O treinador do Real Madrid, Carlo Ancelotti, acusado de ter ocultado parte de seus rendimentos por direitos de imagem do fisco espanhol, assegurou nesta quarta-feira (2) perante um tribunal que nunca pensou em cometer fraude, e que foi o clube quem lhe propôs essa forma de remuneração.
Ancelotti acordou receber 6 milhões de euros (US$ 6,5 milhões) líquidos por quatro temporadas, das quais cumpriu duas, e foi o clube, sustenta, quem lhe propôs receber 15% em direitos de imagem.
“Quando o Madrid me sugere isso, eu coloco o Real Madrid em contato com meu assessor inglês. Nunca entro nisso porque nunca tinha recebido assim”, declarou o técnico italiano no início da audiência que se realiza em um tribunal de Madri.
“Todos os jogadores tinham, Mourinho tinha isso”, indicou sobre um de seus predecessores no banco do Real Madrid, que foi condenado a um ano de prisão, suspensa após se declarar culpado de fraude fiscal em 2019.
A primeira jornada do julgamento durou cerca de duas horas e será retomada na quinta-feira às 9h30 (horário local). Além do acusado Ancelotti, declararam como testemunhas sua enteada Chloe McClay —em videoconferência de Los Angeles—, seu filho Davide Ancelotti, e sua esposa Mariann Barrena.
Grande parte das perguntas à sua família visavam saber onde esteve o técnico após ser demitido do Madrid em maio de 2015, porque apenas aqueles que passaram mais de 183 dias durante o ano natural na Espanha devem fazer a declaração de renda.
Ancelotti, de 65 anos, enfrenta um pedido de pena da promotoria de quatro anos e nove meses de prisão por defraudar mais de um milhão de euros (US$ 1,1 milhão) em direitos de imagem em 2014 e 2015, durante sua primeira etapa dirigindo o Real Madrid (2013-2015), ao qual retornou em 2021 (até agora).
“Nunca me dei conta de que algo não estava correto”, antes de 2018, quando o ministério público abriu uma investigação, acrescentou o técnico.
Segundo a administração fiscal espanhola, Ancelotti declarou seus rendimentos como técnico do Real Madrid em 2014 e 2015, mas não os provenientes de direitos de imagem e outras fontes, como algumas propriedades imobiliárias.
Os rendimentos por direitos de imagem foram, de acordo com o ministério público, de 1,2 milhão de euros em 2014 (US$ 1,3 milhão) e de 2,9 milhões (US$ 3 milhões) em 2015.
Para a Promotoria, as omissões de Ancelotti em suas declarações de impostos foram voluntárias, já que o técnico italiano “recorreu a um ‘complexo’ e ‘confuso’ esquema de fundos e empresas interpostas para canalizar a arrecadação de direitos de imagem”.
Durante sua declaração nesta quarta-feira, o técnico italiano defendeu, no entanto, que não tinha conhecimento de estar fazendo algo errado nem de que a empresa criada para tributar os direitos de imagem lhe permitia pagar menos impostos.
“Naquele momento todos os jogadores e treinadores tinham, me parecia uma coisa correta”, indicou Ancelotti durante uma declaração em que chegou a suspirar em uma ocasião diante de perguntas técnicas do promotor.
“Pufff… Está me perguntando sobre um tema que não conheço”, afirmou.
Os precedentes de Messi, Ronaldo e Shakira
Outras estrelas tiveram problemas com o fisco espanhol antes de Ancelotti, mas nenhuma teve que ir para a prisão, um precedente esclarecedor para o italiano.
Assim, o jogador argentino Lionel Messi, então grande estrela do FC Barcelona, foi condenado em 2016 a 21 meses de prisão e ao pagamento de mais de 5 milhões de euros, embora não tenha cumprido a pena devido à legislação espanhola que permite suspender condenações menores de dois anos para primeiros delitos.
Em 2018, o jogador português Cristiano Ronaldo, do Real Madrid, pagou uma multa de 18,8 milhões de euros e recebeu uma condenação de dois anos de prisão, que não cumpriu por não ter antecedentes penais.
A cantora colombiana Shakira, ex-esposa do jogador Gerard Piqué, também chegou a um acordo em novembro de 2023 para evitar um julgamento por fraude fiscal.
O acordo incluiu uma pena de três anos de prisão suspensa e uma multa de 7,3 milhões de euros por ter defraudado 14,5 milhões de euros entre 2012 e 2014.
Finalmente, em um caso muito parecido ao de Ancelotti, o ex-jogador do Real Madrid e da seleção espanhola Xabi Alonso enfrentou acusações de fraude fiscal pela cessão de seus direitos de imagem a uma empresa sediada no exterior, mas foi absolvido.