A jornada de 44 horas de trabalho semanais, distribuídas em seis dias, está em debate no Brasil. O esquema, previsto na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), é comum em setores como comércio, bares e restaurantes, hotéis e administrativo. A escala 6×1, porém, pode trazer impactos para a saúde mental e física do trabalhador, segundo especialistas.
O movimento ganhou espaço após a vitória do vereador Rick Azevedo (PSOL-RJ) no Rio de Janeiro, eleito com uma campanha que fala em “vida além do trabalho”— e envolve também o aspecto do direito ao lazer e descanso.
Segundo Tatiana Iwai, coordenadora do núcleo de Estudos de Comportamento Organizacional e Gestão de Pessoas do Insper, a comparação com experimentos feitos em locais que adotaram a escala 4×3 (quatro dias de trabalho para três de descanso) ajudam a entender os efeitos para a saúde mental.
São tentativas, segundo a professora, conduzidas por países como a Islândia, o Reino Unido e Portugal, ou por empresas, em menor escala, mas com resultados positivos. “Não houve prejuízo observado em termos de capacidade de entrega, em termos de cumprimento de prazos”, diz, “também foi observado menor absenteísmo”.
Segundo ela, os experimentos conduzidos até agora apresentaram resultados interessantes do ponto de vista da redução do estresse e da exaustão –fatores que impactam não só a saúde mental, como física. O excesso de estresse aumenta a liberação de cortisol no sangue, um hormônio que pode causar insônia, dificuldade para perder peso e de concentração e pressão alta.
Para Margareth Goldenberg, gestora executiva do Movimento Mulher 360, é um tipo de escala que reflete lideranças mais humanizadas. “São lideranças que já entenderam que o centro dos seus negócios, da produtividade, não é o escritório maravilhoso na Berrini [zona sul de São Paulo], mas são as pessoas”, afirma.
Depende, ela diz, do que é considerado produtividade. Mas ela considera que funcionários felizes, capazes de lidar com todas as dimensões da vida, refletem maior retenção e engajamento.
Iwai afirma que olhar para essas métricas é importante. Segundo a economista, o aumento da satisfação no trabalho reflete em uma menor intenção de deixar a empresa.
O debate sobre a escala 6×1 trouxe à tona também a chamada jornada dupla, ou tripla, feita pelas mulheres, que, além do trabalho remunerado, fazem as tarefas domésticas e de cuidados.
“A grande maioria na escala 6×1 ganha 1,5 salário mínimo”, diz Goldenberg. São, segundo ela, seis em cada dez mulheres negras nessa situação –e mais mulheres do que homens.
“Recai sobre essa base da sociedade feminina que não tem tempo algum”, afirma. “Isso destrói a motivação e destrói a chance de segurança psicológica. Não dá para falar em descanso e em felicidade.”
A escala, de fato, tem impacto muito maior em mulheres, diz Iwai. Segundo a professora, ao repensar a escala a questão em evidência é a da flexibilidade do trabalho.
“A gente sabe que qualquer política de flexibilidade é uma política que ajuda não só a manter mulheres na força de trabalho, mas também ajuda a avançar, que elas consigam progredir na carreira delas”, diz. São políticas, segundo Iwai, que permitem um equilíbrio melhor entre a vida pessoal e o trabalho.
Ela afirma que o trabalho híbrido –feito parcialmente presencial e parcialmente à distância– também entra nesse debate sobre flexibilidade que ajudaria as mulheres.
O pesquisador da FGV-Ibre Fernando de Holanda Barbosa Filho aponta, porém, que o fim da jornada 6×1 pode criar uma situação de insegurança econômica. “Se você reduzir o tempo de trabalho, precisa aumentar a produtividade”, diz.
Ele questiona se as empresas têm capacidade de absorver um aumento de custo de 20%, que ocorreria se a escala fosse reduzida com a manutenção dos salários. “Se uma pessoa ficar em casa, é melhor do ponto de vista do bem-estar, mas se ela ganha menor, é pior.”
Pessoas que ganham por comissão, por exemplo, teriam queda de renda, segundo o pesquisador. “O grande problema é obrigar a fazer um ajuste.”
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