A Câmara dos Deputados pode votar nesta terça-feira (17) o texto da reforma tributária que coloca refrigerantes e outras bebidas açucaradas na lista de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente alvos do Imposto Seletivo, o “imposto do pecado”.
O consumo de refrigerantes pode causar diversos problemas à saúde, como diabetes tipo 2, câncer de fígado, doenças cardiovasculares, obesidade e cáries dentárias, devido ao alto teor de açúcar, adoçantes artificiais e ácidos presentes nessas produtos.
Estudo elaborado a pedido da ACT Promoção da Saúde, organização não governamental que atua em prol de políticas públicas na área, mostra que as bebidas açucaradas respondem por cerca de 13 mil mortes a cada ano no Brasil e mais de 20% dos casos de sobrepeso e obesidade infantil, problema que já afeta 2,9 milhões de crianças.
A pesquisa mostra, ainda, que o sistema de saúde brasileiro gasta cerca de R$ 3 bilhões por ano no tratamento de doenças relacionadas ao consumo dessas bebidas.
“O excesso de açúcar livre, especialmente frutose, contribui para o acúmulo de gordura visceral, aquela gordura da barriga, além do acúmulo de gordura no fígado causando esteatose hepática [gordura no fígado]. Também aumenta a chance de desenvolver resistência insulínica e diabetes tipo 2″, afirma o médico Rubem Regoto, nutrólogo na Clínica Regoto.
O consumo elevado de açúcar começa a causar problemas já na boca, de acordo com a nutricionista Fernanda Larralde.
“Esses alimentos predispõem a uma maior ocorrência de cáries, gengivites e de alterações na própria mucosa da língua. Depois, a gente pode ter na parte do estômago uma alteração do pH, o que leva a uma piora da digestão e da absorção pelo intestino, o que mexe com a microbiota intestinal [complexo de espécies de microrganismos que vivem no trato digestivo].”
Para especialistas, a reforma tributária em curso é uma oportunidade para estimular políticas públicas em prol de uma alimentação mais saudável no país. E tributações maiores para ultraprocessados são algumas das sugestões.
Para Lerralde, o grande problema do consumo do refrigerante é a recorrência. “Se a bebida passa a fazer parte da sua rotina, obrigatoriamente você não se vê sem ela. Se você consome mais de duas vezes na semana, isso já é dependência.”
Publicado em setembro na Lancet, um estudo que é considerado um dos maiores e mais longos sobre a relação entre consumo de ultraprocessados e saúde cardíaca mostrou que certos tipos de alimentos estavam mais associados a doenças cardiovasculares do que outros.
Das dez categorias de produtos industrializados que foram analisados, dois estavam claramente associados a maior risco: bebidas açucaradas e carnes, aves e peixes processados.
O consumo de bebidas adoçadas também eleva o risco de desenvolver câncer de fígado e de mortalidade por doença crônica hepática, diz um estudo divulgado no ano passado pela revista especializada Jama (Journal of the American Medical Association).
O risco de ter câncer de fígado é 85% maior em pessoas que consumiam uma ou mais latas de bebidas açucaradas por dia, em comparação àquelas que consumiam raramente (três latas ou menos por mês). Já o risco de mortalidade por doença do fígado era 68% maior nos indivíduos que consumiam bebidas adoçadas uma ou mais vezes por dia.
A pesquisa avaliou a incidência de câncer de fígado em relação ao consumo de bebidas açucaradas em mulheres pós-menopausa de 1993 a 1998 nos Estados Unidos. O tempo de acompanhamento foi de 20,9 anos.
Mas o risco não está apenas no açúcar branco adicionado: pessoas que consumiram por dia uma ou mais latas de refrigerante diet ou de sucos adoçados artificialmente tiveram risco 17% maior de desenvolver câncer de fígado em comparação a quem consumiu até três latas por mês.
O consumo de bebidas açucaradas no mundo aumentou quase 16% (15,9%) de 1990 a 2018, passando de 2,4 porções por semana para 2,7. As taxas, porém, variam consideravelmente entre as diferentes regiões, sendo América Latina e Caribe (7,8) e África Subsaariana (6,6) as duas localidades com o maior consumo de bebidas açucaradas, enquanto a Ásia (0,7) tem a menor.
Os dados da pesquisa Global Dietary Database, que recebeu apoio financeiro da Fundação Bill e Melinda Gates e da Associação Americana do Coração, foram publicados em outubro de 2023 no periódico científico Nature Communications.