvez diga que o fato de a Premier League ser tão global acaba diminuindo as oportunidades de trabalho de quem nasceu na Inglaterra –argumento similar ao de quem fala que os jogadores estrangeiros que atuam na liga tiram a vaga dos ingleses, e isso acaba prejudicando a seleção. Tenho algumas restrições com relação a esse discurso, pois é justamente a diversidade que faz o campeonato ser competitivo e de altíssimo nível, e, jogando entre os melhores do mundo, os atletas ingleses sobem de nível também.
Tuchel é o terceiro treinador estrangeiro da seleção masculina de futebol, depois do sueco Sven-Goran Eriksson (2001-2006) e do italiano Fabio Capello (2007-2012). Ao ser contratado, foi claro: o objetivo é ganhar a Copa do Mundo em 2026. Qualquer outro resultado será um fracasso.
Discussões sobre técnicos estrangeiros existem na Inglaterra há décadas e vão continuar. Continuo acreditando que, se o treinador do seu time ou da sua seleção conquista títulos, de qual país ele vem é o que menos importa.
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