Em junho deste ano, o Ministério da Cultura da Itália anunciou a escavação de uma nova sala, ainda não aberta ao público, nas ruínas de Pompeia. Semanas depois, um grupo de arqueólogos se reuniu para admirá-la: paredes cobertas com tinta azul brilhante e afrescos detalhados de imagens agrícolas bem preservados após quase 2.000 anos.
O químico Admir Masic, do MIT, ficou mais interessado no que parecia, para um leigo, como um monte de areia comum na beira da sala. Segundo ele, o material, de cor bege e granulado, era um componente essencial no Império Romano: o precursor do concreto foi fundamental na infraestrutura romana, incluindo os aquedutos que levavam água fresca para cidades como Pompeia.
“Eles conseguiram levar água para a cidade, e com a água veio a higiene”, disse Masic. “Esse avanço tecnológico permitiu que, em primeiro lugar, construíssem Roma como é, mas também replicassem isso aonde fossem.”
O concreto moderno, baseado em um material conhecido como cimento Portland, foi desenvolvido na Inglaterra no século 19 e é, de longe, o material de construção mais popular do mundo. É barato, resistente e padronizado. No entanto, é muito menos resiliente do que o concreto usado na época romana; ao longo de décadas, ele desenvolve rachaduras que, ao permitir a entrada de água, podem destruir o material.
Além disso, a fabricação de concreto é um dos principais impulsionadores das mudanças climáticas, produzindo 8% das emissões de dióxido de carbono em todo o mundo. Ao aprenderem os segredos do concreto romano, pesquisadores como Masic estão tentando desenvolver versões modernas mais verdes e duráveis.
“Os concretos marinhos romanos sobreviveram em um dos ambientes mais agressivos da Terra sem nenhuma manutenção”, afirmou a geóloga Marie Jackson, da Universidade de Utah.
Substância ‘autocicatrizante’
O concreto romano obtém grande parte de sua resistência de uma mistura de silicatos de aluminato de cálcio hidratados, com diferentes fórmulas químicas. Mas exatamente como os romanos produziam esse material não está claro.
A crença tradicional é que aqueciam calcário, composto sobretudo de carbonato de cálcio, para produzir um material perigosamente reativo chamado cal viva, ou óxido de cálcio. Em seguida, adicionavam água, formando hidróxido de cálcio, ou cal extinta. Por fim, combinavam isso com um material volumoso, frequentemente cinza vulcânica, que fornecia o alumínio e o silício necessários para o concreto.
Para Masic, há um problema nessa explicação. Muitos exemplos de concreto romano, de acordo com ele, contêm pedaços brancos visíveis, ou clastos. “Você os vê em toda parte… em Roma, na África, em Israel.”
Esses pedaços são geralmente considerados produtos não intencionais de má qualidade de trabalho. Mas o químico avalia que os engenheiros romanos eram muito inteligentes para consistentemente produzir concreto cheio de erros.
“As pessoas diziam que os clastos de cal são resultado de uma má mistura de cal extinta”, afirmou ele. “Nossa hipótese é que não faz parte de um processamento ruim; faz parte da tecnologia.”
De acordo com a pesquisa de Masic, esses fragmentos de cal eram na verdade reservatórios de cálcio que ajudavam a preencher rachaduras, tornando o concreto “autocicatrizante”. Conforme as rachaduras se formavam, a água penetrava e dissolvia o cálcio na cal, que então se transformava em carbonato de cálcio sólido, criando uma rocha que preenchia a rachadura.
Masic disse que os fragmentos de cal não vieram da cal extinta, mas da cal virgem que os romanos adicionavam diretamente, em um processo chamado de mistura quente. Como a cal virgem é muito reativa, ela gera calor quando combinado com cinzas vulcânicas, aquecendo o material a mais de 77ºC, levando o concreto a endurecer muito mais rápido. A técnica também gerava alguns pontos quentes, fazendo com que parte da cal virgem permanecesse em pequenos pedaços intactos –os fragmentos vistos no concreto romano hoje que proporcionam suas propriedades autocicatrizantes, segundo Masic.
É difícil provar, porém, que os romanos deixaram intencionalmente pedaços de cal virgem em seu concreto, porque os pedaços mudaram quimicamente ao longo dos séculos. Ao examinar os fragmentos com microscópios especiais, Masic disse que ele e seus colegas constataram que os fragmentos de fato começaram como cal virgem.
Reações vulcânicas
Nem todos os pesquisadores estão convencidos de que a mistura quente foi a chave para o concreto “autocicatrizante” dos romanos.
Jackson argumenta que o segredo estava nos materiais volumosos que eram misturados com cal, frequentemente um tipo de cinza vulcânica chamada pozolana. Batizada em homenagem a Pozzuoli, no litoral da Itália, de onde era escavada, a pozolana ativava reações químicas especiais que conferiam ao concreto romano sua durabilidade incomparável, de acordo com a pesquisa da geóloga.
A reação inicial da cal e da pozolana gerava os compostos que atuavam como a cola no concreto antigo romano. E os materiais continuavam reagindo, formando minerais raros como a estratlingita por muitos anos após o concreto ser feito, de acordo com Jackson.
Os cristais de estratlingita, em forma de flocos e agulhas, ajudaram a unir pedaços ásperos de material no concreto e bloquearam o crescimento de rachaduras. “O fortalecimento do concreto parece ser crucial para a resiliência de longo prazo”, segundo a geóloga, e “contribui para reforçar a coesão ao longo dos séculos”.
A pesquisadora e seus colaboradores dizem acreditar que determinaram exatamente quando os romanos alcançaram essa maestria: no primeiro século a.C.. O Teatro de Marcelo e o Mercado de Trajano, dois locais em Roma que Jackson estudou, “registram essa conquista”, de acordo com ela.