O desentendimento entre Silas Malafaia e Bolsonaro parece ter ficado no passado. No dia 20, o pastor gravou um vídeo defendendo o ex-presidente após a revelação de planos para assassinar Alexandre de Moraes, Lula e Alckmin.
Curiosamente, Malafaia não recorre à Bíblia para justificar sua defesa de Bolsonaro e dos demais indiciados, mas ao Código Penal. Em tom de jurista, afirmou: “Não é infração penal imaginar, pensar ou combinar alguma coisa, mesmo que constitua crime, se não houver o início da execução de um delito.” Não cabe aqui discutir se monitorar alvos e portar armas não configuram início de execução; essa tarefa caberá aos juristas.
A paixão política cegou Malafaia e o fez desprezar aquilo que ele frequentemente diz defender: a tradição judaico-cristã. Foi em nome dessa herança que ele já condenou a união civil entre pessoas do mesmo sexo. No entanto, sua devoção a Bolsonaro parece tê-lo feito esquecer o sexto mandamento: “Não matarás.”
Mais espantoso é ouvir um pastor ignorar completamente as palavras de Jesus no Sermão da Montanha para minimizar a gravidade dos assassinatos planejados. Ao ecoar o senador Flávio Bolsonaro e afirmar que “pensar em matar alguém não é crime”, Malafaia contradiz uma das contribuições mais valiosas do cristianismo à civilização: a ênfase na moralidade interna. Jesus ensinou: “Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios…” (Marcos 7:21).
Espera-se que pastores falem sobre o que é pecado, não sobre tecnicalidades legais. No entanto, Malafaia, sempre vocal sobre pecados como homossexualidade, aborto e feminismo, silencia sobre o pecado da cogitação de assassinato. Isso é especialmente grave, considerando o papel central do cristianismo em promover a paz, alicerçada na transformação da subjetividade humana.
Jesus ensinou: “Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e: Quem matar estará sujeito a julgamento. Eu, porém, vos digo que todo aquele que se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento…” (Mateus 5:21-22). João Calvino, reformador do século 16, observou que, embora seja a mão que comete o assassinato, é o coração que o concebe. Segundo ele, o sexto mandamento é uma regra tanto para o coração quanto para a mão. Antes de se consumar num ato, o assassinato nasce como pensamento. Pastores deveriam ensinar que cogitar um crime é um pecado grave, não perder tempo justificando tecnicalidades.
Ao normalizar pensamentos de assassinato contra inimigos políticos, renuncia-se ao ideal ético estabelecido por Jesus de Nazaré. Essa banalização não apenas alimenta uma cultura de violência, mas também contraria o evangelho.
O Messias seguido pelos cristãos foi vítima de prisão arbitrária, tortura, julgamento político parcial e morte violenta. Jair Messias Bolsonaro construiu sua carreira política exaltando torturadores e ridicularizando vítimas da ditadura. A defesa que Malafaia faz do “Messias Bolsonaro” expõe a degradação política e religiosa que marca nossos tempos.