Um estudo demonstrou que 72% dos moradores de São Paulo não têm anticorpos e estão mais vulneráveis ao vírus da dengue.
Em capitais como Curitiba, a vulnerabilidade chega próximo dos 90%, o que pode intensificar ainda mais a epidemia que atingiu o nível mais grave registrado em 2024, com 5,7 mil mortes confirmadas e 6 milhões de infecções suspeitas no país.
A conclusão é de uma análise da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) a partir da coleta de sangue de doadores em sete capitais.
Na maioria das cidades analisadas, os doadores não tiveram contato com a chikungunya, vírus também transmitido pelo Aedes aegypti, que até agosto deste ano fez mais vítimas do que em todo o ano de 2023. Já até novembro, a doença fez 201 vítimas. Em 2023, foram 122, de acordo com acompanhamento feito mensalmente pelo Ministério da Saúde.
Em Manaus, 96% das análises demonstraram doadores com ausência de anticorpos contra a chikungunya. Em São Paulo, foram 98% e, em Curitiba, 99,5%. No Rio de Janeiro, 79,5% não têm anticorpos.
No total, foram coletadas 1.600 amostras em novembro de 2023 e junho de 2024. A investigação mirou em anticorpos tipo IgG (Imunoglobulina G) para dengue e chikungunya e imunoglobulina tipo M para dengue. A pesquisa, então, calculou a proporção da população suscetível à infecção.
O organismo sem o contato com o vírus é mais suscetível à doença, o que pode propagar os efeitos da epidemia pelo país.
Em capitais como Belo Horizonte, apenas 31% das amostras indicaram a ausência de anticorpos para a dengue e 38% para a chikungunya, mas a porcentagem também é analisada com cautela pelos autores. Não à toa, o estado mineiro liderou o número de casos da doença neste ano, com mais de 160 mil infecções.
A Saúde e os infectologistas relacionam o aumento das doenças chamadas arboviroses com as mudanças climáticas.
Um estudo divulgado em setembro na revista PLOS Neglected Tropical Diseases (doenças tropicais negligenciadas) ,a partir de dados de 645 municípios de São Paulo entre 2008 e 2018, concluiu que fenômenos meteorológicos, como o El Niño, estão conectados ao aumento de casos no país.
O El Niño aumenta a temperatura do oceano Pacífico devido à diminuição da intensidade dos ventos. A circulação atmosférica é alterada de forma anormal pelo evento, elevando a umidade e temperatura em várias regiões do planeta. O estudo calcula que temperaturas acima de 23 °C e volume de chuvas acima de 153 milímetros aumentam a reprodução do mosquito.
A estratégia da Saúde para tentar eliminá-lo tem sido a liberação de mosquitos inférteis geneticamente modificados —medida controversa para especialistas—, instalação de armadilhas para matar larvas e a borrifação de inseticidas.
“Saber a suscetibilidade de uma população é importante para que o poder público possa se preparar para enfrentar as futuras emergências sanitárias e destinar recursos humanos e financeiros adequados para combatê-las”, afirma em nota a infectologia Ester Sabino, coordenadora do estudo e professora titular da FMUSP.