Os esforços da equipe econômica para por em pé o pacote anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad e a articulação no Congresso para viabilizar a aprovação das medidas estão sendo insuficientes para reverter as expectativas negativas e diminuir a incerteza existente na economia brasileira.
O indicador de incerteza da economia, calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), interrompeu, em novembro, a trajetória de queda iniciada em julho. Um fator unterno que pesou foi a expectativa em relação ao anúncio de medidas fiscais.
“A continuidade da tendência de alta nos próximos meses dependerá dos desdobramentos do pacote fiscal anunciado no final do mês passado”, diz a economista Anna Carolina Gouveia.
O detalhamento insuficiente das medidas frustrou analistas. A ampliação da isenção do Imposto de Renda para salários de até R$ 5 mil gerou dúvidas sobre a capacidade de equilibrar as contas públicas, especialmente considerando a dívida pública projetada para ultrapassar 84% do PIB até 2026.
Segundo Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, o ajuste necessário para atingir a meta de resultado primário zero em 2025 é estimado em R$ 46,9 bilhões.
O câmbio já reflete parte dessas incertezas. Um dólar acima de R$ 6, como alerta Victor Arduin, analista da Hedgepoint Global Markets, “aumenta a inflação e pode levar o Banco Central a adotar uma política monetária ainda mais restritiva, prejudicando o crescimento econômico”. Com a inflação pressionada, ultrapassando o teto de 4,5% este ano, os juros devem permanecer elevados, frustrando uma atividade econômica mais forte.
Ajuste fiscal insuficiente exige medidas adicionais
Cálculos da Warren Investimentos mostram que o contingenciamento de despesas discricionárias pode gerar R$ 16 bilhões, deixando um saldo de R$ 31 bilhões a ser coberto pelas medidas propostas em dois projetos de lei e uma proposta de emenda constitucional (PEC), que juntos somariam cerca de R$ 23 bilhões. Ainda assim, um déficit de R$ 8 bilhões ficaria descoberto.
Mesmo com o ajuste estimado de R$ 46,9 bilhões, o déficit primário projetado para 2024 permaneceria em R$ 75,1 bilhões, considerando o déficit inferior (-R$ 31 bilhões) e os precatórios fora das regras fiscais (-R$ 44,1 bilhões). Salto aponta que estabilizar a relação dívida/PIB, atualmente em 77,8% dp PIB, exigiria um superávit primário de pelo menos 1,5% do PIB. O último registro de superávit em 12 meses ocorreu em maio de 2023.
Para alcançar essa meta, seria necessário um ajuste fiscal de aproximadamente R$ 70 bilhões por ano. No entanto, o pacote atual promete R$ 71,9 bilhões em dois anos, insuficiente para atender à necessidade anual. “Independentemente das críticas do governo às reações do mercado, a verdade é que as contas não mentem. O esforço fiscal precisa ser ampliado significativamente”, afirma Salto.
Incerteza na economia afeta perspectivas para 2025
A perspectiva para 2025 é preocupante. Além das contas públicas, a queda nos preços das commodities afeta diretamente o fluxo cambial brasileiro. Com a previsão de superávit comercial em queda e a estimativa de fuga de capitais superior a US$ 80 bilhões em 2024, o cenário se agrava, intensificado pela sazonalidade de dezembro e pela valorização global do dólar.
A esperada agenda protecionista do possível novo governo Trump adiciona incertezas. Medidas como barreiras comerciais e estímulos fiscais nos Estados Unidos indicam que os juros americanos podem permanecer elevados por mais tempo, pressionando moedas emergentes como o real.
“Em 2025, o real pode enfrentar desafios ainda maiores, dependendo do comportamento das taxas de juros nos EUA e da capacidade do governo brasileiro de implementar ajustes fiscais efetivos”, conclui Arduin.