Um estudo publicado este mês na revista científica British Medical Journal por pesquisadores da escola de saúde pública da Universidade de Harvard sugere que o consumo de cinco porções de chocolate amargo (cada uma com aproximadamente 28 gramas) por semana estaria associado a uma redução de 21% no risco de diabetes tipo 2.
A pesquisa investigou a associação entre o consumo de chocolate e o risco de diabetes tipo 2 nos Estados Unidos. Ao longo de mais de 30 anos, cerca de 192 mil adultos que não tinham diabetes no início da pesquisa forneceram informações sobre hábitos alimentares, além de peso corporal e diagnóstico de diabetes. Os grupos de pessoas avaliados consistiam em profissionais de saúde, predominantemente brancos.
Com base nos autorrelatos dos participantes, os autores observaram ainda que pessoas que consumiam pelo menos cinco porções de qualquer tipo de chocolate por semana apresentavam um risco 10% menor de desenvolver diabetes tipo 2 em comparação com aquelas que raramente ou nunca consumiam chocolate. O consumo de chocolate ao leite, no entanto, não foi associado ao risco de diabetes tipo 2, mas ao ganho de peso excessivo a longo prazo, reforçando, então, o benefício do amargo.
Até o final do período de acompanhamento, quase 19.000 participantes relataram ter sido diagnosticados com diabetes tipo 2. Entre cerca de 112.000 que forneceram dados específicos sobre o consumo de chocolate amargo e ao leite, quase 5.000 receberam o diagnóstico de diabetes tipo 2.
“Os resultados desse estudo não devem ser interpretados como uma liberação para o consumo indiscriminado de chocolate. A única conclusão clara é: se você vai comer chocolate de qualquer forma, prefira o amargo”, diz o endocrinologista Luciano Giacaglia, coordenador do Departamento de diabetes tipo 2 e pré-diabetes da SBD (Sociedade Brasileira de Diabetes).
Ele acrescenta que a maioria dos participantes do estudo eram brancos não hispânicos, o que pode influenciar nos resultados. “Isso pode gerar um viés ao consideramos populações como a brasileira, já que o perfil genético, que também influencia no diabetes, varia entre as populações”, complementa.
Os resultados deste estudo divergem de outro artigo, publicado em 2023 no Diabetes Care, com base em dados do estudo Cosmos (sigla em inglês para abreviar Cocoa Supplement and Multivitamin Outcomes Study).
Nesse trabalho, os pesquisadores avaliaram a hipótese de que a suplementação com flavonoides do cacau poderia ser uma estratégia promissora para a prevenção do diabetes tipo 2, em um ensaio clínico com 21.442 adultos nos EUA (12.666 mulheres com idade superior a 65 anos e 8.776 homens com mais de 60 anos) sem doenças cardiovasculares ou câncer recente.
Os participantes foram acompanhados durante cerca de três anos e meio e receberam suplementos de extrato de cacau (500 mg/dia de flavonoides, incluindo 80 mg de epicatequina) ou placebo. Entre os 18.381 sem diabetes no início do estudo, foram constatados 801 novos casos. Não houve efeitos no risco de diabetes tipo 2.
Celso Cukier, nutrólogo do Hospital Israelita Albert Einstein, concorda que o estudo do British Medical Journal não é conclusivo. “Não podemos afirmar que comer mais de cinco porções de chocolate rico em cacau é seguro”, afirma o médico.
“O chocolate não é necessariamente um vilão. O que importa é o equilíbrio entre boa nutrição, atividade física e higiene corporal e mental —um tripé essencial para a saúde. A questão vai muito além de comer ou não chocolate. É preciso reforçar, desde cedo, a importância da educação e de hábitos saudáveis, fundamentais para prevenir doenças como o diabetes tipo 2”.
A SBD estima que vivem, no Brasil, cerca de 20 milhões de pessoas com diabetes, baseando-se em dados do Censo 2022 e do Vigitel (Vigilância de Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), levantamento realizado anualmente pelo Ministério da Saúde. Desse total, 90% têm diabetes tipo 2. Entre os principais fatores de risco estão a obesidade, a dieta não saudável e a falta de atividade física.
O Guia Alimentar para a População Brasileira recomenda uma dieta baseada em alimentos in natura ou minimamente processados e desaconselha o consumo de alimentos ultraprocessados, categoria em que se enquadra o chocolate, mesmo o amargo com alto teor de cacau.