Em 2023, o número de infecções por HIV (Vírus da Imunodeficiência Humana) no mundo foi o menor desde quando a situação epidemiológica da doença começou a ser acompanhada, em 1990, segundo dados da Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids).
Globalmente, foram notificados 1,3 milhão de novos casos de HIV no ano passado. Já em 1990, o número de infecções foi 2,5 milhões. O pico foi registrado em 1995, com 3,3 milhões novas infecções.
Divulgado nesta semana, devido ao Dia Mundial de Combate à Aids, neste domingo (1º), o relatório da Unaids destaca que o progresso nos serviços de prevenção e tratamento do HIV, aliado ao desenvolvimento de novas terapias, contribuiu para a redução contínua de novas infecções.
Além disso, iniciativas como programas de educação sexual, testagem e aconselhamento, campanhas de conscientização, distribuição de preservativos e tratamento da dependência química também desempenham um papel essencial na prevenção do HIV.
Na contramão da redução mundial, entre 2020 e 2022, o número de casos de infecção por HIV aumentou 17,2% no Brasil, com destaque para as regiões Norte (35,2%) e Nordeste (22,9%), de acordo com o boletim divulgado pelo Ministério da Saúde em 2023.
Diretora da Unaids no Brasil, Andrea Boccardi Vidarte destaca, porém, que no início da epidemia, há 40 anos, o Brasil liderou a resposta ao HIV e segue como uma referência global. “Temos o Sistema Único de Saúde [SUS] que disponibiliza preservativos, testagem, exame de carga viral e medicamentos antirretrovirais à população de forma gratuita. Na América Latina, o Brasil é o único país que distribui Prep [profilaxia pré-exposição] de forma gratuita”, diz.
Os dados mais recentes divulgados pelo Ministério da Saúde apontam 20.237 novos casos registrados no Brasil no primeiro semestre de 2023. No entanto, esse número pode estar defasado. A pasta deve divulgar os dados consolidados no início deste mês.
Em 2022, foram notificados 43.403 novos casos no país e 10.994 óbitos tendo o HIV ou Aids como causa. Segundo o infectologista Alexandre Naime, coordenador científico da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), o número de 2023 deve ser igual ou superior ao de 2022, considerando os registros do primeiro semestre do ano passado.
A população com HIV precisa fazer o acompanhamento da infecção de forma vitalícia para prevenir o desenvolvimento da Aids (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida), que é a fase mais avançada do vírus, quando o corpo não consegue mais se defender das doença.
A eliminação da Aids como uma questão de saúde pública até 2030 é uma das metas do programa Brasil Saudável, iniciativa do governo federal que busca eliminar ou reduzir o impacto de 14 doenças e infecções que afetam, de maneira mais grave, as populações em maior vulnerabilidade social.
De 2007 a junho de 2023, o Brasil registrou 489.594 casos de HIV. Em 2012, a população mais afetada pela doença tinha entre 30 e 44 anos. Em 2022, aumentou o número de infecções de pessoas de 20 a 29 anos.
Alguns grupos sociais permanecem mais vulneráveis à doença. Esses grupos incluem: jovens mulheres; homens gays e outros homens que fazem sexo com homens; profissionais do sexo; pessoas que usam drogas injetáveis; pessoas trans; e pessoas privadas de liberdade.
O infectologista argumenta que o problema principal do aumento da transmissão do HIV entre as populações mais vulneráveis é o acesso à informação e às formas de prevenção. Para ele, a comunicação precisa ser feita por pares, não só com campanhas convencionais.
“Estudos científicos mostram que essas populações mais vulneráveis só absorvem e mudam o comportamento se forem dialogadas com pares. Então, por exemplo, não adianta eu tentar dialogar com uma mulher trans, que está marginalizada. O diálogo entre pares, com alguém igual ou parecido com ela, é muito mais efetivo em termos de prevenção.”
Jair Santos, diretor do Grupo Paravidda (Grupo para Valorização, Integração e Dignificação do Doente de Aids), no Pará, explica que o acesso ao tratamento do HIV é limitado para alguns grupos vulneráveis devido a uma combinação de fatores. O estigma e a discriminação, por exemplo, afastam os pacientes do sistema de saúde.
“As populações mais vulneráveis não deixam de buscar ajuda pela sua condição, mas pela vulnerabilidade de acesso aos serviços”, explica.
O industriário Janailson Lobo Giron, 33, faz parte do grupo mais vulnerável ao HIV: é um homem cisgênero gay. Recebeu o diagnóstico da doença em 2015 e começou o tratamento em janeiro de 2017. Quatro meses depois, já não transmitia o vírus.
“Na época antes do diagnóstico, eu sabia que o principal método de prevenção era o preservativo, mas eu não vou negar que tinha uma vida mais contemporânea, para não falar louca, e acabava abusando mesmo. Era inconsequente”, conta.
Quando descobriu o HIV, o industriário lembra que o maior problema foi o preconceito. “Eu não tive muita dificuldade em alcançar o tratamento, porque estava em São Paulo. Minhas maiores dificuldades foram o estigma, o preconceito, principalmente por parte de membros da minha família.”
Prevenção e tratamento
A prevenção do HIV pode ser feita por diversos métodos eficazes. O uso de preservativos masculinos e femininos durante relações sexuais é a principal estratégia de proteção.
O SUS também oferece, além de preservativos gratuitos, dois comprimidos: a Prep (profilaxia pré-exposição), tomada por pessoas HIV negativas para prevenir a infecção, e a PEP (profilaxia pós-exposição), administrada após a possível exposição ao vírus.
O número de pessoas que fazem uso da Prep dobrou no país em quase dois anos, batendo um recorde. Dados do Ministério da Saúde atualizados até setembro mostram que há 104 mil pessoas cadastradas para receber o tratamento no SUS.
A adesão ao tratamento antirretroviral para pessoas que vivem com HIV também é importante, porque o paciente fica com uma carga viral indetectável, tornando a doença indetectável e intransmissível.
“Os medicamentos para HIV [antirretrovirais], no geral, impedem a replicação dos vírus nas células do organismo, porque o objetivo é reduzir a quantidade de vírus no sangue”, explica Michelle Menezes, farmacêutica clínica do Hospital Universitário de Sergipe.
O projeto Saúde Pública tem apoio da Umane, associação civil que tem como objetivo auxiliar iniciativas voltadas à promo ção da saúde.