Hoje de manhã, mais um vídeo que vi nas redes sociais me deixou angustiada. Desta vez não foi nenhum caso de violência policial ou de racismo. Apenas uma mãe decidiu ofender uma passageira que não quis ceder o seu lugar na janela de um avião para a criança durante um voo da Gol. Não satisfeita, a mãe também achou uma boa ideia gravar e expor a mulher —que estava no seu direito— na internet. Não vou compartilhar o post para não divulgar ainda mais o constrangimento.
Outros casos como esse ocorreram nos últimos anos. Por algum motivo, certos pais têm chegado com filhos para viagens de avião e acham que a pessoa que está lá, no assento da janela, deve sair em nome do bem-estar de seu rebento.
É verdade que algumas crianças, por questões médicas inclusive, sentem-se mais seguras viajando nesses lugares. Mas saibam que muitos adultos também.
Eu tenho diagnóstico de transtorno de ansiedade generalizada e de transtorno de pânico desde adolescente (faz tempo).
Apesar do tratamento contínuo que faço, tenho momentos melhores e piores. Nos piores, entre tantos outros sofrimentos diários e invisíveis que quem luta contra um problema de saúde mental enfrenta, não consigo ficar em lugares fechados. Por exemplo: passo meses sem andar de elevador (claustrofobia) e evito lugares muito cheios (agorafobia). Quando o negócio fica feio mesmo, não consigo nem sair de casa (agradeço à tecnologia pelo home office concedido nesses dias).
Viajar de avião é um pesadelo. Ao mesmo tempo que às vezes eu preciso ir a trabalho, eu também amo conhecer novas cidades, novos países. Então não quero evitar, quero enfrentar —é o que os especialistas indicam, aliás.
Por isso a preparação começa dias antes. Converso com o psiquiatra, que aumenta um pouco a dose da medicação nesse período. A psicóloga me passa exercícios de respiração e dessensibilização para eu ir treinando e chegar no aeroporto mais confiante.
E o mais importante: reservo um assento ao lado da janela, já que olhar para fora tanto durante a viagem como na hora de decolar e de aterrissar me deixa mais calma. O assento também precisa ser perto da asa, que é a área do avião que costuma ter menos turbulência.
Também pesquiso antes sobre o modelo de avião que eu vou: se é um Boeing ou Airbus, acompanho a viagem de voos anteriores no site FlightAware, histórico de acidentes, histórico da companhia aérea.
Não, nada disso é frescura. É uma doença que tem CID (código internacional de doenças) no DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais).
Pois bem. Imagina se, depois de tudo isso, eu estou lá, sentadinha no meu lugar, ouvindo uma playlist relaxante do meu celular, e vem uma pessoa dizendo que preciso ceder o meu assento para o filho dela? Certamente eu teria uma crise de pânico durante o voo.
Por que a mãe e o pai não podem ter o mesmo cuidado com o filho? Por que não reservar o assento? Conversar com a companhia aérea caso a criança tenha alguma condição específica? A tripulação é preparada para atender diversos tipos de necessidades que os passageiros (crianças, adultos e idosos) tenham. Mas para isso precisam ser avisados com antecedência.
Não dá para uma pessoa chegar num avião, num ônibus ou num trem e exigir o assento de outra que reservou antecipadamente.
Moça do avião, parabéns por sua resiliência e por não ter levantado do seu lugar.
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