Uma cultura floresceu ao longo da costa central do Peru aproximadamente de 900 a 1500. Chamada de chancay, essa civilização deixou para trás uma riqueza de vestígios culturais, incluindo tatuagens que estão preservadas até hoje na pele de indivíduos mumificados.
Novos detalhes dessas tatuagens, anteriormente ocultos a olho nu, incluindo linhas finamente traçadas, foram descritos em um estudo publicado na última segunda-feira (13).
Após iluminar as múmias com fluorescência estimulada por laser (LSF), uma ferramenta de imagem que até então nunca havia sido aplicada a tatuagens, os cientistas descobriram linhas de 0,1 a 0,2 milímetro de largura, mais estreitas do que o trabalho produzido pela maioria das agulhas de tatuagem modernas.
“Ficamos chocados com o quão finas eram as linhas das tatuagens em nossas imagens de LSF”, disse por email Michael Pittman, professor assistente da Universidade Chinesa de Hong Kong e autor do estudo publicado na revista científica PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences). “Imediatamente soubemos que o que estávamos vendo era especial.”
As múmias apresentadas no estudo foram enterradas no cemitério de Cerro Colorado e redescobertas em 1981. Suas tatuagens têm aproximadamente mil anos e exibem desenhos geométricos ornamentados, lembrando escamas ou videiras, além de um animal amorfo com cauda enrolada.
Os chancay sempre foram conhecidos por altos níveis de artesanato em sua cultura material e deixaram marcações elaboradas muito além de suas tatuagens, segundo o arqueólogo Aaron Deter-Wolf, da Divisão de Arqueologia do Tennessee, especializado em tatuagens antigas e não envolvido no estudo.
Pittman, um paleobiólogo de dinossauros, passou mais de uma década examinando fósseis com fluorescência estimulada a laser. Essa ferramenta não invasiva expõe espécimes a lasers de alta potência, produzindo um brilho fluorescente que às vezes revela características sutis, como tecidos moles. Nos últimos anos, a equipe começou a explorar as aplicações arqueológicas da técnica.
“Esperamos que a LSF funcione em outras tatuagens antigas de diferentes culturas ao redor do mundo e temos planos de continuar esse trabalho para chegar a mais descobertas,” afirmou Pittman. “Esperamos poder retroceder ainda mais no tempo a complexidade das tatuagens antigas.”
Deter-Wolf não estava convencido de que o estudo demonstrava vantagens claras da fluorescência estimulada a laser sobre outras técnicas para examinar tatuagens antigas, como a imagem multiespectral. “Essa é uma ferramenta adicional interessante em nosso kit, mas não é inovadora,” disse ele.
Ele também mostrou preocupações sobre algumas das conclusões do estudo. A equipe de Pittman sugeriu na pesquisa que os padrões de tatuagem foram feitos a partir de perfurações por um instrumento fino, como uma agulha de cacto ou osso de animal afiado.
Para o arqueólogo, a maioria das tatuagens examinadas no estudo foi feita com incisões, e não perfurações.
“Um pintor usa diferentes pincéis para obter resultados diferentes”, afirmou Deter-Wolf. “Tatuadores têm feito a mesma coisa por milhares de anos, então, dependendo da ferramenta que estão usando, você obterá uma assinatura física diferente como resultado.”
Pittman apoiou a conclusão de sua equipe de que as tatuagens foram feitas por punção. “A espessura única de nossas linhas de tatuagem em comparação com as tatuagens chancay sugere que uma produção baseada em agulha [tatuagem por punção] é mais razoável”, disse ele.
Fixar os métodos que os tatuadores usavam é um passo importante na interpretação do significado da arte corporal para as sociedades passadas. Uma variedade de técnicas foi usada em diferentes culturas, e o processo de fazer arte corporal frequentemente tinha um significado ritualístico.
Por exemplo, Ötzi, um “homem do gelo” de 5.300 anos com a arte corporal mais antiga conhecida em uma múmia, pode ter sido tatuado principalmente por razões terapêuticas, não apenas estéticas. No caso dos chancay, as motivações permanecem um mistério.
“Essas não são expressões puramente artísticas”, disse Deter-Wolf. “Elas são muito carregadas culturalmente.” A tatuagem é a ponta do iceberg, ele observou, mas “há todo um arcabouço cultural que a sustenta”.