Mais de meio trilhão de reais estão depositados em fundos de investimento sob a gestão de empresas que alinham seus aportes a princípios religiosos cristãos nos Estados Unidos. A notícia é da agência de notícias Bloomberg. Para investidores religiosos, essa é uma forma de garantir que seu dinheiro não apoiará empresas ou iniciativas contrárias aos princípios de sua fé. Isso impacta o engajamento de empresas em causas LGBTQIA+ e saúde reprodutiva.
Guide Stones é uma gestora de investimentos cristã que tem produzido impacto nas práticas corporativas de grandes empresas. Atualmente, está em seu momento financeiro mais robusto, administrando cerca de US$ 24 bilhões em ativos. Conforme consta em seu site, sua história é centenária: foi criada em 1918, no Texas, para gerir as economias de pastores batistas aposentados. Em seus primeiros dois anos, recebeu duas doações significativas: uma contribuição de US$ 100 mil da diretoria de uma escola batista e outra de US$ 1 milhão da família Rockefeller.
Além da Guide Stones, a Inspire Investing também atua no mesmo segmento, orientando seus clientes a investir em empresas que façam com que “o dinheiro também sirva para glorificar o Senhor”, como diz em seu site.
No universo dos investidores conservadores, a maioria dos fundos cristãos opera com índices que avaliam a compatibilidade entre os negócios e os fundamentos de suas crenças. Ao fim dessa análise, as empresas podem ou não integrar os portfólios dos chamados Investimentos Biblicamente Responsáveis.
Empresas que se relacionam com tabaco, álcool, pornografia, ativismo LGBTQIA+, pesquisa com células-tronco e apostas perdem pontos. Por outro lado, aquelas que valorizam o bem-estar dos funcionários, a privacidade dos clientes e a mitigação de impactos ambientais ganham destaque. Na lógica cristã desses investimentos, a responsabilidade ecológica é especialmente valorizada, pois a preservação do planeta é vista como cuidado com uma criação divina.
Mais do que apenas classificar empresas, o volume de capital movimentado pelo mercado financeiro cristão tem pressionado companhias a alterar suas práticas. Um exemplo recente envolve a rede de supermercados Walmart.
Em dezembro passado, o CEO da Inspire Investing, Robert Netzly, divulgou que, após pressão de investidores religiosos, o Walmart recuou em suas políticas de diversidade, equidade e inclusão, deixando de participar do Índice de Igualdade Corporativa, organizado pela Human Rights Campaign, uma entidade de direitos humanos.
O Índice de Igualdade Corporativa é uma ferramenta poderosa que avalia políticas e práticas relacionadas a LGBTQIA+ em empresas americanas. Ele serve como guia tanto para empresas que buscam promover inclusão quanto para investidores e consumidores que desejam apoiar marcas alinhadas aos seus valores.
Para Netzly, o recuo do Walmart é um “recado claro de que as corporações podem ter sucesso sem ceder à pressão ideológica esquerdista”.
A história centenária do fundo cristão que recebeu a doação milionária dos Rockefeller ilustra que a relação entre o mercado financeiro e investimentos religiosos não é nova. No entanto, conforme os números divulgados pela Bloomberg, esses fundos nunca estiveram tão robustos nem o movimento dos Investimentos Biblicamente Responsáveis tão organizado. O que essa nova configuração deixa evidente é que a mão invisível do mercado também é guiada por disputas morais.