A plumagem esbranquiçada da suindara ou coruja-das-torres (Tyto alba) pode parecer uma má ideia para uma ave que se especializou em caçar à noite, mas um novo estudo sugere que a cor das penas do bicho foi otimizada com precisão pela seleção natural. Segundo pesquisadores espanhóis, as plumas alvas funcionam como ótima camuflagem durante as noites de luar.
Se a afirmação parece improvável, ao menos considerando a acuidade da visão humana, vale lembrar que o “público-alvo” do disfarce das suindaras não é o Homo sapiens. Quem ela precisa despistar são os roedores de pequeno porte, como ratos e camundongos, que são as principais presas do bicho.
A conclusão vem de uma pesquisa publicada nesta segunda-feira (16) na revista científica PNAS. O trabalho foi liderado por Juan Negro e Carlos Camacho, ambos do Departamento de Ecologia e Evolução da Estação Biológica de Doñana (sul da Espanha). No trabalho, a dupla e seus colegas propõem uma explicação para a plumagem das suindaras que é o exato oposto de uma das principais hipóteses defendidas até agora.
Isso porque, de acordo com alguns pesquisadores, a brancura quase fantasmagórica da cara e do ventre dessas corujas teria sido selecionada justamente para se destacar no céu noturno.
Sendo extremamente visíveis, as suindaras disparariam uma reação exacerbada de “freezing” (o “congelamento” do corpo utilizado por certos animais para tentar não chamar a atenção de seus predadores). Isso, na verdade, acabaria facilitando a captura do almoço, que não teria tempo de se esquivar dos ataques.
É inegável que as suindaras são extremamente eficientes quando o assunto é predar pequenos mamíferos. O gênero Tyto, ao qual pertence a espécie T. alba, do Velho Mundo, está distribuída em quase todo o planeta, enquanto a do Novo Mundo, a T. furcata, está entre as corujas mais comuns do Brasil. Além disso, o bicho se adaptou bem a áreas abertas e/ou com forte intervenção humana, como núcleos urbanos e fazendas. Mas os pesquisadores espanhóis suspeitavam que o cenário de “ave do terror” não fazia tanto sentido.
Para tentar entender de forma mais sólida como o voo noturno da ave é percebido por suas presas, Camacho, Negro e companhia realizaram uma série de modelagens matemáticas para simular as propriedades luminosas do céu e do luar durante a noite, a maneira como a luz natural noturna afeta o ambiente e a silhueta ventral da coruja e as capacidades visuais dos pequenos roedores que ela caça.
Após uma multidão de contas, os pesquisadores chegaram à conclusão de que a combinação da luz do luar e das penas das suindaras leva a uma camuflagem do tipo BM (sigla inglesa que significa algo como “combinação com pano de fundo”).
Isso significa que o contraste entre os contornos do corpo da coruja e o pano de fundo em que ela está –no caso, o céu noturno– tende a desaparecer em noites enluaradas, independentemente da fase da Lua, embora a camuflagem pareça funcionar ainda melhor quando o astro está “no meio do caminho”, e não alto no céu.
Além disso, considerando as capacidades visuais dos pequenos roedores, eles teriam muita dificuldade de enxergar as suindaras até elas chegarem a uma distância de poucos metros.
Tudo indica que as aves tiram o máximo de partido dessa vantagem com um método de caça que consiste em planar por cima de uma área até dar um mergulho rápido, em linha reta, para pegar seu jantar. Outras corujas costumam atacar na diagonal, mergulhando de um galho, por exemplo, mas o bote mais direto das suindaras tem a vantagem de elas ficarem imediatamente acima dos roedores e, dessa forma, menos visíveis para as capacidades oculares deles.